Por que o comercial da VW deu tão certo e mexeu tanto com as nossas emoções?

Eu resisti durante todo o dia de ontem, mas hoje não teve jeito: me rendi e assisti à campanha da VW feita através de AI com Maria Rita e Elis Regina.  

Mas por que nos emocionamos tanto com um comercial que, em sua essência, mostra "somente" a evolução da indústria automotiva e comemora o aniversário da VW? 

  EXPERIÊNCIA. 

O marketing experiencial é uma metodologia. É uma abordagem centrada no cliente para que a marca se comunique de forma eficaz com seus públicos-alvo. 

Marcas bem-sucedidas em convidar e chamar as pessoas para co-criarem e compartilharem seu desenvolvimento, inovações e conteúdo produzido estão conquistando mentes e corações em larga escala.  

Carl Jung escreveu que “qualquer obra poética viável se fundamenta em bases arquetípicas.” O poder dos arquétipos em histórias grandiosas é sua capacidade de explorar um rico repertório de associações implícitas, da mesma forma que a nossa memória consciente explora o nosso mundo vivenciado. A base associativa da memória é o motivo por que metáforas e arquétipos são tão poderosos. Eles nos permitem associar ideias e memórias em nossas mentes por meio de um conceito central, tornando-o um gatilho comportamental potente. 

E quais são os comportamentos explorados? Quais são os arquétipos que nos levaram à uma identificação tão grande com a campanha? 

 “A ideia de uma nova consciência e juventude” 

A Kombi tem a característica de ser um veículo familiar e/ou utilitário, logo geralmente se via um homem atrás do volante. Quebrar esta imagem associada ao veículo colocando uma mulher para guiar, coloca a figura feminina num lugar de poder e igualdade, trazendo consigo o recado do empoderamento.  

Elis Regina foi um ícone dos anos 60 e 70, conhecida pela competência vocal, musicalidade e presença de palco. Participou de uma série de movimentos de renovação política e cultural brasileira com uma postura artística engajada e com excelente repercussão que acompanharia toda a sua carreira.  

Em um cenário paralelo, o contraceptivo feminino entrava no Brasil, dando às mulheres maior liberdade sexual e quebrando tabus. 

Assim, faz sentido colocar uma figura forte, com voz e expressividade no cenário nacional guiando uma Kombi antiga e embalando memórias. 

 “Nossos ídolos ainda são os mesmos

E as aparências não enganam, não 

Você diz que depois deles 

Não apareceu mais ninguém” 

Quem não gosta da Kombi? Quem nunca teve vontade de passear em uma? Quem não ficou chateado quando ela saiu de linha? (E a VW se aproveitou muito bem desse saudosismo para lançar a edição especial da Kombi, numerada, que custava um rim.) E que veículo temos hoje que se compare a ela? Resposta: NENHUM.  

Podem surgir centenas de carros elétricos. Teslas, Toyotas, Volvos, BMWs, Renaults Zoe... Até o momento, nenhum é a Kombi. (E como boa fã de FIAT, também não vi nenhum que substituísse o bom e velho Uno Mille – primeiro carro de tanta gente, inclusive eu.) 

 “Você me pergunta pela minha paixão 

Digo que estou encantada como uma nova invenção”  

Colocar Maria Rita numa Kombi elétrica simboliza a continuidade de um legado de emancipação feminina, autoridade, afirmação e de uma história - ou várias. Os filhos que tinham suas fraldas trocadas no banco de trás, hoje estão guiando no banco da frente da nova invenção. É a memória afetiva falando e personificando a marca, gerando identificação, inundando o nosso organismo de ocitocina – o hormônio do amor – e bombando no engajamento e buzz (para quantas pessoas você já mandou o vídeo e quantos feeds você viu hoje o veiculando espontaneamente?). 

 É lindo, é tocante, é genial. Mas existe um processo por trás de uma campanha. 

PERSONALIDADE DE MARCA 

Em meados do século XX, a publicidade passou por uma revolução e as marcas se aprimoraram, assumindo personalidades exclusivas.  

Por meio de comunicações de marketing centradas no cliente, elas estimularam os consumidores a almejar um estilo de vida representado pela marca. Isso marcou a transição do marketing centrado no produto para o marketing centrado no cliente e de mensagens racionais para mensagens emocionais. 

Para entender melhor o que personalidade de marca quer dizer, primeiro temos que pensar dentro do conceito pessoal.  

Partindo do fato de que todos somos únicos, é impossível elencar todas as nossas características. Assim, profissionais de marketing pensam em termos de valores, mais semelhantes à nossa moral. 

Qual combinação de personalidades e valores a VW comunica neste comercial? Lembranças, vivências, família, união, histórias. E trazendo para um conceito mais atual, viagens, lazer, liberdade, autonomia e mobilidade – quem precisa ficar preso a um escritório quando se pode trabalhar de praticamente qualquer lugar?  

Gerar personalidade para uma marca atrelando-a com o estilo de vida que o cliente aspira, estimula a percepção subliminar de que, ao se alinhar com a marca, ela o aproximará de seu mundo de fantasias interior. 

Do ponto de vista do consumidor, marcas que somente falam às pessoas e não com elas, não desenvolverão relacionamentos duradouros com os clientes ou estimularão a defesa da marca. 

E a campanha falou com a gente. Ela adicionou elementos emocionais positivos para comunicar a evolução da VW. Ativou nossos sistemas emocionais e romantizaram a nossa memória ligando-a memórias intensificadas com o tempo, conforme vão se misturando à dinâmica do nosso mundo interior.  

A VW teceu com perfeição seus pontos de contato em uma bela jornada, com um storytelling incrível, proporcionando inspiração e desejo nos seus clientes. 

Fomos acolhidos com tamanha hospitalidade que pouco nos importamos com o fato de que a Kombi elétrica não é a única inovação apresentada, mas também o fato dela ter sido feita a quatro mãos com a ajudinha providencial da Inteligência Artificial.  

A função da tecnologia é transformar as ideias em arte. Ela complementa a oportunidade incrível de mergulhar o espectador no universo da marca, deixando uma impressão marcante e duradoura gravado em sua psiquê e gerando o vínculo de ouro. 

Este vínculo, até quem não tinha, criou um. Bravo, VW!  

“Pois vejo vir vindo no vento cheiro de nova estação!”