Resiliência
A Revolução Industrial foi “tanto para inovações de processo, que reduziram o desperdício e aumentaram a produtividade, quanto para a aplicação de novas tecnologias”, isso foi escrito por Roger Martin em um artigo da Harvard Business Review, intitulado: – O Alto preço da eficiência. Martin é professor e ex-reitor da Rotman School of Management da Universidade de Toronto, além de também atuar como escritor.A crença de que a eficiência é fundamental para a vantagem competitiva transformou o gerenciamento em uma ciência – ensinada em todas as escolas de administração do planeta – cujo objetivo é a eliminação de desperdícios – seja de tempo, de materiais ou de capital.
O professor Martin faz a seguinte pergunta em seu artigo:
“Por que não exigir que os gestores se esforcem para o uso cada vez mais eficiente dos recursos?”. Porque o foco excessivo na eficiência pode produzir efeitos surpreendentemente negativos. Para contrabalançar esses possíveis efeitos negativos, as empresas devem prestar atenção a uma fonte menos apreciada de vantagem competitiva: a resiliência, – “que é a capacidade de se recuperar de dificuldades – de lidar com problemas, adaptar-se a mudanças, superar obstáculos ou resistir à pressão de situações adversas”.O artigo ainda nos convida a refletir sobre resiliência, como sendo uma forma de “Pensar na diferença entre estar adaptado a um ambiente existente (que é, o que a eficiência permite) e ser adaptável às mudanças no ambiente. Sistemas resilientes são tipicamente caracterizados pelos próprios recursos – diversidade e redundância – que a eficiência procura destruir.” [Muito interessante o ponto abordado pelo professor Martin].
Mas o que há de errado então, com um foco incansável na eficiência?
Um foco incansável na eficiência pode levar a sérios problemas. O artigo do professor Roger Martin discute três pontos em particular:
A consolidação da indústria está aumentando.
A tendência para consolidação de empresas e tamanho crescente é evidenciada por algumas estatísticas globais:
A tendência é particularmente proeminente nos Estados Unidos, onde:
Os cinco maiores bancos americanos, agora representam 45% de todos os ativos bancários, contra 25% em 2000. (Esses números são realmente incríveis e ameaçadores).
As tecnologias digitais – em particular a Internet – desempenharam um papel central no surgimento de empresas globais [chamadas de empresas “pop stars”]. Nas últimas décadas, a Internet se tornou a plataforma mais inovadora que o mundo já viu. Ele transformou muitas de nossas atividades diárias, incluindo a maneira como trabalhamos, compramos, aprendemos, negociamos, ouvimos música, assistimos a filmes e lidamos com o governo. Ao mesmo tempo, o alcance universal da Internet tornou o “efeito rede” cada vez mais poderoso e criou um tipo de plataforma dinâmica de negócios.
A escala [ou a oferta em larga escala] aumenta a vantagem competitiva de uma plataforma. Quanto mais produtos ou serviços uma plataforma oferece, mais consumidores ela atrai, ajudando-a a atrair mais ofertas, o que, por sua vez, atrai mais consumidores, tornando a plataforma ainda mais poderosa e valiosa. Além disso, quanto maior a rede, mais dados estão disponíveis para personalizar ofertas, de acordo com as preferências do usuário e atender melhor à oferta e à demanda, aumentando ainda mais o alcance global da plataforma e a eficiência geral.
Como resultado, um pequeno número de empresas tornaram-se imperadoras no mundo digital, dominando a concorrência em seus mercados particulares.
“O ambiente de negócios resultante é extremamente arriscado, com altos retornos para um número cada vez mais limitado de empresas e pessoas – um resultado claramente não sustentável.” Complementa o professor Martin.
Risco de falhas catastróficas
Mas, se os consumidores se beneficiam com os preços baixos, maior escolha e conveniência oferecidas por empresas supereficientes baseadas na Internet, por que alguém deveria se opor?
O problema, argumenta o professor Martin, é que concentrações muito altas aumentam o risco de falhas catastróficas, como ele ilustra com um exemplo da agricultura de monoculturas.
Recomendados pelo LinkedIn
Na agricultura, uma monocultura se refere à prática de cultivar um único produto, de uma safra de alto rendimento ou criar alguma raça de animal, de forma extensiva e de rápido crescimento em um sistema agrícola.
As monoculturas são amplamente utilizadas na agricultura industrial para aumentar a escala e a eficiência de suas operações. No entanto, a monocultura contínua pode levar ao acúmulo de pragas e doenças. Se uma doença vira uma praga, contra a qual não se tem resistência, ela pode acabar rapidamente com uma população inteira de plantações ou criações.
Algo semelhante poderia acontecer a uma empresa ou economia muito dependente de alguns processos e modelos de negócios altamente eficientes.
Poder e interesse próprio
“Dado que as pessoas substancialmente atuam por interesse próprio, quanto mais eficiente um sistema se torna, maior a probabilidade de que […] o objetivo da eficiência cesse de ser e ter a maximização a longo prazo, do valor social geral. Em vez disso, a eficiência começa a ser interpretada como a que oferece o maior valor imediato ao poder digital dominante.”Nas últimas décadas, maximizar o valor para os acionistas tem sido o objetivo principal de muitas empresas. Mas, como vários especialistas apontam, incluindo o professor Mártin, maximizar o valor para os acionistas pode incentivar os executivos da empresa a tomar ações que aumentem o preço de suas ações a curto prazo, satisfazendo os investidores e aumentando sua própria remuneração baseadas em salários e prêmios por alcance de metas. Isso pode levar a folhas de pagamento reduzidas, cortes em Pesquisas & Desenvolvimento e despesas de capital mais baixas; todas estas decisões, tomadas em nome da redução de desperdícios e para aumentar receitas e lucros. Mas os ganhos têm um custo, para funcionários, suas comunidades, investidores e para o futuro da empresa.
Em um mercado dinâmico e em bom funcionamento, essa medida abriria as portas para o aumento da concorrência entre as empresas existentes e de novos entrantes nesse mercado. Mas isso não funciona se o poder estiver concentrado entre um punhado de dominadores, cujas posições dominantes dificultam a entrada dos concorrentes.
“E, às vezes, o poder se torna tão concentrado que é necessária ação política para afrouxar o domínio dos atores dominantes, como no movimento antitruste da década de Mil oitocentos e noventa″.[O Antitruste foi um conjunto de normas do governo federal e estadual dos Estados Unidos que buscava regular a conduta e a organização de empresas corporativas, para promover uma concorrência leal em benefício dos consumidores, que também ficou conhecida como direito da livre concorrência em outros países.]
O valor da resiliência
Em uma economia imprevisível e em rápida mudança, as empresas enfrentam um número crescente de possíveis interrupções em suas estratégias, incluindo avanços tecnológicos, concorrência global e mercados turbulentos. Conforme observado em um artigo da Harvard Business Review de 2016, The Biology of Corporate Survival, [ou: A biologia da sobrevivência corporativa] as empresas estão desaparecendo mais rapidamente do que nunca.
“Empresas têm uma chance em três de terem suas atividades encerradas nos próximos cinco anos, seja por falência, liquidação, fusões e aquisições ou outras causas. Isso é seis vezes a taxa de encerramento de empresas de 40 anos atrás” … Nem a escala nem a experiência protegem contra uma morte prematura.Os sistemas biológicos têm sido uma inspiração no estudo de sistemas complexos. A alta resiliência diante de um ambiente incerto e em mudança é a essência da biologia evolutiva e da seleção natural. Da mesma forma, a resiliência dos negócios é fundamental para uma empresa suportar grandes interrupções e sobreviver a um futuro imprevisível e turbulento.
Para ajudar a alcançar um melhor equilíbrio entre eficiência e resiliência, Martin oferece várias recomendações:
Limite de escala. “Na política antitruste, a tendência desde o início dos anos 80 tem sido afrouxar a fiscalização para não impedir a eficiência … Precisamos reverter essa tendência. A dominação do mercado não é um resultado aceitável, mesmo que seja alcançada por meios legítimos, como o crescimento orgânico … As políticas antitruste precisam ser mais rigorosas para garantir uma concorrência dinâmica, mesmo que isso signifique menor eficiência líquida.”
Introduzir atrito. “Em nossa busca para tornar nossos sistemas mais eficientes, eliminamos todos os atritos. É como se tentássemos criar uma sala perfeitamente limpa, erradicando todos os micróbios nela. As coisas vão bem até que um novo micróbio entre – causando graves problemas às pessoas, agora indefesas … Em vez de projetar soluções para manter todo o atrito fora do sistema, devemos injetar atrito produtivo nos momentos certos e nos lugares certos para aumentar a resiliência do sistema.”
Promover o capital paciente. “O capital de longo prazo é muito mais útil para uma empresa que tenta criar e implantar uma estratégia de longo prazo do que o capital de curto prazo… devemos basear os direitos de voto no período em que o capital é detido. Segundo essa abordagem, cada ação ordinária daria ao seu titular, um voto por dia de propriedade até 3.650 dias, ou 10 anos. Se você tivesse 100 ações por 10 anos, poderia votar em 365.000 ações. Se você vendesse essas ações, o comprador receberia 100 votos no dia da compra.”
Criar bons empregos. “Em nossa busca pela eficiência, passamos a acreditar que o trabalho de rotina é uma despesa a ser minimizada. As empresas investem pouco em treinamento e desenvolvimento de habilidades … e se projetássemos [empregos] para ser produtivos e valiosos? … Um elemento-chave, porém contra intuitivo da estratégia, é criar uma folga para que os funcionários tenham tempo para servir os clientes de maneiras imprevisíveis e valiosas.”
Ensinar a resiliência. “A educação gerencial se concentra na busca decidida pela eficiência – e treina os alunos em técnicas analíticas que implantam proxies de curto prazo para medir essa qualidade. Como resultado, os graduados se dirigem ao mundo para construir (inadvertidamente - acredita-se) negócios altamente eficientes que carecem de resiliência… Para o futuro do capitalismo democrático, a educação em administração deve se tornar uma voz a favor, e não contra, a resiliência.”
Finalizando, podemos então, argumentar que, a resiliência proporciona condições para ganho de produtividade e eficácia das ações. E a falta dessa característica conduz a uma insistência em estratégias pouco efetivas. A resiliência caminha conjuntamente com a capacidade de percepção da realidade e de reação aos problemas e dificuldades. Mas, para isso, é essencial contar com uma boa estruturação de avaliação e mensuração dos cenários, proporcionada pela tecnologia, com recursos como a Big Data e a Inteligência Artificial para a extração de insights. Com isso, a organização ganha em proatividade e cria uma estrutura mais sólida para a reação às mais complexas realidades e manifestações.