Responsabilidade social: o impacto das empresas na sociedade

Há uma século se discute a questão da responsabilidade social das empresas. Com efeito, sempre se encontram um ou dois capítulos sobre responsabilidade social - ou tratando de algo do gênero - em praticamente qualquer texto sobre administração geral.

Porém, desde o começo da década de sessenta, o significado destas palavras - responsabilidade social das empresas - mudou radicalmente.

As discussões anteriores sobre sua responsabilidade social das empresas giravam em torno de três áreas. Uma era a questão perene da relação entre a ética privada e ética pública. Até que ponto o gestor é responsável pela adesão da organização à ética do indivíduo e até que ponto a responsabilidade de cada um perante a organização o induz - e talvez o obrigue - a recorrer a comportamentos privados antiéticos para o bem da organização? A epígrafe desta discussão, de maneira consciente ou inconsciente, é um velho epigrama dos políticos: "Que canalhas seríamos se fizéssemos na vida privada o que fazemos para nosso país, na condição de pessoas públicas.".

O segundo tópico importante era a responsabilidade social dos empregadores perante os empregados, em virtude de seu poder e riqueza.

Finalmente, responsabilidade social era o termo usado para designar a responsabilidade das pessoas de negócios em relação à cultura da comunidade, sob a forma de apoio às artes, aos museus, à ópera e à orquestra sinfônica, atuando como curador em conselhos de instituições educacionais e religiosas e também contribuindo com dinheiro para causas filantrópicas e comunitárias. E nos Estados Unidos, em especial, a disposição para servir em instituições governamentais ou quase governamentais se tornou, neste século, importante responsabilidade social dos executivos.

Em geral, a abordagem tradicional não estava preocupada, ao contrário do que alegava, com a responsabilidade social das empresas, mas sim, com a responsabilidade social dos empresários e a maior ênfase se atribuía à maneira como contribuíam ou com o quanto contribuíam, fora do horário de trabalho e fora das empresas.

Depois da Segunda Guerra Mundial, passou-se a dedicar ênfase crescente às contribuições das empresas das empresas em si. Mas isso foi consequência da legislação tributária, que, de um lado, desacelerou o acúmulo de grandes riquezas pelos indivíduos e, de outro, incentivou e tornou altamente atraentes as contribuições filantrópicas das empresas. Sob outros aspectos, a ênfase não mudou. Enquanto a geração anterior recorria ao empresário rico para financiar um hospital, a grande empresa do Pós-Segunda Guerra Mundial devia apoiar as causas dignas. A ênfase ainda convergia para as causas externas, em vez de para os próprios comportamentos e iniciativas das empresas em si.

No entanto, hoje, quando se debate a responsabilidade social das empresas, a ênfase é muito diferente, concentrando-se no que a empresa deve ou pode fazer, para enfrentar e resolver os problemas da sociedade. O foco se desloca para o potencial de contribuição das empresas, com o objetivo de minorar ou solucionar problemas sociais, como discriminação e integração racial nos Estados Unidos ou a preservação e restauração do meio ambiente. Um dos melhores exemplos da nova atitude vem da Suécia.

Numerosas grandes empresas suecas, especialmente a ASEA, um dos maiores fabricantes de equipamentos elétricos do muno, sofreram violentos ataques pela imprensa local por participarem de um grande projeto de energia elétrica na África. O projeto foi patrocinado pelas Nações Unidas e financiado pelo Banco Mundial. Também havia sido endossado pelo governo socialista da Suécia. O objetivo era melhorar o padrão de vida de uma região desesperadamente pobre da África Negra. Mas o projeto estava localizado numa colônia portuguesa. Em consequência, argumentava-se com veemência, as empresas suecas que participavam do empreendimento apoiavam o colonialismo, ao ajudar a melhorar o padrão de vida da população nativa. Era dever das empresas, prosseguia o argumento, trabalhar pela queda do colonialismo, o que seria conseguido com mais facilidade mantendo os nativos desesperadamente pobres, em vez de ajudá-los a prosperar, sob um explorador imperialista.

A afirmação mais radical da responsabilidade social das empresas talvez tenha sido a do prefeito da cidade de Nova Iorque, John Lindsay, na década de sessenta.

O prefeito exortou as maiores empresas da cidade de Nova Iorque a adorar um gueto negro, garantindo aos habitantes da área condições mínimas para satisfazer as necessidades básicas, receber educação e conseguir emprego. Por fim, acrescentou esperar que estas grandes empresas garantiriam que cada família negra tivesse um homem em casa para atuar como marido para a mulher e pai para os filhos.

Apenas dez anos antes, não se imaginava que alguém, nem mesmo o mais extremo esquerdista ou progressista, censurasse as empresas pela relutância em opor-se à política externa de seu próprio governo ( e, ainda por cima, um socialista ) ou pela recusa em controlar paternalisticamente a vida sexual de cidadãos que não são nem mesmo seus empregados.

Este novo conceito de responsabilidade social não mais pergunta quais são as limitações das empresas ou o que as empresas devem fazer por aqueles sob sua autoridade imediata. Ele exige que as empresas assumam responsabilidade por problemas sociais, por questões sociais e por objetivos sociais e políticos. Além disso, também pretende que as empresas atuem como consciência da sociedade e como solucionadora dos problemas sociais.

Porém, cada vez mais, esta responsabilidade social também está sendo exigida de instituições não empresariais da sociedade. Universidades, hospitais e órgãos públicos, entidades acadêmicas ou profissionais, de médicos, historiadores ou linguistas, todos se defrontam cada vez mais com demandas semelhantes e enfrentam ataques por não assumir responsabilidade pelas mazelas e problemas sociais.

No começo da década de sessenta, os tumultos estudantis contra a universidade eram deflagrados por reivindicações dos alunos. Porém, as rebeliões de mil novecentos e sessenta e oito, que quase destruíram a Universidade de Colúmbia, foram provocadas pelas reclamações de que a universidade não assumira responsabilidade social integral pela comunidade negra do Harlem, nas imediações, e não subordinara os próprios objetivos educacionais às alegadas necessidades do núcleo duro dos desempregados e não empregáveis dos Harlem.

A explicação mais popular e mais óbvia é a errada. Não é a hostilidade às empresas que explica a onda de demandas por responsabilidade social. Ao contrário, é o sucesso das empresas que desperta novas expectativas, por vezes exageradas. As reivindicações por responsabilidade social são, em grande medida, o preço do sucesso.

Hoje, os países desenvolvidos assumem o desenvolvimento econômico como algo garantido. Este pressuposto, por seu turno, levou á crença de que a capacidade de apresentar bom desempenho econômico é, ou deve ser, quase universal. Passamos a acreditar que os mesmos esforços capazes de erguer da miséria para a afluência um terço da humanidade serão capazes de, em muito menos tempo, oferecer riqueza aos dois terços remanescentes, ou, pelo menos, proporcionar-lhes rápido desenvolvimento econômico.

Há menos de duas gerações, na época da Primeira Guerra Mundial, ainda se supunha que a pobreza era condição universal. Naqueles tempos, ninguém assumia que o desenvolvimento econômico fosse a regra, mas sim exceção. O que era considerado surpresa em mil e novecentos, ou mesmo em mil novecentos e cinquenta, não era que a Índia continuasse pobre. Com efeito, qualquer pessoa que então falasse sobre desenvolvimento econômico da Índia teria sido considerado insana. O que era excepcional, e verdadeiramente surpreendente, era que o Japão tivesse conseguido emergir da pobreza quase universal da humanidade e avançar na estrada para o desenvolvimento. Hoje, a falta de desenvolvimento é considerada exceção e problema. E, por mais acelerado que seja o desenvolvimento - como, por exemplo, o do Brasil desde a Segunda Guerra Mundial - , por sua velocidade é considerada inadequada se o país não evoluir, em uma geração, da miséria extrema para afluência confortável.

Ninguém, não mais que duas gerações atrás, esperava que a pobreza desaparecesse, mesmo nos países desenvolvidos e ricos da época. Poucas pessoas acreditariam hoje nas descrições e ilustrações do primeiro estudo sistemático dos pobres no que era, na época, a cidade mais rica do mundo, que Charles Booth publicou pouco antes da virada do século dezenove para o século vinte. Apenas as histórias de horror oriundas de Calcutá hoje se igualam àquelas narrativas. No entanto, para os contemporâneos, os pobres de Londres, na década de mil oitocentos e noventa, pareciam tão ricos em comparação com as condições descritas e ilustradas vinte anos antes que o parceiro de Marx, Friedrich Engels, ao republicar em mil oitocentos de noventa e seis sua obra anterior, The Conditions of the Working Classes in England, foi obrigado a admitir que as profecias procedentes dele e de Marx sobre a pobreza crescente do proletariado já não eram sustentáveis.

Em especial, a pobreza que, para a maioria hoje, é mais ofensiva, ou seja, a pobreza em meio à afluência, era, então, considerada inevitável. Ninguém, no século dezenove ou no começo do seculo vinte, esperava que os imigrantes oriundos de países pré-industriais que se radicavam nas cidades industriais fossem outra coisa senão, pobres, despossuídos, incompetentes e miseráveis. Ninguém contava com a rápida transformação das favelas da Lancashire industrial nem com a industrialização de Viena, Áustria, por volta de mil e novecentos. Tudo o que se esperava era um pouco da humanidade para atenuar o pior do sofrimento, e um mínimo de caridade. Na melhor das hipóteses, havia tentativas de ajudar algumas raras fundações filantrópicas e a ambição pessoal dos malfadados para se desvencilhar da indigência abjeta. Para os marxistas ortodoxos, até isso era romantismo sentimental. Seguindo o mestre, eles consideravam estas pessoas Lumpemproletariat ( lumpem-proletariado ) e incapazes de melhorar como indivíduos ou como grupo.

Em que pese, marxistas de hoje considerarem que o liberalismo não trouxe prosperidade para o trabalhador, apenas tenha varrido a miséria para os trabalhadores dos países periféricos, colônias e ex-colônias dos países desenvolvidos. E aquelas hoje não têm sub-colônias para empurrar seus miseráveis como fizeram os países centrais.

Nada na história social e econômica se iguala ao recente desenvolvimento econômico e social do negro americano. Em vinte anos, de mil novecentos e cinquenta a mil novecentos e setenta, dois terços dos imigrantes pré-industriais menos preparados e mais desfavorecidos da civilização moderna se guindaram da pobreza extrema para o status de classe média. Eles desenvolveram competências e conquistaram empregos. Maior proporção de seus filhos adquiriu educação superior que os de grupos de imigrantes anteriores, como italianos e poloneses, que não enfrentaram a barreira racial.

Em tese, o negro americano é um problema muito especial. Mas, ainda assim, a diferença entre o que era considerado sucesso apenas há meio século e o que hoje é considerado fracasso ilustra a extensão em que o êxito mudou as expectativas. Mesmo os representantes de uma classe média mais ou menos próspera de ontem desfrutavam de apenas parte da qualidade de vida que hoje se tornou rotina.

Os prédios de apartamento de fins do século dezenove ainda estão em uso na maioria das cidades europeias. Não são, de modo algum, boas moradias - abafadas e escuras, com pequenos torpes, cinco andares sem elevador, aquecimento, fogareiro a lenha ou carvão apenas na sala, e com apenas um banheiro minúsculo e encardido para uma família de sete pessoas. No entanto, eles eram construídos para as novas classes médias. A assistência médica era praticamente inexistente; a educação, além do nível fundamental, era privilégio de poucos; jornais, um luxo. E, por piores que sejam os danos ambientais provocados pelo automóvel nas grandes cidades de hoje, o cavalo era um flagelo, mais sujo e fedorento, que matava e aleijava mais pessoas e que congestionava as ruas tanto ou mais que hoje.

E a vida nas fazendas, ou seja, a vida para a maioria, era, no mínimo, mais pobre, mais sórdida, mais perigosa e mais brutal.

Ainda em mil e novecentos ou mil novecentos e quatorze, a qualidade de vida era preocupação apenas dos poucos ricos. Para os muitos outros, o que restava era o escapismo inebriante, proporcionado pelos romances açucarados, vendidos aos milhões. A realidade, contudo, era a luta diária estupefaciente por um pouco de comida, o emprego enfadonho e dinheiro suficiente apenas para comprar a futura sepultura.

Portanto, o simples fato de haver preocupação com a qualidade de vida já pode ser considerada um grande sucesso. E nada mais é certo e natural que os mesmos grupos de liderança responsáveis por garantir os aspectos quantitativos também se incumbam de assegurar os fatores qualitativos de vida.

O mesmo raciocínio explica as reivindicações para que as universidades também assumam responsabilidade social. Também as universidades são uma história de sucesso no século vinte.

Se a ciência é capaz de ensinar a pôr um astronauta na Lua, repetiam insistentemente os ativistas estudantis da década de sessenta, sem dúvida também será capaz de ensinar a promover um meio ambientalmente saudável, a salvar as cidades das drogas, a garantir casamentos felizes e a oferecer escolas aos filhos. Se assim não for, a única explicação será prioridades inadequadas ou conspiração maldosa.

Decerto, estes argumentos são ingênuos. Mas não são irracionais. O clamor por responsabilidade social espera demais. Mas espera as coisas certas. Sua raiz não é a hostilidade à autoridade, mas o excesso de confiança nos gestores e na administração.

Além de tudo isso, desponta o desencantamento com o governo, a descrença cada vez maior na capacidade do governo de resolver os grandes problemas sociais.

Há apenas uma geração, as pessoas que hoje reivindicam responsabilidade social pelas empresas ( ou pelas universidades ) esperavam que o governo fosse capaz de cuidar de todos os problemas da sociedade, se não também de todos os problemas dos indivíduos. Ainda há, em todos os países, pressões por cada vez mais programas governamentais - embora também se desenvolva resistência crescente ao aumento dos gastos públicos e da carga tributária. Mas até os defensores mais fervorosos de governos ativistas, na verdade, já não esperam resultados, mesmo nos países em que o respeito pelo Estado e a crença no governo ainda são altos, como no Japão, na Suécia e na Alemanha. Até os preconizadores mais eloquentes de governos fortes não mais aceitam que o problema seja resolvido no momento em que é transferido para o governo.

Em consequência, as pessoas mais preocupadas com estas questões, os liberais e os progressistas que, há uma geração, se arregimentavam sob a bandeira de mais governo, agora, cada vez mais, recorrem a outros grupos de liderança, a outras instituições e, acima de tudo, às empresas, para que assumam os problemas que o governo deveria ser capaz de resolver, mas não resolve.

Robert Kennedy, não Associação Nacional de Fabricantes, propôs que a recuperação das favelas nas grande cidades americanas fosse assumida pelas empresas. E um dos defensores mais obstinados e mais respeitados do ativismo governamental, além de um dos principais teóricos sindicais dos Estados Unidos, o falecido Frank Tannembaum, da Universidade de Colúmbia, quase no fim da vida, no primavera de mil novecentos e sessenta e oito, proclamou que a empresa multinacional era a última melhor esperança e o único fundamento de um mundo pacífico.

No cômputo geral, trata-se do avanço da administração para a posição de liderança na sociedade, como fenômeno subjacente às demandas por responsabilidade social.

No século vinte, os gestores das grandes instituições se tornaram líderes em todos os países desenvolvidos, bem como na maioria dos países em desenvolvimento. Os velhos grupos de liderança, seja a aristocracia ou o clero, desapareceram totalmente ou se tornaram insignificante. mesmo os cientistas, os sacerdotes do período do pós-Segunda Guerra Mundial, perderam grande parte de seu prestígio. os únicos novos grupos de liderança a emergir são os administradores, os gestores de empresas ou de universidades, de órgãos públicos e de hospitais. Eles comandam os recursos da sociedade. Mas também dominam a competência. Portanto, nada mais lógico que deles se espere que assumam funções de liderança e que se responsabilizem pelos grandes problemas sociais e grandes questões sociais.

Em consequência destas mudanças - a emergência dos gestores como principal grupo de lideranças; o desencantamento crescente com o governo e o deslocamento do foco dos aspectos quantitativos da vida para a qualidade de vida - , desenvolveu-se demanda crescente para que os administradores, mormente, os gestores de empresas, transformem a preocupação com a sociedade em elemento central a própria conduta das empresas. A abordagem tradicional pergunta: "Como organizar a fabricação de carros ( ou de sapatos ) para que ela não se imponha aos valores e crenças sociais, aos indivíduos e à sua liberdade, e à boa sociedade, em geral?" A nova reivindicação é no sentido de que as empresas criem os valores e crenças sociais, promovam a liberdade para os indivíduos e produzam a boa sociedade.

Esta demanda exige nova mentalidade e novo ativismo por parte dos gestores. Não mais pode ser tratada da maneira tradicional. Já não pode ser encarada como relações públicas.

Compete às relações públicas indagar se a empresa ou a indústria é amada ou compreendida. Sua preocupação consiste em que os defensores do Black Power culpem a motivação pelo lucro pelos problemas dos guetos e que, supostamente, gostem das empresas tão pouco quanto gostam de qualquer outro componente do establishment branco. Mas o efetivamente relevante é que os líderes do Black Power esperam que as empresas façam milagres em relação ao emprego nos guetos, à educação nos guetos, à habitação nos guetos; e contam com estes milagres praticamente da noite para o dia. As questões importantes são: "Será que as empresas são capazes de enfrentar estes enormes problemas? Como? Será que as empregas devem enfrentá-los?" Estas não são questões pertinentes a relações públicas.

Os livros e as revistas de hoje estão cheios de histórias de terror sobre a irresponsabilidade, ganância e incompetência das empresas. Sem dúvida, alguns gestores e algumas empresas são irresponsáveis, gananciosos e incompetentes. Afinal, os gestores são membros da espécie humana. Porém, o verdadeiro problema da irresponsabilidade social não irresponsabilidade, ganância ou incompetência. Se fosse, seria fácil. Bastaria estabelecer normas de conduta e impô-las às empresas. Infelizmente, os problemas básicos da responsabilidade social são outros. São problemas de boas intenções, de conduta honrosa e de alta responsabilidade - que deram errado.

A afirmação pode ser ilustrada por três fábulas acautelatórias.

1) West Virgínia, que nunca foi uma das áreas mais prósperas dos Estados Unidos, entrou em rápido declínio econômico em fins da década de vinte, quanto a indústria do carvão, havia muito a principal fonte de renda do Estado, começou a encolher. A decadência da indústria do carvão foi acelerada pela preocupação crescente com os acidentes nas minas e com as doenças dos mineiros. Muitas das minas de carvão da West Virgínia eram pequenas e marginais, e não tinham como custear as novas medidas preventivas em termos de segurança e medicina do trabalho.

Em fins da década de quarenta, a principal empresa industrial do Estado se assustou com a retração econômica da região. A Union Carbide, uma da principais empresas químicas dos Estados Unidos, tinha sede em Nova Iorque. Mas as principais fábricas da empresa se situavam em West Virgínia e a empresa ainda era o maior empregador do Estado, além de outras poucas grandes minas de carvão. Nestas condições, a alta administração da empresa pediu a alguns jovens engenheiros e economistas, de seu quadro de empregados, que preparassem um plano para a criação de oportunidades de emprego em West Virgínia, o desespero era total, sem perspectivas de novas indústrias. A única fábrica que talvez pudesse ser instalada na área de Vienna era uma unidade de ferroligas, que usaria um processo já obsoleto, com fortes desvantagens de custos em relação a outros mais modernos, como os que os concorrentes da Union Carbide já estavam usando.

Mesmo assim, Vienna ainda era basicamente uma localização antieconômica, pois o processo de produção exigia grandes quantidades de carvão de boa qualidade. Mas o único carvão disponível na área continha teores de ácido sulfúrico tão elevados a ponto de não se prestar ao uso, sem tratamento e lixiviação. mesmo nestas condições - ou seja, depois de grandes investimentos - , o processo de produção era inevitavelmente ruidoso e sujo, liberando grandes quantidades de fuligem e de gases nocivos.

Além disso, a infraestrutura de transporte, tanto ferroviária quanto rodoviária, não passava por West Virgínia, mas na outra margem do rio, no lado de Ohio. No entanto, a localização da fábrica na outra margem significava que os ventos predominantes empurrariam a fuligem e o enxofre das chaminés da fábrica diretamente para a cidade de Vienna, no outro lado do rio.

Todavia, naquela localização, a fábrica oferecia mil e quinhentos empregos para a cidade de Vienna em si e outros quinhentos a mil empregos a mina de carvão não muito distante. Além disto, o novo campo de carvão poderia ser explorado a céu aberto, de modo que os novos mineiros não estariam sujeitos aos acidentes e aos riscos de saúde que se tornavam cada vez mais graves nas velhas minas da área, já exauridas. A alta administração da empresa chegou à conclusão de que a responsabilidade social exigia a construção da nova fábrica, não obstante as deseconomias marginais.

A fábrica foi construída com os mais modernos equipamentos antipoluição da época. Enquanto mesmo as termelétricas das grandes cidades se satisfaziam em reter metade dos resíduos sólidos lançados pelas chaminés, a fábrica de Vienna instalou equipamentos para captar setenta e cinco por cento - embora pouco se pudesse fazer em relação aos efluentes de dióxido de enxofre desprendido pelo carvão com altos teores de enxofre.

Quando a fábrica foi inaugurada em mil novecentos e cinquenta e um, a Uniou Carbide era uma heroína. Políticos, figuras públicas e educadores, todos enalteceram a empresa por sua responsabilidade social. Porém, dez anos depois, a antiga redentora rapidamente se transformava em inimiga pública. À medida que o país se conscientizava da poluição, os cidadãos de Vienna passaram a queixar-se cada vez mais, com veemência crescente, das cinzas, da fuligem e da fumaça que transponham o rio e invadiam a cidade e as casas. Por volta de mil novecentos e sessenta e um, um novo prefeito foi eleito com base na plataforma de combate à poluição, o que significava combate à Union Carbide. Dez anos depois, a fábrica se transformara em escândalo nacional. Até a Business Week - longe de ser um periódico hostil aos negócios - linchou a Uniou Carbide ( em fevereiro de mil novecentos e setenta e um ), em artigo intitulado "A Corporate Polluter Learns the Hard Way" ( empresa poluidora aprende da maneira mais difícil ).

Pouco se questiona que a administração da Union Carbide não se tenha comportado de maneira muito inteligente. Eles deveriam ter percebido, no começo da década de sessenta, que estavam com problemas, em vez de retardar e procrastinar, fazer e desfazer promessas - até que os cidadãos, o governo estadual, a imprensa, os ambientalistas e o governo federal passassem a apontar seus canhões para a empresa. Não foi muito inteligente protestar durante anos que não havia nada de errado com a fábrica e com eles, para, em seguida, quando as autoridades governamentais começaram a endurecer, anunciar que a fábrica seria fechada, pois era impossível cumprir os padrões ambientais.

No entanto, esta não era a lição básica desta fábula acautelatória. Uma vez tomada a decisão de adotar processo obsoleto e de construir uma fábrica economicamente marginal para aliviar o desemprego numa área muito deprimida, o resto se seguiu mais ou menos automaticamente. A decisão significava que a fábrica não poderia gerar lucro suficiente para modernizar seus equipamentos. Não há dúvida de que, apenas com base em critérios econômicos, a fábrica nunca teria sido construída. A opinião pública forçou a Uniou Carbide a investir somas substanciais na fábrica para remediar os piores problemas de poluição - embora fosse questionável se havia tecnologia para fazer mais que um trabalho de remendo. A publicidade também forçou a Union Carbide a manter a fábrica aberta. Porém, depois que os holofotes desviarem o foco para outro alvo, a maioria dos empregos na fábrica de Vienna, West Virgínia, de novo tenderá a desparecer, mesmo que a fábrica não seja fechada.

2) A unidade de processamento de carnes da Swift, no distrito do porto de Buenos Aires, foi a maior instalação de produção de gênero na Argentina, durante muitos anos. Também se destacou como grande empreendedor numa área pobre de Buenos Aires. A princípio subsidiária da Swift de Chicago, a empresa tornou-se independente, embora ainda sob a propriedade americana, pouco depois da Segunda Guerra Mundial.

Porém, a indústria de processamento de carnes da Argentina caiu em desgraça depois da Segunda Guerra Mundial - em parte, por causa das medidas do governo que aumentaram o preço do gado argentino, ao mesmo tempo que reduziram a oferta, tornando, assim, a carne argentina cada vez menos competitiva no mercado mundial e privado os processadores de carne de sua fonte de matéria-prima. a lucratividade da Swift diminuía cada vez mais. O proprietários, finalmente, a venderam em mil novecentos e sessenta e oito a uma multinacional com sede no Canadá, a Deltec, empresa atuante em muitas áreas da América Latina, basicamente em negócios de serviços financeiros. A Deltec imediatamente começou a modernizar a fábrica da Swift, para que ela recuperasse a competitividade. Porém, a indústria argentina de processamento de carnes continuava em declínio.

Os dois maiores concorrentes da Swift, ambos estrangeiros, decidiram encerrar suas operações em fins da décadas de sessenta. Indenizaram os trabalhadores, de acordo com a legislação argentina, e saíram do mercado. A Deltec, contudo, cocluiu que não podia agir assim, em consequência de seus muitos outros interesses na América Latina. Ela precisava manter o emprego numa área em que o desemprego era alto demais. Formulou, então, um acordo com os sindicatos trabalhistas, que reduziu substancialmente a oferta de emprego e aumentou em muito a produtividade. A empresa, então, investiu quantias vultosas na fábrica e explorou suas ligações financeiras para conseguir empréstimos de bancos estrangeiros. No entanto, o negócio de carnes na Argentina não melhorava.

Em mil novecentos e setenta e um, a Swift já havia consumido todo o capital disponibilizado pela Deltec, sem ter recuperado a lucratividade e a competitividade. Em seguida, a Swift chegou a um acordo voluntário com os credores, incluindo os trabalhadores da empresa, para pagamento integral de todas as dívidas durante um período prolongado - com a Deltec na condição de credora de última instância para receber os pagamentos. Credores representando oitenta e seis por cento das dívidas, muito mais que o exigido por lei, aceitaram o acordo. No entanto, para surpresa geral, o juiz argentino, cuja aprovação se esperava como mera formalidade, rejeitou o acordo. Ele decidiu que a Deltec o havia obtido de maneira imprópria, declarou falida a Swift da Argentina, ordenou sua liquidação e pediu ao governo argentino que nomeasse um liquidante. Com efeito, ele expropriou a empresa e seus bens. Não só se recusou a reconhecer quais quer direitos da Deltec como credora, mas também sentenciou que todas as outras participações da Deltec em outras empresas argentinas fossem penhoradas como garantia das dívidas da Swift para com os credores argentinos.

Não houve pressão pública para estas decisões - tampouco pressão legal. Os trabalhadores da Swift, embora membros dos sindicatos argentinos mais militantes, apoiaram integralmente a Deltec. No entanto, a decisão recebeu altos níveis de aprovação na Argentina, mesmo entre pessoas que até a mais fértil imaginação jamais consideraria contrárias aos negócios. "As outras empresas processadoras de carnes", muita gente disse, "agiram certo ao fecharem suas fábricas e ao indenizarem os trabalhadores, quando concluíram que não mais seriam capazes de operar economicamente. A Deltec, ao tentar manter sua fábrica, criou expectativas que vieram a decepcionar de maneira mais cruel".

3) Em fins da década de quarenta, uma grande empresa siderúrgica americana nomeou um novo gerente geral para sua grande divisão no sul, localizada em uma das áreas com mais forte "supremacia branca" da região. Tradicionalmente, todas as posições de alta administração naquela divisão eram ocupadas por sulistas. O recém-nomeado, contudo, era nortista. Além disso, era filho de uma das famílias quaker da Filadélfia e participara ativamente de várias organizações de direitos civis.

Ao ser nomeado, a alta administração o chamou e disse: "Sabemos o que estamos fazendo o poer que o estamos nomeando. Sem dúvida, seu desempenho justifica esta promoção. Mas você também é nortista e está comprometido com a igualdade de emprego para os negros. E isso, evidentemente, é o que determinam tanto as leis dos Estados Unidos quanto nossos acordos sindicais. No entanto, como todos sabemos, nossa divisão do sul nunca ofereceu oportunidades de emprego aos negros. Nenhum negro, anida que altamente qualificado e qualquer que seja a função, nunca recebeu mais que salário de ajudante. Nunca conseguimos mudar esta atitude. mas sabemos que não conseguiremos defender e manter estes práticas durante muito tempo. Portanto, esperamos que você, o mais rapidamente possível, garanta os direitos civis para nossos empregados negros, como exibem as leis do país e os acordos sindicais. procure conseguir o apoio e a cooperação das pessoas mais importantes no sindicato que representa nossos trabalhadores. Sabemos que você tem trabalhado com elas em várias organizações de direitos civis."

O novo gerente geral passou cerca de um ano esforçando-se para ser aceito pelos novos colegas, para ser conhecido pela comunidade local e para desenvolver relações amistosas com os líderes sindicais. Até que viu sua oportunidade chegar. Com a inauguração de nova ampliação da fábrica, era preciso formar equipes para a operação de vários fornos. No intuito, o novo gerente geral aplicou rigorosamente as cláusulas de contratação do acordo sindical. Em consequência ainda significativa, com altas qualificações e considerável tempo de serviço, foram promovidos para posições nas novas equipes. Em nenhum caso, um trabalhador branco foi destituído de seus direitos de antiguidade nem subordinado a um supervisor negro.

Na manhã seguinte à divulgação das novas equipes, conforme exigido pelo acordo sindical, uma delegação de líderes sindicais locais procurou o gerente geral. "Você sabe que recebemos várias centenas de reclamações", disseram "que estão pendentes há muito tempo, sem solução. Os trabalhadores estão ficando impacientes. Entraremos em greve no prazo de trinta e seis horas. Mas não queremos ser intolerantes. Se a empresa acenar até com um gesto simbólico de boa vontade, adiaremos a greve. Basta que você retire aquelas tabelas de equipes de trabalho que acabou de divulgar, e nos deixe, junto com os supervisores, montar as novas equipes para os novos fornos. Enquanto isso, aqui está o aviso de greve, nos termos de nosso acordo".

O gerente geral primeiro tentou conversar com o presidente e com o chefe do departamento jurídico do sindicato. Inexplicavelmente, nenhum dos dois foi encontrado, nem as secretarias sabiam onde estavam e quando retornariam. Então, o gerente geral lembrou-se de um velho amigo, um dos sábios dos quakers e um radical em ralações raciais, principalmente em questões de oportunidades de emprego para os negros. Mas, para a imensa surpresa do gerente geral, o sábio não se mostrou nem um pouco solidário com o amigo. "Concordo plenamente com você, como é de seu conhecimento, ao considerar a discriminação de emprego contra os negros ilegal, imoral e pecaminosa", disse o sábio. "Mas o que você fez, embora legal, é igualmente imoral. Você usou a musculatura econômica de uma grande empresa para impor seus costumes e valores estão certos. Mas, ainda assim, você está usando o poder econômico de uma grande empresa, o poder do empregador e a autoridade do seu cargo para impor-se à comunidade. Isso é imperialismo econômico, e não pode ser tolerado, por mais nobre que seja a causa."

O gerente geral renunciou e conseguiu outra emprego no norte. A empresa, discretamente, abandonou as tabelas de equipes. A fábrica continuou aberta. E poucos anos depois, não precisa dizer, a empresa foi alvo de ataque feroz - a que o chefe do departamento jurídico do sindicato aderiu em altos brados - por não assumir a liderança em questões raciais. Como maior empregador na comunidade, acusaram os críticos, a empresa tinha a responsabilidade social de não tolerar práticas que deveria ter reconhecido como não só ilegais, mas também imorais.

Sem dúvida, a demanda por responsabilidade social não é tão simples quanto faz parecer a maioria dos livros, artigos e discursos sobre o tema. Mas não é possível ignorá-la, conforme instaram economistas eméritos, como Milton Friedman, de Chicago. Sem dúvida, a advertência de Friedman de que as empresas são instituições econômicas e, como tais, devem restringir-se à sua missão econômica, foi bem formulada. Há o perigo de que a responsabilidade social solape o desempenho econômico e, com ele, toda a sociedade. Decerto, há o risco ainda maior de que a responsabilidade social enseje a usurpação do poder por gestores de empresas, em áreas que não tem autoridade legítima.

Mas também é evidente que não há como esquivar-se da responsabilidade social. Não se trata apenas de que o público exigi-la. Ainda é fato de que na sociedade moderna os gestores são o único grupo de liderança. Se os gerentes das maiores instituições, especialmente das empresas, não assumirem responsabilidade pelo bem comum, ninguém mais poderá fazê-lo nem o fará. O governo não mais é capaz, como ainda sustentam as teorias políticas, de atuar como soberano e guardião do bem comum numa sociedade pluralista de organizações. Os grupos de liderança nestas sociedades, e isso significa os gestores das principais instituições, queiram ou não - na verdade, sejam competentes ou não - , devem refletir sobre as responsabilidades que podem e devem assumir, em que áreas e com que objetivos.

Se existe alguma moral nestas fábulas acautelatórias, não é que a responsabilidade social seja ambígua e perigosa, mas, sim, que os impactos sociais e as responsabilidades sociais são áreas em que as empresas - e não só as grandes empresas - têm de refletir sobre seu papel, definir objetivos e apresentar bom desempenho. Os impactos sociais e as responsabilidades sociais precisam ser administrados. Outras informações podem ser obtidas no livro Fator humano e desempenho, de autoria de Peter F. Drucker.

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