Previsões, imprevisões e imprevistos: o 2025 além do óbvio
Analistas, especialistas e futuristas todo ano exibem suas previsões nunca verificadas 12 meses depois. Está na hora então de ver o que não esperamos sob outros olhos
O leitor deve estar se perguntando, a partir da palavrinha perdia no meio do título desse post: “como assim, imprevisões? O que vem a ser uma imprevisão?” Antes de responder a essa pergunta, vamos dar o contexto: a cada final de ano, um enxame de analistas, palpiteiros, consultores, futuristas e especialistas aparece, nas mídias sem assunto e nas redes sociais sem juízo para exigir seus prognósticos, previsões para o ano seguinte. Como ninguém anota esses “dados” e nem se dá ao trabalho de checar 12 meses depois, o ciclo se repete.
Previsões e prognósticos são sintomas da “infodemia”, a epidemia de informação excessiva, que causa sobrecarga cognitiva e interfere na nossa capacidade de julgamento. Daniel Kahneman, Olivier Sibony e Cass Sunstein escreveram “Ruído, uma falha no julgamento humano”, comentando, com fartura de exemplos e dados, o quanto o overload de informação inútil, os ruídos comprometem nossa capacidade de decisão, distorcendo nossa visão dos fatos.
Melhor do que perder tempo com previsões normalmente inúteis e improdutivas, é ter em mente que a incerteza é dominante. A cada ano, fatos novos, circunstâncias e movimentos diversos, culturais, sociais, econômicos e políticos se combinam para fazer picadinho do previsto e dar razão à incerteza. Daí a opção pela imprevisão, ou seja, abrir mão das previsões que circulam por aí e se preparar para o imprevisto.
Em tese, uma imprevisão é uma renúncia ao planejamento, logo, um elogio à imprevidência e até mesmo à negligência. Mas vamos lá: quantas empresas realmente se dignam a fazer planejamentos ano após ano e, mais ambiciosamente, executar esses planos? Ainda que tenhamos empresas disciplinadas que planejem e se disponham a executar um planejamento, quantas delas não têm de rever esse documento após 3 meses? Metas são mais fáceis e mais claras e, por isso mesmo, podem ser perseguidas com total adaptação às circunstâncias em jogo, eventos como uma pandemia, a adoção de um meio de pagamento como o PIX, um ano sem inverno, a onda dos sites de apostas, uma nova tecnologia, não importa. Quanto mais exposto ao acaso um negócio estiver, e quanto menor o controle possível sobre as condições de exercício de uma atividade, maior o impacto da falta de habilidades essenciais à competitividade, basicamente bons sistemas e práticas de experiência do cliente e inovação.
O varejo, em especial, com sua dinâmica e a pressão constante por manter o caixa saudável, deveria priorizar permanentemente a incerteza como parte fundamental do negócio. Isso significa, por um lado, a impossibilidade de enquadrar o futuro em um mundo VUCA - você sabe, a sigla que significa Volátil, Incerto (uncertainty, no inglês original), Complexo e Ambíguo - tanto mais incerto nesses tempos conturbados. Por outro, o varejista deveria buscar sinais no presente que tenham poder para mexer no negócio no curto prazo e mesmo no futuro próximo.
Por isso, ao falar de imprevisão, a recomendação é estimar a possibilidade de ocorrência dos fatos e os percentuais dos desdobramentos, em árvores de decisão mais estruturadas, tridimensionais e não chapadas. Um exemplo: de que vale prever um crescimento de 2% para esse ano, ou no intervalo de 1,5 a 2,7%, se qualquer número aí será certamente inferior à inflação, que, com 99% de chance será superior a 3,5% (na verdade, a melhor aposta é em torno de 5%, com probabilidade de 70-75% de ocorrência)? Outro exemplo: orientar o sortimento para a “Geração Z” é uma decisão com alto risco. Pensando em moda, o Fast Fashion combina mais com um público maduro, já que o Z muda de gosto com velocidade instagramável e não encontra nas lojas físicas o que procura. Daí a recorrência ao sortimento rápido, enxuto e infinito das lojinhas asiáticas on-line.
O varejo deveria considerar repensar a experiência do cliente e potencializar a oferta da “Felicidade do Fortuito”, ou seja, criar formatos para atender um consumidor volúvel, que enxerga toda compra como descartável, válida somente para um determinado momento da vida. E essa é uma aposta melhor para motivar vendas considerando um cenário de juros lunares ao longo de 2025 (e também em 2026, uma aposta ambiciosa, com 60% de chance de se concretizar – qual seja, o ano eleitoral com juros básicos acima dos 15%).
Acima de tudo, todo varejista deveria ter profissionais voltados para separar sinais de ruídos e estatísticos capazes de estimar o impacto potencial de eventos fortuitos. Um aumento de tarifas de produtos brasileiros importados pelos EUA, tem correlação com algum fator que possa inibir vendas? Um fenômeno da música ou um movimento cultural ou uma discussão do BBB pode resultar em vendas de um determinado produto? Um cashback que se converta no pagamento de uma mensalidade de streaming do cliente pode gerar recorrência? Um ano mais chuvoso em determinadas regiões pode ser explorado de que forma? O que o comportamento do consumidor diz sobre o tamanho dos SKUs disponíveis? Quais as características exclusivas que caracterizam a experiência do cliente no seu negócio? E quais os marcadores sociais que tornariam essa experiência marcante e digna de ser repercutida pelo cliente? Em que conversa de consumidores essa experiência se enquadra?
Não se faz nada disso sem ler os sinais para extrapolar a criação de oportunidades de gerar vendas e valor de gratificação para o cliente. Quando o negócio se deixa orientar apenas pelas previsões imediatas, se torna simplesmente um produtor ostensivo de mais do mesmo. E aos olhos dos consumidores, mais ansiosos e em busca de dopamina para lidar com um mundo para eles também incerto, a rotação da decisão é outra. Pegadas e pistas digitais são deixadas aos terabytes na rede. E essas pistas indicam caminhos para serem explorados e sonhos sendo arquitetados e descartados. E “sonho é apenas uma palavra para quem não tem nada a perder”, cantava Janis Joplin. Esse é o espírito do tempo de consumidores que não têm nada a perder, e que não admitem o direito de errar nas suas escolhas.
Por essas e outras, ainda há tempo para rever o seu planejamento estratégico. Se ele contemplou as previsões de praxe, fique com as imprevisões e ajuste o radar para abraçar a incerteza. Empresas aptas a enxergar o impacto do imprevisível e responder com ideias também imprevisíveis terão mais chances de fechar 2025 com um resultado melhor que 5% acima da evolução da PIB somada à inflação do período.
Gerente de Experiência do Cliente | Satisfação do Cliente | NPS & CSAT | Jornada do Cliente | Processos & Qualidade | Consumer Insights | Indicadores & Performance | Eficiência Operacional
3 semA única certeza é a incerteza. E a capacidade de resolver problemas complexos é inerentemente humana, não há trend de IA que resolva isso. Adorei a provocação, Jacques. Bora pensar fora da caixa! Vale para o varejista, vale para os demais segmentos.
Proprietário, alfaiatedoslivros...livros sob medida
3 semMuito bem,Jacques. acho que BANI é mais atual BANI é uma sigla em inglês que significa "Brittle, Anxious, Nonlinear, and Incomprehensible", ou seja, "Frágil, Ansioso, Não Linear e Incompreensível" em português. É um conceito que descreve o paradigma atual da sociedade e que se tornou conhecido em 2020, durante a pandemia de COVID-19. O antropólogo norte-americano Jamais Cascio foi quem cunhou o termo. A teoria ganhou força após a pandemia, que revelou a dificuldade dos seres humanos em controlar os acontecimentos. O mundo BANI é caracterizado por uma realidade em constante mudança, onde respostas antigas são rapidamente invalidadas. Isso pode dificultar a comunicação e a produtividade, mas existem algumas formas de lidar com essa situação. Algumas estratégias para lidar com o mundo BANI são: Priorizar a transparência nas comunicações Criar canais de comunicação mais eficientes Construir uma cultura de feedback Desenvolver habilidades intrapessoais, como auto-estima e autoconhecimento
50bem+ COM ALMA DE CRIANÇA. /+ 3 DÉCADAS DEDICADAS AO DESIGNER DE EXPERIÊNCIAS /UMA GENERALISTA ESPECIALISTA EM COCRIAÇÃO DE MEMÓRIAS AFETIVAS,.
3 semJacques Meir tudo é inconstância nesse mundo. Cada vez mais apostar nela deve ser também uma premissa a ser computada e avaliada nas mais diferentes estratégias. As pessoas mudam, o mundo muda, é o óbvio que teima-se em não se ver.