Proteção ou preparação para a automação?
Você sabia que a nossa Constituição prevê a criação de medidas legislativas que protejam o trabalhador da automação?
Pois é! É o que está previsto no rol de direitos conferidos aos trabalhadores urbanos e rurais, mais especificamente no art. 7°, inciso XXVII, da Constituição: “proteção em face da automação, na forma da lei”.
E em julho deste ano a Procuradoria Geral da República - PGR ajuizou uma ação no Supremo Tribunal Federal para que o Judiciário declare que houve uma omissão do Congresso Nacional ao não editar essas leis protetivas.
A pergunta que faço é: o trabalhador precisa de ‘proteção em face’ da automação? Ou o trabalhador precisa de ‘preparação para’ a automação?
A leitura da petição inicial da ação ajuizada pela PGR (ADO/73) nos faz pensar que seu autor está bastante desconectado da realidade. E basta uma singela análise nos anúncios de emprego e notícias do mundo corporativo para vermos que a automação não roubou os empregos, ela os mudou. E muito! E o trabalhador não está preparado para isso.
A automação, consequência do desenvolvimento tecnológico, e todo o processo em torno dela gerou uma grande demanda de profissionais capacitados para este mercado, mas a oferta de profissionais não acompanhou esse desenvolvimento na mesma velocidade.
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Assim, para suprir sua demanda de profissionais capacitados, a iniciativa privada não ficou esperando pelo legislador: ao mesmo tempo em que foi automatizando seus processos, tarefas e linhas de produção, foi também atrás de treinar seus colaboradores e lançar mão de medidas de gestão que favoreçam a inovação. E mais: ainda oferece oportunidades aos que queiram estudar e se preparar para a nova realidade, oferecendo cursos gratuitos e bolsas de estudos, criando laboratórios em comunidades carentes em busca de talentos, criando espaços de inovação dentro das próprias empresas, ou juntando forças em hubs de inovação.
Entretanto, para que o cidadão possa alcançar tais oportunidades, ele precisa ao menos saber ler, escrever, interpretar textos e fazer contas. Mas o nosso analfabetismo continua em níveis elevadíssimos, especialmente o analfabetismo funcional. De acordo com a Agência Brasil, em 2018 cerca de 38 milhões de brasileiros eram considerados analfabetos funcionais, o que corresponde a cerca de 18% da população.
A educação básica e de qualidade é, portanto, condição indispensável para a preparação do trabalhador para a automação, seja ele recém-ingressado no mercado de trabalho ou um trabalhador que precisa de requalificação. Isso sim, é papel do Estado.
E onde está o Estado enquanto isso? Aplicando seu tempo – e dinheiro público – em ações judiciais que o obriguem a criar mais leis, as quais, quando forem colocadas em prática – se forem – já estarão desatualizadas. Seria muito mais eficaz, portanto, que o Estado começasse pelo começo, fornecendo uma educação primária de qualidade e ensinando aos jovens não a se proteger da tecnologia, mas a dominá-la.
(Artigo publicado originalmente no Jornal A Tribuna em 06/08/2022).