Seja você mesmo ou morra tentando
Em 1990, bem no início da década que está agora na moda, uma comédia fez muito sucesso. O nome era “Crazy People - Muito Loucos”. Contava a história de um publicitário (interpretado por Dudley Moore) que era internado em uma instituição psiquiátrica e que, se juntando aos pacientes de lá, começa criar campanhas que são adoradas pelo público - porque falam a verdade sobre os produtos e as marcas. A graça residia justamente nisso: a publicidade não era verdadeira e pensar que isso poderia acontecer só podia ser ficção. E comédia.
Corta para 2019. Tempo de fake news, conexões rápidas, millennials em busca de sentido e overdose de informações. Aquela verdade que os loucos faziam e era motivo de riso no filme é a busca atual e constante de marcas e geradores de conteúdo. Seja você mesmo ou morra tentando.
Sem padrão
Grandes geradores de conteúdo digital, como Buzzfeed, Vox e Vice, entre outros, estão passando por mudanças grandes de equipe, contam seus profissionais em conversas de mercado. Além de uma readequação financeira, trata-se primariamente de uma mudança de perfil de equipe. É uma busca por diversidade real, para além do discurso.
Ainda com menor intensidade, mas com frequência muito notável, o mesmo está ocorrendo com as grandes agências de publicidade. Há um burburinho no mercado de que quem comanda, mesmo que não se importe muito com isso em termos pessoais, percebeu que não dá mais para ter um monte de homem, branco, rico e cis cuidando da criação se quiser gerar comunicação efetiva para todo o contingente de pessoas que não se identifica com esse padrão.
Um Kond é rei
Um sinal disso é o anúncio de que Konrad Dantas, conhecido como Kond, a mente genial por trás da marca KONDZILLA, responsável por inúmeros fenômenos da cultura popular recente, vai assumir a direção criativa da marca de vodka Orloff pelos próximos nove meses.
Numa ação inteligentíssima arquitetada pela agência Soko, Kond vai pensar em como a marca pode se aproximar de quem realmente é seu público: os jovens da classe C. Orloff não é Smirnoff nem Absolut. E não precisa ser.
Em entrevista para o Meio&Mensagem, Sabrina Zanker, gerente de grupo de marca de White Spirits, da Pernod Ricard, dona de Orloff, é clara e objetiva: “Estávamos muito voltados para o consumo dentro de casa, enquanto essa juventude está muito na rua e conquistando espaços públicos. Vamos reconectar com quem não estávamos falando, mas continuar o diálogo com todos os nossos consumidores”, diz.
Contra dados não há argumentos
Uma mudança como essa vem da pressão do consumidor, que muito mais conectado e vocal, passou a expressar sua visão de maneira firme, especialmente nas redes sociais. Porém, por muito tempo, essas palavras não eram levadas à sério. “É mimimi de meia-dúzia de haters”, ouvi muito por aí.
Mas então chegaram as ferramentas e os profissionais de análise de dados no jogo. Com mais profundidade, essa área de verdadeira inteligência começou a mostrar que antigas presunções sobre o perfil do público já não podiam ser consideradas “mimimi”.
Há uma massa de pessoas que não se enxerga na publicidade atual. Que sente que o conteúdo dos grandes produtores não é para eles.
Essa galera, que é a maior parte do público, começou a seguir novos perfis, a criar seus próprios influenciadores e canais. Como Kondzilla, por exemplo. Começaram a ressignificar marcas e produtos.
E tudo isso começou a ser visto e tabulado nos departamentos de B.I por aí, resultando agora numa mudança que pode, muito rapidamente, colocar a comunicação brasileira num patamar de referência de diversidade para o mundo todo. Já passou da hora.