Prevenção do suicídio: O que pode ser feito?

Prevenção do suicídio: O que pode ser feito?

Estamos no setembro amarelo, um mês de conscientização e prevenção do suicídio. O movimento que busca criar consciência popular a respeito de um dos maiores causadores de mortes no Brasil nos últimos anos, e discutir as estratégias de prevenção ao suicídio.

É muito importante que a sociedade entenda e discuta sobre a temática. É através da informação que podemos proporcionar um acolhimento adequado para pessoas que se encontram em risco.

Que tal conhecer um pouco mais sobre? Como podemos nos posicionar e acolher uma pessoa que está com risco de suicídio? Nesse artigo me proponho a falar um pouco sobre o fenômeno, e de que maneiras podemos ajudar essas pessoas.

Os números no suicídio

Há cada 40 segundos uma pessoa se suicida no mundo. No Brasil, esse número é um suicídio a cada 45 minutos. É um número assustador!

Mas existe uma outra estatística que nos traz um pouco de esperança:

  • 90% dos suicídios poderiam ter sido evitados

Isso significa dizer que, em 90% dos casos, algo poderia ter sido feito para evitar esse desfecho fatal. Ou seja, de alguma forma, dispondo de nossa atenção, disponibilidade e também conhecimento, é possível entender, acolher e ajudar essa pessoa que tem pensamentos suicidas. Mas é imprescindível entender primeiramente o que está passando pela cabeça daquela pessoa.

O suicídio

De maneira bem simples, o suicídio é o ato deliberado de terminar com a própria vida. Não existe um único fator que determina um suicídio, mas uma multicausalidade de fatores, ou seja, devemos levar em considerações questões biológicas, psicológicas, sociais, ambientais e culturais.

Garota de costas para a parede com blusa amarela protegendo o rosto do sol com a mão esquerda

Mas o suicídio não é um ato que surge de um dia para o outro. Há uma construção desse comportamento, que surge com questões não resolvidas do dia a dia. Gosto bastante de usar a metáfora da bola de neve descendo uma ladeira cheia de neve. A cada metro que a bola desce, maior ela vai ficando.

Ele começa com um desejo de morte: “não vale a pena viver”, “eu deveria morrer”, e é causado por uma desesperança ou impossibilidade de lidar com alguma situação.

Em seguida, surge uma representação suicida, onde a pessoa se imagina morta, imagina um mundo onde ela não exista mais, e como os seus problemas se “resolveriam” com isso.

Então surge a ideação suicida sem planejamento da ação, e a ideia de terminalidade já se encontra presente, mas sem planos específicos: “vou me matar, não sei como, mas vou me matar”.

A seguir surge a ideação suicida com planejamento inespecífico. Nesta etapa, a pessoa já começa a ter visualizações mais específicas sobre o ato.

E por fim, a ideação suicida com planejamento, onde ela já definiu método, data e hora.

Fases do suicídio

É mais ou menos dessa forma que podemos entender o suicídio. De uma maneira comportamental, como podemos observar no comportamento:

  • comportamento auto lesivo – nessa etapa, não frequente em todos os casos, ocorre o dano físico ao próprio corpo, sem a intenção de morrer. Apesar de não contemplar o suicídio, ele pode ser considerado etapa inicial de um comportamento suicida, por seu caráter auto lesivo. Mais comum em adolescentes e em mulheres, a auto lesão tem o propósito de diminuir uma dor causada por um desconforto subjetivo, por autopunição de um sentimento de culpa, redução da tensão. Apesar de não ter a característica de não letalidade, pode se tornar gradualmente mais resistente, causando mortes acidentais.
  • Ideação suicida – ideias e pensamentos sobre morrer, sobre estar morto, ou de se suicidar. Repare que nessa etapa não se tem uma ideia clara sobre o suicídio, e sim da morte, da ausência, de não estar mais lá, mas sem planos objetivos sobre o suicídio.
  • Tentativa de suicídio – comportamento auto lesivo com desfecho não fatal. Neste caso já se tem a intenção de se suicidar, que pode ter sido planejado ou um ato impulsivo. Nesta etapa, a pessoa já apresenta o maior risco de morte. A partir da primeira tentativa, o risco de repetição é maior, e o grau de letalidade tende a aumentar, por isso a intervenção deve ser imediata e irrestrita.
  • Suicídio – Ato deliberado e intencional de causar a morte a si mesmo, com desfecho fatal.

A partir dessa análise didática dos estágios do comportamento suicida, podemos entender um pouco sobre o que passa uma pessoa que tem comportamentos suicidas.

Mas o que devemos observar em uma pessoa?

Multicausalidade de fatores

Não existe apenas um motivo para o suicídio, como falei acima, há uma série de fatores que influenciam neste comportamento.

Devemos ficar sempre atentos aos sinais de alerta, que são predominantemente verbais e comportamentais. Observar esses alertas fazem parte da estratégia de prevenção do suicídio. Comportamentos como despedidas: “não estarei aqui no próximo ano”, ou colocar assuntos e contas em ordem, decidir fazer ou ajustar o testamento, dar ou devolver bens sem explicação.

Além das observações dos sinais de alerta, é importante conhecer os fatores de risco e de proteção que fazem parte da vida da pessoa.

Fatores de risco e fatores de proteção

Fatores de risco e de proteção são fatores que aumentam ou diminuem a probabilidade de um resultado negativo entre indivíduos que estão em risco. Seguem alguns exemplos:

Fatores de risco

  • aspectos do comportamento, como impulsividade, falta de resiliência, desesperança e dificuldades de enfrentamento;
  • Estilo de vida, como abuso de álcool e outras substâncias;
  • Fatores econômicos podem vir a ser um fator de risco, como o desemprego;
  • Presença de doença ou dor crônica, além de fatores genéticos ou biológicos;
  • Histórico de violência físico ou sexual sofrida;
  • Transtornos mentais;
  • Histórico de suicídio entre próximos ou familiares

Fatores de proteção

  • Suporte social e afetivo de familiares e amigos, com bons vínculos afetivos, sensação de estar integrado;
  • Informação, por conselhos, referências e sugestões, isso inclui atenção adequada de grupos e de profissionais de saúde;
  • Instrumental, como tempo e situação financeira adequada.
Garota negra sentada com a cabeça apoiada no joelho. Ela usa uma blusa amarela

Obviamente que os fatores de risco e de proteção listados aqui são só exemplos. O importante é se atentar aos fatores que permeiam o dia a dia da pessoa que intensificam seu sofrimento ou que o aliviam. Nem sempre o que é considerado um fator de risco para uma pessoa pode ser considerado para outra pessoa. Por exemplo: Duas pessoas foram vítimas de abuso físico durante a infância. Uma delas se fechou e não procurou ajuda, já a outra tem acompanhamento desde cedo. A pessoa que não procurou ajuda pode ter desenvolvido um comportamento de esquiva e evitação frente a situações difíceis. A dificuldade, muitas vezes, pode fazer com que a pessoa procure ajuda, e se informe e se instrumentalize para lidar melhor com aquele problema.

A seguir falo um pouco sobre as estratégias de prevenção do suicídio

Prevenção ao suicídio

Prevenção pode ser considerada qualquer ação ou medida que vise a interceptar a causa de uma doença antes que ela atinja algum indivíduo. Especificamente para o suicídio, são atos que previnem o aparecimento do pensamento e/ou comportamento suicida.

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São três os tipos de estratégias de prevenção do suicídio descritos pela literatura:

  • Universal – destinada à todas as pessoas, com intuito informativo, para que as pessoas tenham conhecimento do fenômeno e de saberem o que fazer ao observar situações de risco com ela e com outrem. Ex: políticas públicas, grupos de discussão, redes sociais e internet, palestras e artigos a respeito do tema, projeto de prevenção de violência nas escolas e na comunidade, sistema de acolhimento da comunidade.
  • Seletiva – já orientado para um público mais fragilizado, como vítimas de abuso físico ou sexual, pessoas afetadas por conflitos ou desastres, refugiados ou imigrantes, familiares de suicidas, pessoas com transtornos mentais, adolescentes e idosos. Ex: Tratamento de transtornos mentais, , farmacoterapia, psicoterapia, intervenções psicossociais na comunidade, linhas telefônicas de ajuda (CVV), acolhimento a adolescentes e idosos.
  • Indicada – específico para população que já apresenta risco considerável ou começaram a manifestar comportamento de risco. São pessoas que já tentaram suicídio ou demonstraram sinais de alerta. Ex: Grupos de apoio comunitário, constante monitoramento, de modo a aumentar a adesão ao tratamento e a diminuição de reinternação.

Existe ainda uma quarta intervenção do suicídio que é chamada de Pósvenção, que é a prevenção de futuros suicídios.

Pósvenção

A pósvenção, antes vista como estratégia interventiva apenas para sobreviventes de suicídio, hoje entende que o sobrevivente não é apenas a pessoa que cometeu o ato, mas também as pessoas que tem ou tiveram contato direto com o suicídio. Estima-se que a cada suicídio, de 6 a 14 pessoas são diretamente influenciadas pelo ato. Essa exposição, um fator de risco, demanda intervenções, apoio e atenção à pessoa, por conta do luto e da dificuldade em aceitar o ato de alguém próximo.

Não apenas familiares e amigos devem ter atenção, profissionais que trabalham em emergências, profissionais de segurança pública e de atendimento de ocorrências, profissionais da área da saúde e de emergência também são expostas, muitas vezes, diariamente, em situações com suicidas e com a morte.

E pra encerrar…

O mais importante é o acolhimento ao sofrimento do outro. Antes de qualquer coisa, devemos nos tornar humanos ao seu sofrimento, e buscar ouvir e entender sem prejulgamentos ou juízos de valor. O desdém e o julgamento só farão com que a pessoa evite ainda mais falar sobre o assunto.

Dois bonecos de pelúcia amarelos sentados em um banco de madeira. Em um deles está escrito "happy" na barriga, e no outro "Keep on smiling"

Cada pessoa entende e lida com o seu sofrimento de forma muito particular, então sensibilidade e empatia são peças-chave para a intervenção de pessoas com pensamentos ou comportamentos suicidas.

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