Porque o BC deveria parar de subir os juros

A Selic chegou em 13,25%, um elevado patamar hoje sob qualquer aspecto, seja pela expectativa de inflação futura, seja pela comparação internacional, ou até mesmo olhando o nosso histórico. Os juros subiram de maneira significativa e em pouco tempo: saímos de uma taxa de 2% em março de 2021 e em 11 altas consecutivas, foram somados 11,25 pontos percentuais na taxa básica, sendo que o mercado ainda espera mais 0,50 na próxima reunião em agosto. É a maior elevação em sequência da Selic na nossa história.

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Apesar da forte alta nos juros, é fato que a inflação continuou subindo até o pico de 12,2% em abril. Os sucessivos choques nos preços dos alimentos, energia elétrica e combustíveis, além dos gargalos nas cadeias de suprimentos, resultaram em prolongada pressão inflacionária, como observado em diversos países. A demanda reprimida, após a retirada das restrições da pandemia, e o nível mais elevado de poupança das famílias deu impulso extraordinário à atividade, inclusive em serviços, que passou a largo do efeito da alta dos juros nos últimos seis meses. Com os consecutivos choques no índice de preços, a taxa de juros real ex-post acabou ficando mais baixa que o esperado, hoje em cerca de 2%. 

Mas o cenário dá claros sinais de mudanças. A primeira delas é a queda nas cotações das commodities no mercado internacional. A redução ainda é modesta, considerando a elevação acumulada desde 2020, mas indica que, na margem, as pressões inflacionárias nos alimentos e energia tendem a diminuir e, pontualmente, podemos até observar deflação em alguns casos. Os indicadores de produção industrial em diversos países também apontam para um arrefecimento da demanda global, e as cadeias produtivas tendem a voltar à normalidade, aliviando os preços dos bens industriais. Por fim, não é somente o BC aqui no Brasil fazendo aperto monetário, praticamente todos os bancos centrais estão retirando estímulos, ou seja, as condições financeiras globais mais contracionistas contribuem para reduzir as expectativas e o risco de inércia inflacionária.

Olhando para frente, com uma inflação projetada de 5% nos próximos 12 meses (a partir da agosto, já excluindo o mês excepcional de deflação em julho) teremos uma taxa de juros real de mais de 8%. Esse é um patamar bastante elevado, até mesmo para nossos parâmetros históricos, e ainda desconsiderando uma maior potência da política monetária hoje com o fim da TJLP. Esse aperto, que tem uma defasagem maior que a usual, deve causar uma retração da  demanda interna a partir do segundo semestre desse ano e, juntamente com a demanda global mais arrefecida, terá consequências negativas para o emprego e para o resultado fiscal.

Aliás, os juros altos podem resultar em piora fiscal, mais do que o inverso. O risco fiscal tem sido sobrevalorizado, muitas vezes justificando a necessidade de mais juros. No entanto, os dados de arrecadação crescente e gastos sob controle, ambos em relação ao PIB, não comprovam a expectativa de deterioração. A dívida/PIB segue em trajetória de queda e o quadro hoje é melhor que a estimativa 12 meses atrás, mesmo com a recente Pec aprovando mais gastos e reduzindo impostos. Sim, há riscos para 2023, uma vez que ainda desconhecemos as políticas econômicas do futuro governo, se esse buscará manter uma âncora fiscal que traga previsibilidade, ou não, afinal, o caminho para a volta do crescimento dos gastos foi aberto. 

Mas com o patamar atual da Selic em 13,25%, o Copom pode pausar e monitorar o processo de desinflação e impacto das políticas recentes na demanda. A trajetória do IPCA já está em queda, apesar de lenta, sairemos de 10% em 2021, para 7% em 2022, e para próximo de 5% em 2023, voltando para o centro da meta em 2024. Como o processo é mais lento, resultado de fortes choques sucessivos, alongar o horizonte de política monetária é apropriado. Aumentar a dose de juros agora só causará mais danos à economia, com pouco benefício na aceleração da atual trajetória de convergência da inflação para a meta

No último ciclo de aperto em 2016, o BC manteve juros muito altos por mais tempo que o necessário e, como resultado, tivemos seguidos anos de baixo crescimento e inflação abaixo da meta. O investimento foi a variável macroeconômica mais afetada nesse cenário de juros extremamente restritivos. Somente a partir de 2020 o investimento voltou a crescer no Brasil e agora corre o risco de ter novamente um curto ciclo, o que pode causar impactos no PIB potencial de longo prazo, impedindo taxas maiores de crescimento sem pressão inflacionária à frente, devido à baixa capacidade produtiva. Juros menores permitindo prosperar o investimento privado é uma solução mais eficiente que a volta do investimento público.  

O BC já fez praticamente todo o trabalho do ponto de vista de política monetária e pode aguardar o efeito da defasagem trabalhar a seu favor, considerando todos os sinais aqui expostos. O risco de excesso de juros no cenário atual é significativo e o custo pode ser novamente anos de baixo crescimento, elevado desemprego pressionando a renda e suscitando políticas públicas populistas.

Izak Carlos Silva

Economista-Chefe | Professor | Conselheiro | Consultor

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Ótima análise, Rafaela Vitoria, CFA. Concordo em gênero, número e grau. Todos os fundamentos da economia indicam que o patamar atual de juros é suficiente para trazer a inflação de volta ao centro da meta no horizonte relevante da política monetária. Na minha avaliação, a piora nas expectativas de inflação, no momento, está associado mais com a dificuldade de comunicação do Banco Central do que com o grau de ajuste da política monetária.

Ronan Alexandre, CGA - MSc - CQF

Gestor de Investimento | Economista | Empreendedor

2 a

Concordo, ainda mais vendo como a expectativa de inflação para os próximos 12 meses melhoraram significativamente.

Leonardo Lamounier

M&A | Valuation | Modelagem Financeira | FP&A | Project Finance | Corporate Finance

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Um ponto que ainda o BC pode estar observando é a inflação/juros dos EUA. Fora isso, o texto está competentemente assertivo

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