A razão pela qual você nunca vai inovar sem paradoxos

A razão pela qual você nunca vai inovar sem paradoxos

A gigante General Electric, do alto de seu faturamento de US$ 150 bilhões anuais, está preocupada. Sua preocupação vem da compreensão de que o sucesso de um negócio nos dias atuais exige a combinação de duas culturas conflitantes: a cultura da performance e a cultura da inovação.

É o que se deduz de sua decisão, divulgada em 2014, de embutir o conceito de lean startup em toda a sua operação. A premissa da GE agora é fazer com que produtos, serviços e modelos de negócio imperfeitos cheguem mais rápido ao mercado e ir adaptando-os conforme o feedback. O que são essas duas culturas conflitantes? Partindo de uma definição simples de cultura –“é o que os colaboradores fazem quando o chefe não está olhando”–, pode-se dizer que os colaboradores tendem a privilegiar o desempenho ou a inovação, nunca os dois ao mesmo tempo.

Internacionalmente, estudiosos como o professor e pesquisador belga Wim Buekens, da Vlerick Business School, e Alex Osterwalder, o criador do canvas gerador de modelos de negócio, alertam para a tensão existente entre a execução e a inovação.

Fica fácil sentir a intensidade dessa tensão fazendo um paralelo com a música: imagine, no ano 2000, você tocar uma canção de Orlando Silva, o seresteiro das multidões, e o funk do morro do Rio de Janeiro para o mesmo público. Não vai funcionar bem, e é isso que as empresas fazem todos os dias.

O problema é que o passado e o futuro têm de ser tocados juntos no presente se as organizações quiserem sobreviver hoje e ter sucesso amanhã.

O primeiro passo para conseguir isso é realmente entender os paradoxos existentes entre performance e inovação e atacá-los direta e intencionalmente da única maneira possível: por meio das pessoas. 

Os paradoxos iniciais

 Em 2013, Wim Buekens publicou um paper intitulado Coping with the Innovation Paradox: the Challenge for a New Game Leadership. Nele, argumenta que a atual formação dos executivos, como nos MBAs, ensina que bons gestores são os que mantêm o controle das coisas e buscam a estabilidade acima de tudo, o que acaba sendo a raiz do problema. Segundo ele, um “sistema tão otimizado que não tenha desperdício dificilmente conseguirá inovar”.

No paper, detalha os cinco paradoxos entre inovação e performance. Não há ISO 9000 e programa 6-sigma que bastem em uma empresa quando ela busca a performance. Até o processo de inovação será estruturado nos mínimos detalhes e… travará.

 

Por quê? Porque controles levam à perda da flexibilidade para fazer diferente da norma e para responder às situações que emergem. “Em sistemas super-regulados, só dá para fazer o que é explicitamente permitido; todo o resto é entendido como proibido”.

 

 

É verdade mesmo que não se aprende com o sucesso? Bem, a própria evolução humana é contada como uma história de tentativa e erro e aprendizado com o erro.

De fato, costuma ser muito mais difícil identificar as causas de um acerto – que podem incluir sorte, coincidência ou tropeço alheio do qual não se soube – do que as de um erro. Não faltam ferramentas para investigar erros, a começar pela análise da satisfação de clientes.

A cultura da performance, que premia o acerto, leva as pessoas a varrer o erro para debaixo do tapete ou a evitá-lo a todo custo ao mínimo sinal de que ele é possível.

 

 

A máxima futebolística de que “em time que está ganhando não se mexe” ilustra com perfeição essa mentalidade ainda dominante na maioria das empresas. Mantêm-se os mesmos jogadores, com a mesma técnica e usando a mesma tática.

 

Profissionais de qualquer área, e os cientistas em particular, tendem a fechar-se em seus silos de conhecimento e execução. É um lugar seguro, onde não recebem questionamentos a que não saibam responder

 

 

 

Porém a contrapartida disso é a não abertura a novos aprendizados.

 

 

 

 

 

 

 

 

Qual a solução?

 Alex Osterwalder propôs uma solução: a gestão dual, segundo a qual duas organizações coexistem em uma, com dois CEOs distintos.

Isso parece contornar a diferença de mentalidade aparentemente insolúvel entre os protagonistas da cultura da inovação –os criadores– e os da cultura da performance –os gestores: os primeiros priorizam a descoberta de recursos, enquanto os segundos privilegiam a exploração de recursos.

Os paradoxos, porém, continuam a existir nesse caso, apenas os caminhos para descobrir e explorar recursos são separados estruturalmente.

Quem deve fazer essa gestão são os líderes estratégicos capazes de privilegiar, em seus subordinados, cinco características: visão do futuro, iniciativa, talento (maior que o deles, líderes, inclusive), aprendizado e engajamento.

Além disso, seis medidas práticas a esses líderes, que influirão justamente na cultura da empresa, ou melhor, no que seus subordinados –até o estagiário– farão quando eles não estiverem olhando:

  1. Que apoiem as paixões de seus colaboradores, mas exigindo que busquem objetivos concretos relativos a elas.
  2. Que desafiem seus funcionários o tempo todo e, em paralelo, mostrem confiar mais neles.
  3. Que encorajem a iniciativa pessoal e a individualidade, mas promovendo também uma visão compartilhada sobre os negócios.
  4. Que estimulem a diversidade de pensamento entre os subordinados, mas sempre reforçando a coesão do time.
  5. Que apoiem o aprendizado dos funcionários com o que já passou, mas garantindo que abram espaço para o conhecimento novo.
  6. Que permitam que os subordinados promovam inovações incrementais, condicionando-os a, simultaneamente, procurar novos desafios.

O “pai” da administração moderna, Peter Drucker, dizia que “qualidade é o que o cliente quer pelo preço que ele pode pagar”. Visionário como era, conseguiu combinar em uma só frase a cultura da inovação e a da performance.

Na prática, contudo, boa parte das empresas ainda não compreendeu a necessidade de compatibilização de culturas, principalmente, talvez, por não reconhecer os paradoxos existentes. 

Empresas como a GE e cada vez mais estudiosos de negócios estão convencidos: a sobrevivência e o sucesso estão na gestão da criatividade e, mais profundamente, na gestão do conflito, para que os paradoxos entre as culturas da inovação e da performance possam coexistir. Agora, diga: o que seus colaboradores fazem quando você não está olhando?

 Paradoxos do empreendedorismo facilitam a aceitação

 Aceitar a existência dos paradoxos, enxergando vantagens neles, é um ponto de partida para as organizações decidirem dedicar-se a conciliar as culturas da inovação e da performance. 

Compreender os oito paradoxos do empreendedorismo apontados por Peter Lewin, pesquisador e professor da University of Texas, EUA, podem ajudar bastante nessa mudança de mentalidade:

  1. Paradoxo da incerteza. As oportunidades de negócios são complicadas pela incerteza, mas elas não existiriam se a incerteza não existisse.
  2. Paradoxo da oportunidade. As oportunidades que são boas para todos não são boas para ninguém.
  3. Paradoxo da existência. Oportunidades são, ao mesmo tempo, subjetivas e objetivas, apresentando-se como perguntas e como problemas. Elas são criadas tanto em teorias como na prática.
  4. Paradoxo da dualidade. Empreender é algo que sempre equilibra e desequilibra o negócio, porque sempre há sucesso e fracasso acontecendo.
  5. Paradoxo da incompletude.Empreendedores agem sobre planos que nunca têm sucesso completo.
  6. Paradoxo da imprevisibilidade. A ação empreendedora pode ser entendida, mas nunca completamente prevista.
  7. Paradoxo do aprendizado. O empreendedorismo pode ser aprendido, mas não ensinado.
  8. Paradoxo da unicidade. Cada empreendedor é um ser único; é impossível descrevê-lo como parte de uma categoria, assim como não se consegue repetir suas ações específicas.

 

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