Quando Arquétipos e Anúncios se Encontram na Sala de Reunião
Imagem gerada com DALL-E3

Quando Arquétipos e Anúncios se Encontram na Sala de Reunião

Fui chamado para dar uma consultoria de marketing para uma empresa. Daquelas de médio porte, com aquelas dores que as empresas de médio porte têm...

 

Sentado na sala de reuniões, consigo cortar a tensão no ar que paira à mesa. O café já esfriou na xícara, mas ninguém parece notar. "Engajamento baixo nas redes sociais, conversão quase zero", diz o gerente, folheando gráficos e números.

 

"Vamos dobrar o orçamento em anúncios pagos!", sugere um.


"E que tal um sorteio? Todo mundo adora sorteio!", exclama outro, como se tivesse descoberto o segredo da juventude eterna.


"Podemos também contratar um influenciador!", oferece um terceiro, confiante de que a solução para os problemas do mundo é uma selfie bem tirada.


"E se a gente comprar aquele curso online, o fulano promete 100.000 seguidores em 30 dias!"

 

Olho para eles e vejo o desespero vestido de "soluções" que ouviram algum guru falar no Instagram. São como pescadores jogando redes ao mar, esperando que alguma coisa — qualquer coisa — morda a isca. Mas o oceano é vasto e indiferente aos seus anzóis.

 

Não digo nada ainda. O valor do silêncio em um momento como este é subestimado. Deixo que falem, que sugiram, que revelem o tamanho do buraco onde se encontram. O silêncio é o meu radar, e com ele, capto a extensão da confusão. As sugetões continuam por um tempo, a medida que a irritação do gerente fica mais aparente.

 

“Qual a história que sua empresa quer contar?” Pergunto de súbito.

 

A pergunta parece ofender o gerente, que franze a testa e dispara: “que que você está falando? O foco aqui é melhorar resultados, não contar história.”

 

Respiro fundo e começo a contar justamente, uma história. "Conheço uma empresa que enfrentava desafios similares aos seus. Eles decidiram mudar a forma como conversavam com seu público. Em vez de falar sobre o produto, começaram a falar sobre as pessoas. Criaram uma campanha centrada em três palavras simples."

 

"A empresa passou a mostrar histórias de pessoas comuns fazendo coisas extraordinárias. Uma mulher que começou a correr depois dos 60. Um jovem que superou o bullying através do esporte. Três palavras simples, mas carregadas de significado, uniam essas histórias."

 

O gerente, claramente irritado, interrompe. "Tudo bem, eu sei de quem você está falando, mas nós não temos o orçamento desse tamanho."

 

Sorrio e respondo, "Então, você sabe que falo da Nike. E a campanha era 'Just Do It'. Mas a lição aqui não é sobre o orçamento. É sobre a narrativa. É sobre encontrar a história que sua marca quer contar e fazê-la de forma autêntica. Eles não estavam vendendo tênis, estavam vendendo uma ideia, um arquétipo."

 

O gerente parece ponderar minhas palavras, mas o ceticismo ainda está lá. "Ok, mas como isso se aplica a nós? Não somos a Nike."

 

"Exatamente," digo. "Você não é a Nike. Você é você. Qual é a sua história? Qual é o seu 'Just Do It'? Isso é o que precisamos descobrir."

 

O silêncio volta à sala, mas desta vez, é um silêncio pensativo. Não resolvemos os problemas ainda, mas algo mudou. E é um começo.

 

"Agora, já que mencionei a Nike, vou me aprofundar um pouco mais. Eles usam o arquétipo do Herói em sua comunicação. Um arquétipo é um símbolo universal, algo que ressoa com todos nós porque está enraizado em nossa essência. Jung, o psicólogo suíço, foi um dos pioneiros em explorar isso."

 

"Então, o que a Nike faz? Eles não vendem apenas tênis ou roupas esportivas. Eles vendem a jornada do herói. O esforço, o suor, a superação. E isso ressoa com as pessoas porque todos nós, em algum nível, nos vemos como heróis de nossa própria jornada. Você pode pensar nos arquétipos como um guia para contar a sua história."

 

"Mas antes de você descartar isso como algo que só uma marca como a Nike pode fazer, pare e pense. Cada marca tem um arquétipo que melhor representa sua essência, e esse arquétipo vai ressoar com um grupo específico de pessoas. O desafio é descobrir qual é o seu."

 

"É aí que entra a importância de olhar para dentro, entender seus valores, sua missão e como você quer impactar a vida das pessoas. Com isso, podemos começar a construir uma narrativa autêntica em torno de um arquétipo."


"Então, encontrar o arquétipo é só o começo, meus amigos. É como descobrir a primeira pista de um tesouro escondido. A pista pode te apontar a direção, mas o mapa inteiro? Ah, esse você tem que desenhar. E como se desenha esse mapa? Com a comunicação, claro. Com a forma como você vai contar essa história ao mundo."

 

"Não adianta ser o Herói se você fala como o Bobo da Corte. Não adianta ser o Criador se você se comunica como o Governante. Cada arquétipo tem sua linguagem, seu tom, sua forma de ver o mundo. E é isso que vamos explorar agora. Vamos entender como cada um desses arquétipos se comunica, como eles contam suas histórias."

 

"Porque, no fim das contas, o que faz uma marca não é só o produto que ela vende, mas a forma como ela se comunica. É a voz que ela usa para falar com seu público. E essa voz precisa ser autêntica, precisa ser verdadeira, precisa ser sua."

 

"Então, preparem-se. Vamos embarcar nessa jornada juntos, desenhar esse mapa, encontrar esse tesouro. E quem sabe, no fim de tudo, não descobrimos que o verdadeiro tesouro era a jornada em si, o aprendizado, a descoberta de quem realmente somos e o impacto que podemos causar no mundo?"

 

A sala fica quieta, mas é um silêncio diferente. Não é mais tenso ou desesperado. É o silêncio de mentes que começam a pensar de maneira diferente. De mentes que começam a ver possibilidades.

 

"Sigamos com as histórias desses arquétipos que, acredite, estão em todos nós de alguma forma," digo, olhando para cada pessoa na sala.

 

"Já ouviram falar do Inocente? É aquele que quer um mundo simples e feliz. Pense no shampoo que promete acabar com as caspas. Compra, usa, e pronto, problema resolvido!"

 

Um colega interrompe: "Ah, tipo fast-food, né? Comer e ser feliz!"

 

"Exato! Agora, o Explorador quer mais. Ele não fica em casa. Quer descobrir o mundo, sabe? Como aquelas marcas de roupas de aventura."

 

A sala parece animada. "E o Sábio?", pergunta alguém.

 

"Ah, o Sábio quer entender tudo. É o tipo que lê a Folha de São Paulo e assiste à CNN. Quer saber, não só ouvir."

 

O gerente acena, entendendo. "E o Herói?"

 

"O Herói quer vencer. Superar desafios. É o tênis que te faz correr mais, a academia que te faz mais forte."

 

Alguém grita lá do fundo: "E o Rebelde?"

 

"Ah, esse quer quebrar as regras. Pensa na Apple nos primeiros anos. Diferente de tudo. Ele é chamado de O Fora da Lei."

 

O gerente sorri. "E o Mago?"

 

"O Mago quer transformar. Não é só sobre magia, é sobre mudar a realidade. Pode ser um aplicativo que organiza sua vida ou um curso que promete um novo você."

 

"Tem mais?", pergunta o gerente, agora curioso.

 

"Claro! O Cara Comum é o café de todo dia, o sabão em pó de sempre. O Amante é o perfume que você não resiste. O Bobo da Corte é aquele refrigerante com comercial engraçado."

 

"Estou vendo que cada arquétipo tem seu lugar", diz o gerente.

 

"Sim, e tem o Prestativo, que só quer ajudar. O Criador, que quer fazer algo novo e único. E o Governante, que quer ordem e estabilidade."

 

O gerente parece pensativo. "Então, cada marca pode ser um desses arquétipos?"

 

"Exatamente. E aí, qual você acha que é a sua marca?"

 

A sala fica em silêncio, mas é um silêncio cheio de possibilidades.

 

"Não é uma tarefa fácil, admito. Mas é uma jornada necessária. Porque no fim das contas, o que nos move não são apenas os produtos que compramos ou os serviços que usamos. O que realmente nos move são as histórias que contamos e as que acreditamos. São os arquétipos que habitam essas histórias, dando-lhes vida, cor e significado."

 

Então, enquanto a reunião se encerra e cada um volta para sua mesa, para seu mundo, fica no ar uma pergunta silenciosa, mas poderosa: Qual é a sua história? Qual é o seu arquétipo? E como você vai usá-lo para fazer a diferença no mundo?

 

O silêncio já não é mais um peso, mas uma pausa para reflexão. Marcamos uma próxima para entender qual é o dessa empresa e como aplicar isso uma estratégia de conteúdo.

 

Saio da sala com a sensação de que algo mudou, algo começou. Talvez uma nova história, talvez uma nova jornada. E isso, para mim, já valeu a pena.


Gostou? Fique ligado para acompanhar a próxima reunião, onde elaboro o plano para identificar o arquétipo principal da empresa e estruturar a comunicação.

 

 

Mariana Colli

Marketing no Agronegócio | Product Marketing | Inteligência de Mercado | Go-to-Market | Automação

1 a

Sensacional! Resumiu conceitos e livros em um bate-papo delicioso. Ansiosa pelo próximo texto.

Gustavo R. Alves

Innovation for Circular Economy and Climate Change

1 a

Muito interessante 🧐

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