A polêmica do uso da inteligência artificial em processos de recrutamento de candidatos

A polêmica do uso da inteligência artificial em processos de recrutamento de candidatos

Nos últimos anos, a inteligência artificial (IA) tem se tornado uma ferramenta cada vez mais presente em diversas áreas e, hoje, chegou aos processos de recrutamento de candidatos. É fato que tecnologia tem oferecido inúmeras vantagens, como eficiência e personalização. Ao mesmo tempo, seu uso também levanta questões éticas e práticas que precisam ser consideradas com cuidado.

Quanto tratamos do recrutamento de candidatos, é notório os pontos de ganhos com a utilização da IA: análise de grandes volumes de currículos em um curto período, identificando com rapidez os candidatos mais qualificados tendo como base critérios predefinidos. Com algoritmos bem desenhados, podemos também minimizar preconceitos inconscientes, promovendo uma seleção mais equitativa e diversificada. O uso de chatbots e assistentes virtuais podem dar aos candidatos respostas imediatas a perguntas frequentes, trazendo uma experiência positiva – se bem desenhada - ao candidato durante o processo de seleção.

A utilização da IA também ajuda a obter uma análise de dados avançada, identificando padrões e insights que podem ser usados para tomar decisões mais informadas, tais como a análise de habilidades, experiências e até mesmo a compatibilidade cultural. Por ser 24/7, ferramentas de IA (chatbots, por exemplo) podem operar continuamente, oferecendo suporte e informações aos candidatos ininterruptamente.

Independentemente de quais são os benefícios almejados, diversas empresas têm aplicado a IA em seus processos seletivos. Vejamos alguns exemplos: A Unilever utiliza a plataforma HireVue para realizar entrevistas digitais com candidatos. A mesma plataforma é usada pela Vodafone, que consegue analisar rapidamente um grande volume de candidaturas, identificando os candidatos mais promissores.

A IBM faz uso da IA para otimizar seu processo de recrutamento, desde a triagem de currículos até a análise de dados de candidatos, aumentando sua eficiência. Na mesma linha de ganho de eficiência, a PwC emprega IA para analisar currículos e realizar entrevistas digitais, identificando candidatos com as habilidades e experiências mais relevantes para as vagas. Já a L’Oréal utiliza o chatbot Mya Systems para interagir com candidatos durante o processo de recrutamento, sendo ele responsável por responder a perguntas frequentes e realizar uma triagem inicial dos candidatos, economizando tempo para os recrutadores.

Apesar do uso crescente da IA nos processos de seleção de candidatos, é necessário que tenhamos um olhar crítico e cuidadoso na adoção das ferramentas.

Em linhas gerais, as críticas atualmente feitas residem em pontos ligados à confiança, segurança e privacidade.

Como as IAs se baseia em algoritmos que os candidatos não compreendem ou conhecem, podem causar desconfiança. É possível, também, incorrer no risco do viés do algoritmo. Por exemplo, se este contiver algum tipo de preconceito em sua construção, a IA pode perpetuar ou até amplificar os vieses, resultando, por exemplo, em discriminação. Outro importante risco refere-se à privacidade e segurança de dados. Como o uso de IA pode envolver a coleta e análise de grandes quantidades de dados pessoais, traz preocupações sobre a privacidade e a segurança dessas informações.

Indo além deste olhar mais técnico, ainda devemos refletir sobre a desumanização de um processo que é fundamentalmente humano. A automatização excessiva transfere impessoalidade ao processo e pode impactar negativamente a experiência do candidato, especialmente em situações em que a empatia é crucial. Aspectos específicos podem não ser levados em conta neste processo que é iminentemente humano e baseado na comunicação, em que as palavras representam 7% na compreensão da mensagem, o tom de voz 38% e a comunicação não verbal 55%.

Imagine também a situação em que o uso de IA leva a um problema relacionado a uma decisão injusta ou discriminatória. Num caso desses, quem se torna responsável pelo erro e pela prestação de contas?

Além dos riscos na própria operação de R&S, ainda há que se pensar no impacto negativo frente ao emprego, já que o uso intensivo de IA pode levar à redução de postos de trabalho para os recrutadores.

Complexo, não é mesmo? Como em tudo, há um lado bom e um lado ruim. Porém, refletir sobre a melhor decisão, a melhor estratégia, ainda é uma função fundamentalmente humana.

Sem dúvida, a AI deve ser considerada como uma ferramenta a mais para as empresas e recrutadores. Neste contexto afirmativo, cabe às empresas entenderem bem que tipo de IA aplicar e quais de suas ferramentas incorporar em seus processos. Ganhos como consistência, eficiência e assertividade sempre serão bem-vindos.

Os profissionais de recrutamento, por sua vez, devem praticar o upskilling e o reskilling para se aproveitar dos pontos positivos que a IA traz. Porque uma coisa é certa: o profissional de R&S que não se requalificar profissionalmente com as ferramentas de IA, estará fadado à obsolescência.

Assim como em qualquer outro processo, a implementação da IA no recrutamento e seleção deve ser cuidadosa e ética, garantindo que a tecnologia seja usada de maneira justa e responsável. É certo que a IA pode ser uma ferramenta poderosa para melhorar a eficiência, a equidade e a experiência no recrutamento. No entanto, é crucial que as empresas implementem essas tecnologias de maneira ética e transparente, abordando de maneira responsável as críticas e preocupações associadas ao seu uso.

Mais do que isso, a implementação de IA deve ser acompanhada de uma reflexão contínua sobre suas implicações sociais e éticas, garantindo que a tecnologia seja usada para promover a equidade e o bem-estar de todos os envolvidos, sempre. Isso porque palavras como Governança e Sustentabilidade precisam estar, a todo momento, nos pensamentos e nas decisões estratégicas.

Carlos Xavier

Systems Analysis Specialist/Product Owner/Air Traffic Management and Air Defense Expert

3 m

A questão primária a ser analisada é que temos hoje uma corrida nas empresas para utilizar a IA, mesmo não tendo a percepção clara do que fazer com ela, e sem uma análise criteriosa do grau de maturidade das ferramentas disponíveis. Pode-se facilmente constatar, por exemplo, que a capacidade da IA de aprender vieses é uma preocupação significativa. De acordo com relatórios do AI Now Institute, descobriu-se que os sistemas de IA em recrutamento replicam e até amplificam vieses sociais existentes à medida que aprendem com dados históricos. Essa replicação ocorre se a IA não for monitorada e atualizada continuamente, ressaltando a necessidade de supervisão humana para garantir práticas de recrutamento justas e imparciais. Há um marketing gigantesco em torno das benesses que a IA traz, mas fala-se muito pouco sobre os enormes problemas que tem causado. Procure, por exemplo, informações sobre o escândalo com a ferramenta de recrutamento de IA da Amazon, que ocorreu há mais de 5 anos, no qual a IA, inadvertidamente, aprendeu a preferir candidatos do sexo masculino para empregos técnicos. Esse é um caso clássico de lixo que entra, lixo que sai.

Entre para ver ou adicionar um comentário

Outros artigos de Marianne K.

Outras pessoas também visualizaram

Conferir tópicos