Seguros - um setor em (r)evolução

Seguros - um setor em (r)evolução

Num mercado em grande disrupção e pleno de desafios, as seguradoras têm de ser capazes de aliar estratégias, com mudanças estruturais e ações táticas.

Os executivos do setor segurador, aliás como os de muitas outras indústrias, procuram encontrar soluções para crescimentos sustentáveis num mercado em turbulência, sujeito a mudanças económicas, financeiras e regulatórias sem precedentes.

Às seguradoras já não lhes basta o crescimento das carteiras, é-lhes essencial controlarem os custos para garantirem margens saudáveis. Interessa-lhes, e aos seus gestores, procurar um equilíbrio estratégico e sustentável do crescimento a longo prazo, com o retorno financeiro para os acionistas. Esta não é, todavia, uma tarefa fácil, com forças poderosas a desestabilizar o setor dos seguros, mais habituado a medir o ritmo de mudança em décadas, e que agora estranha seja definido em anos ou trimestres.

Uma abordagem de negócio na continuidade, facilmente perde aderência à realidade em face da rapidez com que:

•       mudam as necessidades dos clientes,

•       aumentam os requisitos de capital,

•       surgem novos encargos regulatórios,

•       baixam as taxas de juros,

•       aparecem novas soluções tecnológicas e

•       surgem novos concorrentes no setor.

Muitas empresas refugiam-se na receita tradicional desenvolvendo programas de marketing, atualizando produtos, melhorando os sistemas de informação e os processos de serviço ao cliente, ou reforçando as tecnologias de informação, mas sem alcançarem os resultados que ambicionam. Isto porque, as alavancas tradicionalmente utilizadas no desenvolvimento da estratégia empresarial, simplesmente não foram projetadas para os desafios com que as seguradoras se confrontam atualmente. O sucesso das estratégias a aplicar requer algo mais abrangente: requer uma resposta estrutural. Uma empresa não consegue adaptar-se às condições do século XXI sem modernizar as suas estruturas organizativas e processuais, herdadas do século XX.

A solução está em que as empresas percebam que a estratégia tem de estar intrinsecamente ligada à estrutura organizativa da empresa.

A estratégia, definida como a forma que uma empresa escolhe para competir, deve natural e intrinsecamente ser acompanhada pelas dimensões do modelo operacional, incluindo os aspetos jurídicos, posicionamento face aos impostos, disponibilidade de capital, organização, sistemas de informação e governo da companhia.

Logo após estar garantido o alinhamento da estratégia com as estruturas, as empresas necessitam de reconhecer o papel da cultura empresarial na estratégia definida, e usar as suas diferenças culturais para promover mudanças e garantir consolidação.

Resposta às pressões

Esta rápida evolução tem tornado as estruturas organizacionais ineficazes ou obsoletas. Antes de avançarem para novas estratégias, as seguradoras precisam reavaliar todas as dimensões de seu modelo operacional.

As insuficiências estruturais tomam muitas formas. Algumas empresas carecem da escala para suportar crescimento face aos novos requisitos de capital. Outras, como se encontram organizadas em estruturas hierárquicas, carecem da flexibilidade necessária para responder rapidamente às mudanças no mercado. Outras, ainda, em especial as seguradoras tradicionais, tendem a apresentar capacidades tecnológicas com ineficiências, enfrentando rivais mais recentes, mais bem preparados e digitalmente alinhados. Complementarmente, a reforma tributária e a regulamentação podem colocar em causa a rentabilidade de determinadas linhas de negócios.

A capacidade de resposta a estas pressões posiciona as empresas em três grupos:

•       O primeiro grupo de empresas antecipou os efeitos das tendências do mercado e fez ajustes estruturais apropriados, abrindo caminho para o crescimento sustentado. Por exemplo, a seguradora de vida MetLife evitou mandatos regulatórios dispendiosos vendendo a sua atividade de corretagem.

•       O segundo grupo de empresas reconheceu a necessidade de mudanças estruturais, mas ainda têm de realizá-las. Já possui os planeamentos elaborados, ou em fase de discussão, e esperam oportunisticamente pelo negócio certo para avançar.

•       Um terceiro grupo de empresas, no entanto, acantonou-se nas estruturas existentes, fazendo eventualmente pequenos ajustes, na esperança de emergir da tempestade com poucos danos. Para alguns, esta é uma escolha racional devido às limitações que lhes deixam com pouco ou nenhum espaço de manobra. Mas, noutros casos, a ação é limitada pela cultura da empresa que rejeita reflexivamente certas opções.

As empresas nos dois primeiros grupos procuram uma oportunidade de saírem ganhadoras. No entanto, a resposta das empresas do terceiro grupo constitui uma situação de autoilusão numa época em que a estratégia tem obrigatoriamente de estar alinhada com a estrutura.

Tempo para Mudança Efetiva

Sem dúvida, muitas seguradoras trabalham diligente e continuamente na melhoria dos seus negócios, através do fator escala. Recolhem ideias sobre as necessidades e os comportamentos dos consumidores, valorizam capacidades únicas para se diferenciarem dos concorrentes, modernizam os produtos, atualizam estratégias de distribuição e adotam a digitalização em todas as suas formas. Todas estas abordagens são fundamentadas, mas são também insuficientes e nalguns casos inadequadas para abordar o desconhecido que é mundo atual das seguradoras. A crença na persistência de uma certa estabilidade das condições económicas e de mercado, está subjacente a estas medidas, mas essa não é a realidade desde o colapso financeiro mundial que ocorreu há quase uma década.

Desde esse colapso que se encontram minados os pilares de muitos modelos de negócios de seguros. Temos assistido a crescimentos modestos das seguradoras de ramos reais, que crescem globalmente a um ritmo de 3 por cento ao ano, e as seguradoras do ramo vida mal excedem crescimentos anuais de 1 por cento.

Estes crescimentos anímicos pressionaram as receitas e forçaram as seguradoras a competir mais fortemente no fator preço. Com taxas de juro próximas de zero as margens estão comprimidas, especialmente nos seguros de vida. Na frente regulatória, as regras de contabilidade estão mais exigentes e com requisitos de capital mais pesados, penalizando balanços e retorno.

Adjacente a estes desafios estão os efeitos potencialmente desestabilizadores da reforma tributária sobre lucros e sobre o crescimento. A subida de impostos, para algumas seguradoras, pode forçar ao aumento de preços ou a encontrar outras maneiras de proteger o retorno para os acionistas. Em muitos casos, os benefícios decorrentes da queda das taxas, podem ser contrabalançados pela diminuição das deduções para prémios, limites de dedutibilidade das reservas dos ramos vida, reconhecimento de proveitos antecipados e um abrandamento do ritmo de deduções de custos de aquisição.

A dinâmica competitiva está, também, a mudar, com a expansão de negócios especializados como a gestão de ativos, de que são exemplos a Vanguard e a Fidelity, criando dificuldades adicionais às seguradoras tradicionais. Empresas estabelecidas e alguns novos participantes estão a inovar e experimentam alguns modelos de distribuição disruptiva. Outros, incluindo empresas de private equity, olham para a curva dos custos e esperam pela melhor oportunidade para implementarem estratégias de aquisição agressivas e sourcing.

Certamente que, algumas tendências de longo prazo podem beneficiar certas seguradoras, ou pelo menos melhorar o seu perfil de risco. O aumento do tempo de vida útil das pessoas e as incertezas quanto à sustentabilidade da segurança social para efeitos de reforma, podem conduzir ao aparecimento de novas necessidades e outros produtos destinados a estes segmentos.

No entanto, muitas empresas não estão preparadas para capitalizar nessas oportunidades porque se encontram a enfrentar outros desafios. Muitas vezes o problema resume-se à escala. Algumas seguradoras não têm recursos para construir novas plataformas de distribuição e recursos para melhorar o serviço aos clientes em mercados em crescimento. Embora a oferta de um produto individual possa ser relativamente simples de disponibilizar para os novos operadores do mercado, a dificuldade e o custo do desenvolvimento dessas plataformas cria desejos de escala e aumenta a pressão sobre os concorrentes de menor dimensão.

Por vezes, a questão não é escala, mas uma dificuldade em responder atempadamente assim que as condições mudam. Os hábitos de compra estão a mudar e os consumidores, especialmente os mais jovens, embora não exclusivamente, estão mais disponíveis para efetuarem compras on-line. É, no entanto, comummente aceite que as pessoas ainda vão querer alguma assistência pessoal nas transações de maior valor e mais complexas.

É essencial haver investimento e experimentação para se encontrar e refinar o modelo de negócio certo para as novas realidades de mercado. No entanto, algumas empresas não construíram os ativos e as capacidades necessárias, ou ajustadas, aos padrões de distribuição em evolução e comportamentos dos consumidores.

A resposta adequada a cada desafio e oportunidade será diferente para cada empresa, dependendo das suas características e circunstâncias únicas. Em praticamente todos os casos, a solução certa envolverá mudanças estruturais.

Juntando estratégia e estrutura

As empresas reconhecem que as abordagens tradicionais usadas para o planeamento anual, financiamento de projetos e arquitetura tecnológica podem estar a prejudicar a inovação e as respostas atempadas às mudanças das condições do mercado. Por isso, muitas estão a repensar e reformular os seus processos por forma a agilizarem a mudança. As recentes transações no sector mostram a gama de opções possíveis para empresas que desejam avançar com seus objetivos estratégicos num mercado em mudança acelerada.

Sair do negócio. Às vezes, a melhor escolha é sair do caminho do perigo. As empresas podem preservar margens ao sair de mercados com maiores exigências de capital ou novas normas contabilísticas penalizadoras.

Parcerias e aquisições. Quando a escala é um problema, a solução pode estar fora da empresa ou em novas abordagens estruturais. Algumas seguradoras formam parcerias para expandir a distribuição, diversificar portfólios de produtos ou fortalecer capacidades. Outras ajustam a sua escala e estrutura de capital através de fusões, aquisições e alienações.

Expansão para novas linhas e geografias. Novas linhas de produtos oferecem outro caminho para um crescimento mais rápido ou margens de lucro mais substanciais. Várias seguradoras mudaram-se para mercados em expansão com requisitos de capital mais baixos.

Corte de custos. Algumas empresas têm atuado agressivamente no sentido de melhorar a sua estrutura de custos. As seguradoras que buscam maior flexibilidade financeira têm recursos alienados que requerem importantes reservas de capital.

Transformação e cultura

Após lançarem iniciativas estruturais ambiciosas, algumas empresas, erradamente, nem sempre reconhecem o papel relevante da cultura no bom funcionamento das novas estruturas.

A cultura é um padrão de comportamentos, normas e princípios que cresceram em torno das estruturas organizacionais existentes. Ambas (cultura e estrutura) estão firmemente ligadas, e não se pode mudar uma sem afetar a outra. Nenhuma cultura é boa ou má. Mas certas características culturais são mais relevantes para a mudança estrutural do que outras.

Atributos culturais afetam a capacidade de uma empresa de fazer mudanças. Uma empresa que é orientada para o consenso e focada na prevenção de problemas antes de surgirem, pode tornar-se indecisa e lenta a agir. Estas características podem fazer com que a empresa demore a reagir, e perca o momento ideal para uma transformação estrutural. Outras empresas, pelo contrário, têm uma tradição de aproveitar rapidamente as oportunidades. Quando esse traço é suportado por outras características importantes, como responsabilização, liderança forte e uma equipa de gestão alinhada e sénior, estão criadas condições para fomentar a rápida tomada de decisões essenciais para a mudança estrutural.

A cultura também é relevante logo após a deliberação de se avançar com as mudanças estruturais. A maioria dos funcionários tem fortes ligações emocionais com a cultura. Essa fonte de orgulho, juntamente com uma visão clara e inspiradora do futuro, pode motivá-los a alinhar-se sob a bandeira da mudança e inspirar a organização a unir-se no processo de transformação. Os líderes, a todos os níveis, devem ser geradores do ímpeto de mudança ao sinalizarem e adotarem os comportamentos desejados.

Uma nova estrutura sem uma evolução correspondente da cultura equivale a pouco mais do que um gráfico de organização redesenhado. A cultura faz ou desfaz uma nova estrutura, influenciando fatores tão diversos como a atribuição de recursos, o governo da companhia e a capacidade de seguir uma promessa de "mudar a forma como o trabalho é feito." Não é incomum uma empresa colocar um esforço tremendo e recursos generosos numa revisão estrutural completa, para finalmente constatar que por incompatibilidade com as normas culturais vigentes, é frustrada a execução estratégica. Por exemplo, define-se um modelo operacional novo, simplificado, destinado a acelerar a tomada de decisões e a promover a colaboração entre funções, este não se enraizará numa cultura que exalta a hierarquia e incentiva os funcionários a concentrarem-se em prioridades funcionais estritas.

A cultura também influencia a vontade da empresa em fazer mudanças estruturais profundas no tempo adequado para evitar uma crise. Aquelas empresas que demoram demasiado tempo para atuar de tal forma que as condições do mercado já minaram o seu modelo operacional, colocam-se em desvantagem face às congéneres. A verdade é que, poucas empresas tentam mudanças estruturais em épocas de acalmia.

Na ausência de crise, as expectativas culturais geralmente limitam os diretores a meros observadores de indicadores, sejam crescimento ou rentabilidade, enquanto que a gestão de topo se concentra na consecução de objetivos estratégicos específicos. Nesta tradicional atribuição de responsabilidades, as questões estruturais emergentes podem não ter a atenção suficiente. Empresas bem-sucedidas, em contrapartida, reavaliam continuamente a sua estrutura à luz de condições de mercado em evolução. Estas empresas entendem que as estruturas organizacionais não são organismos estáticos, e que as escolhas estratégicas devem ser reconsideradas face às circunstâncias e com objetivos que mudam.

Capitalizando as mudanças

No meio deste turbilhão que é a indústria de seguros atual, uma coisa é clara: o negócio rotineiro, como de costume, não pode, nem vai crescer sustentado, ou rentável. Com forças poderosas a transformarem os mercados, as ferramentas convencionais de execução estratégica estão a perder a sua eficácia. Os desafios de hoje não são operacionais, mas estruturais. Muitas seguradoras carecem da escala, de capacidades ou eficiência para competirem eficazmente à medida que a concorrência se intensifica, as obrigações regulatórias aumentam, tanto quanto as pressões financeiras.

As empresas vencedoras tendem a responder a desafios estruturais com soluções estruturais. As abordagens variam de empresa para empresa. Algumas adicionam escala ou aprimoram recursos, enquanto outras agilizam as estruturas de custos e/ou saem das linhas de negócios deficitárias. Com o alinhamento cultural certo, as respostas estruturais permitem posicionar as empresas de forma a capitalizarem nas mudanças da indústria. 

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