Porque está errado.

Provocações e reflexões em voz alta para pensar o 8 de março.


Na última sexta, dia 8 de março, tirei uma folga no trabalho pra estar em um evento em homenagem ao Dia da Mulher. Cheguei quando havia acabado de começar uma palestra que me deixou incomodada. A mulher no palco, entre frases fortes que se pressupunham inspirar, trouxe por referência o livro “Nice girls don´t get the corner office”, de Lois P. Frankel. Para quem não conhece, o livro enumera e dispõe sobre erros que as mulheres cometem e que as impedem de chegar a posições de liderança ou de terem sucesso em suas carreiras.

Não só durante o evento, mas também em todo lugar naquele dia, esse foi o tom dos discursos (como todo 8 de março). Força, guerreiras, se impor, lutar. Palavras que, dentro da minha mágica utopia feminista, pareciam já sem sentido, como se viessem de um tempo distante. Minha vó foi guerreira e lutou muito, minha mãe nem se fala. E penso que esperar das mulheres uma postura combativa para alcançarem respeito, salários justos, direitos e qualidade de vida é tão meritocrático quanto um discurso que desconhece a história. Ainda, que ignora questões de valor mesmo, como ética e justiça.

Se inspirar mulheres vem de um lugar de inflá-las a um suposto combate lá fora, não me soa arriscado dizer que é um caminho ingênuo, mais do que meus sonhos de igualdade, que – já ouvi – são quase infantis. Se não ingênuo, de mau caráter, porque sequer cogitar que se pode vencer esse embate (contra todas as injustiças e violências, no inimigo concordamos) ou que um posto de liderança, dinheiro ou o que seja a métrica, se individual, é sinônimo de vencer é estar no mesmo lugar que, cinco década atrás, minha vó estava – e que esteve para que eu não estivesse, assim como espero que daqui 50 anos não seja mais preciso falar sobre isso.

A solução, se existir, é coletiva. E quando digo isso não quero dizer que mulheres devem se envolver em grupos homogêneos, com um mesmo ideal, e combater essas lutas todas – que a gente já sabe, não cabe citar. Quero dizer o que, em 2022, escreveu a Harvard Business Review: parem de criticar as mulheres e comecemos a questionar os homens.

Entendo que quando cobramos delas a necessidade de falar mais ou menos firme, saber dizer não ou quaisquer regras para obter respeito estamos continuando um mesmo discurso criado e mantido por eles, de que a culpa pelos males é nossa, por não nos comportarmos como se deve. Assim, a solução pode ser alcançada com mudanças aqui e ali em nosso jeito de existir e eles podem assistir, passivos, a um mundo em transformação!

Não: o que nos impede de alcançar o mesmo que os homens não é um ou outro comportamento inconsciente, falta de skills de negociação ou qualquer “dica”. É que o mundo é deles, e o único jeito de mudar isso é que não seja mais. Não deveria ser óbvio?

Não sou burra de pensar que eles abrirão mão assim, de bom grado. Claro. Mas se é claro que investir nas mulheres é uma questão de direitos humanos, deve ser tratado como tal. A alternativa é fazer malabares dentro das 4 linhas: regras claras, justas, leis, iniciativas, escritas e pensadas por mulheres também. Devemos nos envergonhar de conselhos diretores e mesas de decisão compostos por maioria esmagadora (mesmo!) – quando não totalmente – de homens brancos, e a justificativa não deveria pedir mais que: porque está errado. Não sou eu quem devo me envergonhar por me embananar em uma negociação e, por isso, “sabotar minha carreira”.

Existem iniciativas e existem pessoas pensando novos jeitos de jogar, como nesse artigo da ONU Mulheres com Cinco pontos para acelerar o empoderamento econômico das mulheres e esse outro da Forbes, How Multinationals Empower Professional Women Globally.

Claro que esse texto é mais um desabafo, mas deixo esses dois relatórios que podem ajudar a gerar insights – pra usar uma palavra do momento – na hora de pensar soluções. Você pode consultar esse do Fórum Econômico Mundial e o Women, Business and the Law 2024.

Everton Sousa

Experiential Creative | Monks

10 m

Excelente artigo! Que a gente possa ver mudanças reais 🌟

Aline Luane

Architect and urban planner

10 m

Hablou e hablou

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