Senso de Propósito Como-Um: o que é e como criá-lo
A razão de viver de uma pessoa, segundo a filosofia Japonesa IKIGAI* está no encontro da missão, paixão, vocação e profissão. Em outras palavras, o propósito está no centro daquilo que o mundo precisa, do que amamos fazer, das habilidades que temos e das atividades que podem ser remuneradas.
Se considerarmos que cada pessoa tem um propósito pessoal norteando seus objetivos, intenções e metas, e que os times, as organizações, as comunidades, os países e a humanidade também os têm, percebemos propósitos coexistindo em múltiplos níveis. Como então gerar um senso de propósito como-um, que atenda o pessoal e o coletivo?
Consciência dos propósitos em jogo pode ser uma primeira resposta. Realmente, nos parece que quanto melhor consolidados e compreendidos os propósitos pessoais e coletivos, mais prontidão para ação e maior capacidade teremos para defendê-los. Para ilustrar esta reflexão, recordamos uma jornada, na qual usamos os jogos cooperativos como ferramenta para os times da empresa refletirem e levarem aprendizados e novas práticas para suas rotinas:
Em um dado momento, após os jogos, os times foram convidados a conversar em pequenos grupos sobre o que precisavam parar de fazer (aquilo que percebiam que não gerava resultado), começar a fazer (algo que acreditavam que traria resultado se feito) e continuar a fazer (o que faziam bem e gerava resultado). Na partilha, foi quase unânime que deveriam parar de trabalhar em silos, fechados na sua própria área.
A percepção de que estavam restritos à sua área, sem olhar para o todo, é um sintoma de que o propósito da organização não estava revelado ou não reverberava para todos. Sem ele, como promover o encontro do propósito da organização com o do time e com os pessoais? A ausência destas conexões faz muitas vezes com que as pessoas se dediquem exclusivamente a executar sua função, como se ela fosse a razão de ser do time e da organização, o que conduz a uma atuação bastante limitada frente ao potencial individual e coletivo. Então já sabemos, função não é propósito e distinguir os dois também é importante.
E, para não perder a oportunidade, vale um parêntese aqui para olhar para essa percepção de separatividade vinda da cultura de competição e individualização. Uma vez que as áreas vivam essa separatividade, menos chance dão para fluir num propósito comum e ainda geram enorme desperdício de energia, tempo e competição desnecessária “protegendo” os objetivos da sua área e time.
Propósitos revelados, consciência ativa e já percebemos que os propósitos partilhados não são necessariamente iguais, certo? Isso mesmo e não se trata de unificá-los, mas de reconhecermos onde os propósitos pessoais encontram com os do time e com o da organização, para dar sentido a nos dedicarmos a eles. E isso nos conecta com outra jornada que vivenciamos num órgão do governo para gerar seu planejamento estratégico.
Ao realizarmos a roda dos sonhos (uma prática colaborativa do Dragon Dreaming, metodologia para gerar projetos colaborativos), percebemos um foco grande em propósitos e objetivos pessoais, sem conexão com os coletivos e organizacionais. Ajustamos a jornada para convidá-los a elaborar colaborativamente o propósito da organização. Foi incrível, pois ao juntar as produções de cada grupo, vimos que eram muito parecidas! Unificamos o propósito com facilidade e, numa atividade circular, identificamos as entregas das áreas e os serviços prestados para, em seguida, cada pessoa identificar em quais atuava, gerando a consciência da atuação (função) até chegar no propósito da organização. Finalizamos com uma reflexão e partilha sobre como os propósitos pessoais, dos times e da organização se conectavam. E só aí, sentimos ter criado um senso de propósito como-um para seguirmos no planejamento estratégico.
Algumas tecnologias sociais e atividades colaborativas foram adotadas na jornada que descrevemos. Um procedimento que seguimos sempre é fluir “do simples para o complexo”, o que nos convida a, sempre partirmos do simples – e pararmos para retornar para o simples, sempre que necessário – para desvendar todo mundo JUNTO uma trilha que nos conduza a cocriar algo que ainda não sabemos separadamente e que, ao nos juntarmos, descobrimos em conjunto.
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Se pensarmos que são muitos propósitos a nossa volta – o meu, do meu time, da organização, da comunidade a qual atendo etc. – e cada um construído sobre uma ótica distinta, em contextos próprios e sob interesses que desejamos proteger, poderia parecer muito complexo conectá-los, não? Por isso, mantermos nossa atenção no que o grupo traz e precisa, cuidar da leveza para alcançar a profundidade, fluir do simples para o complexo são úteis para gerar abertura para explorar e para criar espaço para conectar os propósitos.
Existem elos e são esses elos que nos fortalecem!
O Projeto Cooperação tem como propósito ser uma comum-unidade feliz e sustentável que crie, desenvolva e compartilhe conhecimentos e práticas para difundir a cooperação no mundo. Para tanto, âncora seus serviços na Pedagogia da Cooperação, que tem como propósito criar ambientes colaborativos para que cada pessoa possa VenSer quem se É para SerVir mais completamente ao bem comum. Seu time segue o Sonho do Beto** de deixar o mundo melhor do que encontrou, compartilhando a percepção de que espalhar a semente da cooperação no mundo é uma forma de contribuir para isto. E cada pessoa individualmente conecta seu propósito pessoal com ao menos alguma parte ou perspectiva de cada propósito citado.
Para fortalecer nossa comum-união, deixamos aqui nossa reflexão: criar um senso de propósito como-um é respeitar e incluir todos os propósitos presentes, tomar consciência de todos que ali coexistem e coletivamente encontrar as conexões que nos fazem (pessoa, time, organização, comunidade etc.) seguir em conjunto e ampliar nosso engajamento e capacidade de transformar sonhos em realidade.
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Por Cambises Bistricky e Carla Albuquerque
Cambises Bistricky é focalizador do Projeto Cooperação e docente da pós-graduação em Pedagogia da Cooperação e Metodologias Colaborativas e co-autor do Livro “Pedagogia da Cooperação, por um mundo onde todas as pessoas possam VenSer",
Carla Albuquerque é colaboradora do Projeto Cooperação, co-fundadora de Coletivamentes, co-organizadora e co-autora do Livro “Pedagogia da Cooperação, por um mundo onde todas as pessoas possam VenSer".