Disciplina
Foto de Brett Jordan

Disciplina

Desde que saí da última empresa em que trabalhei, venho buscando fazer um mea culpa e tentado melhorar e amadurecer alguns pontos. Por isso tenho buscado leituras, podcasts e fontes de conhecimento que ajudem a aprimorar-me como ser humano em todas as esferas da minha vida.

Um dos pontos que identifiquei como sendo cruciais para mim é a disciplina (ou a falta dela).

Embora amigos e colegas me vejam como uma pessoa disciplinada, eu não consigo me enxergar dessa forma. É algo que me incomoda e, talvez por não querer pesar a mão e ser severa demais, acabei afrouxando a corda e confundindo os conceitos de severidade e rigidez - sem perceber que uma nada tem a ver com a outra.

Corta.

Quando surgiu aquele confronto entre assistir Barbie e Oppenheimer, julguei o primeiro como fútil (após várias resenhas já sei que não é) e me interessei por Oppenheimer. Como não gosto de ver o filme antes de ler o livro, em vez da fila do cinema, fui para a fila da livraria.

Sendo um livro denso, sobre um cara com muitos conflitos existenciais e a descrição de muitos conceitos de física, estou lendo devagar para não perder nenhum detalhe. E ainda bem!

Desde sua crise emocional de 1926, Oppenheimer vinha tentando adquirir algum tipo de equilíbrio interior. Disciplina e trabalho sempre haviam sido princípios orientadores, mas ele os elevou ao posto de uma filosofia de vida.

Algumas de suas falas a respeito, citadas no livro, se destacaram para mim. Estão me fazendo refletir sobre a disciplina como base não para uma vida engessada e ditatorial, mas como guia para uma vida mais livre e mais plena.

Ele diz:

O fato da disciplina ser boa para a alma é que ela é mais fundamental do que qualquer outro fundamento. Acredito que por meio da disciplina, embora não somente por ela, podemos adquirir serenidade e uma pequena, mas preciosa, medida de liberdade em relação aos acidentes da encarnação e o distanciamento que preserva o mundo ao qual se renuncia. Acredito que por meio da disciplina, aprendemos a preservar o que é essencial para nossa felicidade em circunstâncias mais ou menos adversas, e a abandonar com simplicidade o que de outra forma nos teria parecido impensável.

Em uma carta a seu irmão Frank, ele conclui seu argumento:

"(...)portanto penso que deveríamos saudar com profunda gratidão todas as coisas que evocam a disciplina - o estudo, nossos deveres com os homens e a sociedade, a guerra, as dificuldades pessoais (...) -, pois só por intermédio delas poderemos atingir um mínimo de desprendimento e só assim poderemos conhecer a paz."

Ora, não é a tranquilidade de nossa vida financeira que almejamos? Então devemos ser disciplinados com nossas finanças. Não é a criação de nossos filhos como homens e mulheres virtuosos que almejamos? Então devemos ser disciplinados com sua educação. Para que tenham exemplo em casa e o sejam também, a fim de resguardar seu futuro. Não é um casamento feliz e próspero que almejamos? Então temos que ser disciplinados no cuidado com o outro, para que o amor, a admiração e o carinho não esmoreçam.

Enfim, dada a amplitude de aplicações dessas falas de Oppenheimer, encontrei pouco eco (diante do nível de exigência que estou tendo comigo mesma) em minhas ações cotidianas. A rotina com as crianças, com a casa, a necessidade de buscar uma nova oportunidade de emprego, de me dedicar aos estudos e ao desenvolvimento profissional através de cursos, a vontade de escrever artigos, de desenvolver também minha vida espiritual e buscar uma intimidade maior com Deus... tudo isso está embaralhado!

Tento fazer duas, três coisas ao mesmo tempo na tentativa (vã) de que todas as tarefas sejam feitas no menor tempo, da melhor forma e que tudo se encaixe em um dia só. É humanamente impossível. E também é impossível fazer tudo bem feito não estando inteiramente presente no que se está fazendo. É extenuante dar banho nas crianças pensando em usar aquele tempo para estudar. Estudar pensando em ler. Ler pensando em escrever. Tentar desenvolver uma ideia pensando na lista do supermercado. E, por fim, fazer a lista do supermercado respondendo a cada mensagem que chega no celular. Não há saúde mental que dê conta.

A necessidade de levar a vida desse jeito vem da falta de disciplina. De me planejar para ter um horário para cada coisa. E assim conseguir fazer tudo sem sacrificar a outra tarefa.

Gasta-se mais dinheiro, compra-se no impulso e depois se vê que já tinha 2 sapatos da mesma cor no armário. Magoa-se o cônjuge por não se lembrar daquela data especial. E assim começamos a ficar presos em nossa própria teia, enquanto a disciplina nos dá a liberdade de, eventualmente, improvisar quando algo sai da rotina. Porque quando voltarmos, saberemos continuar de onde paramos. Ou qual é o próximo passo que devemos dar.

Isso é incrível! (Pra mim.)

Como viver quase 40 anos sem pensar e sem agir dessa forma?!

Talvez seja um traço da cultura familiar que não prezava por isso ou que confundia, como citado acima, severidade com disciplina (e me fez ter pavor da palavra e seu significado). Mas, de fato, é algo libertador.

E, pensando em todas as referências que tenho a esse respeito, lembrando de outros livros que li cujas passagens margeavam o tema em maior ou menor profundidade, o conceito e a necessidade são os mesmos.

Li "Crianças Francesas Não Fazem Manha" quando meu filho do meio nasceu. Ele falava sobre a segurança que a disciplina traz para as crianças, sobre a disciplina ser um quadro, um limite, dentro do qual a criança tem a liberdade para explorar, crescer, se formar, brincar. E não entendi.

Na Bíblia (sou cristã) existem diversas passagens sobre a necessidade da disciplina, de fazer o que tem que ser feito - e não o que se quer fazer.

Minha prima posta sempre em seu Instagram que "criança é que faz o que quer. Adulto faz o que precisa." E sempre me incomodava ler isso. Mas ela tem razão! (Ela é justamente a prima que minha avó mais elogiava. Porque ela tinha disciplina para arrumar a cama todos os dias, lavar a calcinha no box todos os dias, varrer a casa e ajudar nas tarefas domésticas. Bom, vocês podem imaginar como eu ficava brava e achava a Marcelle MUI-TO-CHA-TA. Mas eu te amo, Magra!)

Então, bom... eu poderia abrir inúmeras aspas e dissertar horas e horas sobre o que tenho lido e tentado incorporar na minha vida em termos de disciplina. Firmei esse compromisso comigo e quando esqueço, volto rapidinho.

Hoje, estou escrevendo com plena consciência de que é algo que eu gostaria de fazer há algum tempo, e só consegui porque dediquei tempo para fazer só isso. Um tempo no qual eu não estou dividindo essa atenção com mais nada. E sabendo que daqui a pouco - não agora; agora é hora de outra coisa - eu poderei dar risada na internet.

Ponto. Parágrafo.

Decidi escrever sobre isso e compartilhar por três motivos:

  1. reforçar minhas anotações
  2. compartilhar minhas "descobertas"
  3. mostrar que um livro vai muito além do que está impresso na capa (então leiam! A leitura aguça a curiosidade! A curiosidade leva ao conhecimento! Conhecimento é poder!)

Por fim, como diz o meme, ditado popular ou seja lá que nome você dá a isso:

A sorte sempre me encontrou trabalhando!

(No meu caso, em mim mesma.)

Aprendi que a disciplina deixa a gente livre para ser criativa. Aprendi isso na física e confirmei na publicidade. Não precisa ser muito rígida, mas o suficiente para fazer seu dia a dia funcionar.

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