Silvicultura – mercado de madeira tropical e a liberdade econômica

Silvicultura – mercado de madeira tropical e a liberdade econômica

Quero compartilhar um artigo que publiquei num livro sobre liberdade econômica e agronegócio, recém lançado, Agro Negócio. Da declaração de direitos de liberdade econômica com ênfase na atividade negocial e no agronegócio

Nele, eu falo sobre o peso da “Demanda” sobre o desmatamento, sobre o insucesso de alguns projetos de manejo bem como sobre a manutenção do mercado ilegal de madeira.

Foi escrito para não especialistas na área Florestal. Gostaria muito de saber sua opinião sobre o que escrevi.

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A cadeia produtiva da madeira tropical é marcada por profunda dualidade, pois tanto pode ser o elemento mais poderoso de conservação das florestas e das populações que nela residem, quando baseada em técnicas e preceitos do manejo florestal sustentável, como também pode ser um dos maiores vetores de destruição ambiental e social, quando suportada pelo mercado ilegal de madeira.

Neste artigo pretendemos discutir, baseado em exemplos reais, quais fatores levam para um ou outro caminho, e como o mercado pode tornar-se o grande indutor da preservação das florestas tropicais.


Madeira tropical sub valorizada como matéria-prima e insumo.

É muito difícil imaginarmos nossas vidas sem madeira ou algum insumo proveniente dela. Lhe convido a olhar ao seu redor e me atrevo a dizer que haja no mínimo uma dezena de objetos que sejam constituídos, em parte ou na sua totalidade, por madeira ou algum subproduto dela. A madeira permeia nossas vidas de forma tão intensa que nos acostumamos a não lhe dar o devido valor, mesmo nós, brasileiros, que nascemos no único país do planeta que tem nome de árvore.

As qualidades da madeira como insumo começam durante sua “produção”, ou durante o crescimento das árvores, que para se desenvolver fixam carbono. Este é primeiro grande diferencial. Qualquer outro insumo que não seja de origem vegetal emite carbono durante sua produção ou preparo.

Mas, longe de se limitar a isto, quando em povoamentos maiores, as árvores auxiliam na produção e manutenção da qualidade da água, colaboram para estabilizar o clima e servem de abrigo da fauna. Não obstante, quando em sistemas nativos, as árvores formam povoamentos de incomparável valor biológico sendo guarida para as mais variadas espécies de animais, fungos, insetos, bactérias e tantos outros.

Apenas por isso a madeira já seria um ótimo material, mas suas qualidades e atributos físicos e químicos nos atendem desde os primórdios da humanidade, provendo calor, iluminação, moradia, conforto, ferramentas, utensílios etc.

De tantos usos vou me ater apenas a construção civil, onde as qualidades ímpares da madeira nos brindam com inúmeras vantagens sobre a grande maioria dos materiais construtivos, ao contrário do que os “lobbies” do concreto e do aço sempre tentaram nos fazer crer. Aliás, desde que éramos pequenos, os “Três Porquinhos” nos fizeram pensar que casas de alvenaria seriam mais seguras do que casas de madeira.

Isto absolutamente não é verdade. No incêndio ocorrido em 2.015, em São Paulo, no prédio da Estação da Luz, que abriga o Museu da Língua Portuguesa, a primeira parte do telhado que colapsou foi uma parte que havia sido reformada com aço em 1.946, por conta de um outro incêndio.

A propósito, pergunte para um bombeiro e provavelmente ele vai lhe confirmar que prefere entrar em um galpão em chamas estruturado em madeira a entrar num galpão estruturado em aço, pois a madeira, ao contrário do aço, dá indicações precisas de quando vai colapsar. Além disso, a madeira suporta altas temperaturas por mais tempo.

Não obstante, a madeira é mais leve que o concreto ou o aço demandando fundações menores e mais baratas, fato que de extrema relevância quando se pretende construir em superfícies com baixa capacidade de suporte ou mesmo instáveis, sujeitas a tremores de terra. Ainda, a madeira é um ótimo isolante térmico e acústico além de demandar baixa energia para ser usinada em seu formato final.

Mercado ilegal de madeira tropical

O comércio ilegal de madeira é um fenômeno extremamente complexo e de dimensões globais. Além de lucros astronômicos para os grandes fraudadores, operações ilegais que envolvem madeira invariavelmente tem como principais consequências a destruição de florestas tropicais, bem como a degradação humana das populações locais, que sobrevivem dentro das florestas em condições de trabalho análogas a escravidão.

A INTERPOL usa o termo “Crime Florestal” como um guarda chuva para designar uma série de atividades ilegais ligadas a cadeia produtiva da madeira, que vão desde o corte e transporte até o processamento e venda final dos produtos madeireiros. Mas o termo também contempla uma série de outras atividades que ocorrem em paralelo, como: corrupção, abuso de poder, extorsão, nepotismo, sonegação de impostos, fraude, lavagem de dinheiro e escravidão.

Estimativas publicadas em abril de 2019 pelo “Global Forest Enforcement”, da própria INTERPOL, dão conta de que 50 a 90% de toda exploração florestal em florestas tropicais no mundo é ilegal, e que o comércio ilegal de madeira movimenta entre de 51 a 152 bilhões de dólares por ano. No Brasil, estatísticas da BVRIO, IMAFLORA e do próprio Governo do Estado de São Paulo estimam que de 60 a 80% de toda a madeira tropical comercializada no Brasil tem algum tipo de ilegalidade.

As consequências nefastas do comércio de madeira ilegal nas florestas são bem conhecidas por todos nós, não demandando maiores explicações, porém as consequências sobre as comunidades locais são pouco divulgadas.

A IUFRO (União Internacional das Organizações de Pesquisa Florestal) instituição de pesquisa ligada ao Banco Mundial, citando Kishar and Lascuyer, 2012, diz que o preço médio final do metro cúbico de madeira ofertado no varejo, pelo mercado ilegal, na Indonésia, é de US$ 1.000. Porém, o primeiro elo da cadeia, o explorador local (quem corta a madeira na floresta) fica apenas com US$2,20 por este mesmo metro cúbico.

Então, na medida em que a madeira vai trocando de mãos, este valor vai se multiplicando até que o operador responsável por “esquentar” os documentos da madeira pague US$160,00 pelo mesmo metro cúbico e o venda por US$710,00 para o varejista que, finalmente, o vende pelos tais US$1.000,00 para o consumidor final.

Esta verdade se reveste de requintes de crueldade quando sabemos que o explorador local (o silvícola que vive na floresta e corta as árvores) dorme em cabanas de lona no meio da selva, sem energia elétrica, sem suprimento de água potável ou de qualquer outra necessidade básica, além de consumir alimentos de péssima qualidade. Não bastasse isto, normalmente não possue máquinas pesadas ou até mesmo recursos para pagar combustível ou peças de motosserras, motivo pelo qual ele acaba fazendo muitas operações manualmente.

Ressalto que falamos de árvores monumentais, com troncos de até 2 metros de diâmetro e 40 a 50 metros de altura que pesam dezenas de toneladas. Estas gigantes têm de ser derrubadas, depois tem de ter cortados seus troncos (em pedaços com 3 a 6 metros de comprimento) que depois serão transportados ou arrastados por longas distancias, não raro em terrenos acidentados, até algum caminho ou rio. Esta é amagnitude do descalabro social que este tipo de atividade ilegal impõe aos pobres silvícolas, mas que o mercado consumidor desconhece.

Manejo Florestal Sustentável Certificado, modelo prático de sustentabilidade

O Manejo Florestal Sustentável de florestas tropicais, especialmente quando certificado por uma terceira parte, é um dos melhores exemplos práticos para confirmar que sustentabilidade funciona. Numa interpretação pessoal, não técnica, o manejo pode ser definido como:

“a arte de retirar de dentro da floresta o que ela te daria e não o que você desejaria dela tirar”

Ao contrário do que se imagina, tirar produtos madeireiros e não madeireiros de florestas tropicais nativas, com técnica e conhecimento, é a melhor forma para protege- las, pois na floresta vivem muitas pessoas que tem necessidades e não tem outra opção de vida que, de alguma forma, não esteja ligada as próprias florestas em que vivem. Se assim é, então que seja algo sustentável.

Porém, antes de tecer mais comentários sobre manejo, é importante que resgatemos os fundamentos da sustentabilidade, pois não raro confunde-se o termo com alguma atividade isolada, de caráter filantrópico, relacionada a questões ambientais e sociais, tais como: reciclagem, redução de consumo, plantio de árvores e outras similares. Tais atividades ou ações nem de longe explicam o quão sofisticado o conceito de sustentabilidade é.

Sustentabilidade é um conceito que, relacionando aspectos econômicos, sociais, culturais e ambientais, busca suprir as necessidades do presente sem afetar as gerações futuras. Ou seja, qualquer projeto, iniciativa ou negócio, para ser considerado verdadeiramente sustentável, deve promover, de forma equilibrada e em consonância com a cultura local, ganhos ambientais, sociais e econômicos.

Fica claro então que, ser verdadeiramente sustentável está longe do trivial, pois agregar de forma equilibrada as facetas ambiental, econômica e social, respeitando a cultura local, é extremamente difícil, especialmente quando consideramos que a atividade principal é que deve prover o equilíbrio entre os pilares da sustentabilidade.

Isto explica por que a grande maioria dos projetos e negócios, ditos sustentáveis, são na verdade negócios que patrocinam algumas atividades isoladas, com viés ambiental ou social, de caráter assistencialista, que são arremedos ou apêndices da atividade principal, estando, portanto, diametralmente opostos do conceito de sustentabilidade.

Dada a complexidade e tecnicidade do assunto, a melhor forma de demonstrar porque o manejo florestal certificado é verdadeiramente sustentável é apresentar a referência mundial nesta atividade, a Precious Woods, uma empresa suíça, de capital aberto, que opera no Brasil e no Gabão. É duplamente certificada pelos padrões FSC® e PEFC® e exporta, para o mundo todo, madeira serrada e alguns produtos acabados, além de produzir e vender energia limpa e “créditos de carbono”.

A Precious Woods Amazônia maneja pouco mais de 500.000 hectares de florestas nativas no Brasil, uma área muito grande, equivalente a área territorial de Trinidad Tobago. Suas florestas são as mais bem preservadas na região, sendo que delas saem, em média, 150.000 metros cúbicos de toras por ano. Não obstante, outro número impressionante.

Considerada a referência global em Manejo Florestal de florestas tropicais, ela pode demonstrar nas suas florestas, e junto as comunidades que estão localizadas dentro de sua área de influência direta, o impressionante resultado de mais de 26 anos de atividades produtivas voltadas a provar que sustentabilidade funciona.

Como disse anteriormente, manejo florestal de florestas tropicais pode ser entendido como “a arte de retirar de dentro da floresta o que ela te daria, e não o que você desejaria dela tirar”. Porém, entender a floresta não é uma tarefa fácil.

Antes de mais nada, temos de lembrar que a vida das árvores na floresta é uma “guerra surda” por água, luz e nutrientes. Assim, quando numa floresta uma árvore morre e cai (árvores são seres vivos que nascem, crescem e morrem como um outro qualquer) as árvores, ao redor da “finada”, têm um alento e crescem rapidamente para ocupar o espaço vago. Aquelas que forem mais rápidas terão maior oferta de luz, água e nutrientes que as demais.

Então, num primeiro momento, entender a floresta passa por conhecer a taxa de mortalidade natural dela e definir um determinado limite operacional, que respeite a reposição natural da mortalidade, mais o tempo de crescimento natural do povoamento.

Assim, além de ser necessário um hercúleo e constante esforço de pesquisa e desenvolvimento, muito antes de se iniciar quaisquer operações na floresta (como abertura de estradas ou corte de árvores) é executado um censo de todas as árvores (sim, todas) com mais de 35 cm de diâmetro, oportunidade em que a espécie de cada uma destas árvores é identificada, suas medidas de altura e diâmetro são levantadas, sua localização geográfica (coordenadas GPS) é registrada, além de outras informações que são também coletadas.

Todos estes dados são então trabalhados por mais de um ano a fim de se determinar quais espécies tem maior ocorrência, quais espécies ocorrem pouco, quais árvores podem ser cortadas, quais não podem, como será feita a logística de retirada dos troncos etc.

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Atente-se que esta análise, de qual árvore pode ser cortada ou não, tem de considerar a legislação ambiental e fatores técnicos como número de indivíduos de uma mesma espécie, a existência de abrigos de fauna na árvore, presença de espécies raras, área de reserva ambiental, dimensões da árvore (as menores de 50 cm bem como as árvores dominantes de uma determinada espécie numa determinada área, são preservadas. Estas últimas porque são consideradas detentoras do melhor material genético da região que deve ser preservado para dispersão) e muitas outras regras que restringem o corte.

Só então, depois de definidas as árvores que podem ser cortadas, estradas são abertas e uma operação logística muito sofisticada é feita para que se possa, de forma cirúrgica (o termo não é exagero, vejam as imagens a seguir) retirar, em média, 3,1 árvores para cada hectare, a mesma área de um campo de futebol.

A operação vai então para outra parte da floresta e a área que foi trabalhada ficará se regenerando por mais 35 anos, até que a operação volte ao mesmo local. O resultado é surpreendente, e pode-se claramente ver que a floresta rapidamente se regenera.

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As toras então são retiradas da floresta (não antes de terem seus troncos e tocos devidamente identificados para permitir o controle da cadeia de custódia) com auxílio de cabos de aço e, depois seguem por estradas estrategicamente localizadas para que se evite degradação ambiental. Importante ressaltar que toda essa operação de campo ocorre somente na época seca, como mais uma medida de proteção ambiental.

A série histórica de imagens do Google Earth, mostrada a seguir, elucida o resultado da “intervenção cirúrgica” feita pelo manejo florestal na Precious Woods Amazônia. As imagens retratam o resultado da “arte” do manejo florestal sobre uma área de 10 hectares (equivalente a 10 campos de futebol) e estão centradas nas coordenadas 2o50’02.21”S e 58o47’05.75”O, podendo, portanto, ser checadas no Google Earth com facilidade. A primeira imagem foi tomada 6 meses após o corte das árvores, elucidando muito bem o baixíssimo impacto da retirada das toras.

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Nela é possível observar o traçado de uma estrada secundária, três pátios temporários de toras e algumas aberturas no dossel da floresta, onde estavam as copas das árvores suprimidas. Na segunda imagem, tomada 2 anos após corte, as aberturas no dossel praticamente não são mais vistas, a estrada já se mostra parcialmente coberta, sendo que os pátios de toras temporários ainda são visíveis. Na terceira imagem, tomada 13 anos após o corte das árvores, é possível ver apenas os resquícios de um pátio temporário, estando o resto completamente coberto. Importante ressaltar que este mesmo ponto da floresta só será novamente manejado no 35o ano, ou após 23 anos da última imagem, respeitando o ciclo do manejo florestal.

Então, toda a madeira é transportada para a serraria onde é serrada em diferentes dimensões e seca em estufa e ou tratada de acordo com cada pedido. Paralelamente, todos os resíduos da operação da serraria são transformados em energia elétrica numa termoelétrica que atende a operação da própria serraria e as necessidades de mais 50.000 habitantes do município de Itacoatiara, AM, que antes eram supridos com energia gerada por geradores a óleo Diesel e hoje recebem energia limpa, com zero emissão de carbono.

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Até aqui pudemos entender como o Manejo Florestal de florestas tropicais da Precious Woods atende o pilar ambiental da sustentabilidade, pois está claro que a operação da empresa promove a preservação da floresta em detrimento do “business as usual”. Promove também a redução de emissões de carbono a partir da troca de parte do sistema gerador de energia de uma termoelétrica a Diesel para uma termoelétrica movida a biomassa, onde emissão de carbono é zero.

Já o pilar econômico é atendido com recursos oriundos da remuneração pela venda de madeira serrada e de alguns produtos acabados como decks, pisos e outros produtos. Além disso, fazem parte da geração de caixa a venda de energia elétrica, para a distribuidora de energia que atende o município de Itacoatiara, bem como a venda de créditos de carbono oriundos da geração de energia limpa em substituição da energia gerada a partir da queima de óleo Diesel.

Já o pilar social da sustentabilidade é atendido, num primeiro momento, pelo respeito integral a todas as leis trabalhistas e normas do Ministério do trabalho, pois o business as usual do mercado ilegal de madeira se baseia no desrespeito parcial ou total do conjunto de normas e leis, fazendo com que, férias remuneradas, 13o salário, seguro saúde, alojamentos normalizados, refeições de qualidade, formação profissional e todas as demais obrigações trabalhistas sejam considerados o primeiro grande diferencial positivo da operação certificada, no âmbito social. Mas, há uma série de outras ações executadas junto aos funcionários e respectivas famílias, bem como junto das comunidades locais, que são voltadas a formação profissional, ao lazer e a valorização da cultura local a partir da promoção de atividades e programas culturais.

Outro ponto alto do relacionamento da empresa com a comunidade local foi a regularização fundiária de terras de posseiros que viviam dentro ou no entorno das terras da empresa, fazendo com que estas pessoas deixassem de ser consideradas párias pela sociedade em que vivem e mesmo pelo Estado.

Por isso que podemos afirmar com tranquilidade que o manejo praticado desta forma não só atende os tripés econômico, social e ambiental, mas também atende a cultura local, pois os moradores destas regiões têm a floresta, e todas as atividades ligadas a ela, contidas no seu próprio ser.

O mercado de madeira e suas idiossincrasias

Os marceneiros e carpinteiros experientes tem um dito: “não há madeira ruim, o que há é madeira mal usada”. Mas, infelizmente, no Brasil, o consumidor final típico de madeira além de não conhecer este dito tem algumas características muito marcantes, que atingem em cheio a sustentabilidade e a proteção das florestas, sobre as quais falo a seguir:

a) Querem “madeira de lei” porque entendem que esta é boa, apesar de não fazerem a mais parca ideia do que isto significa, ou mesmo se já significou algo. 


O Problema é que na concepção destes mesmos consumidores, as tais “madeiras de lei” se resumem a umas cinco espécies da moda, que vão sendo substituídas com o tempo. Já foram peroba, cedro, jacarandá da baía, pau brasil, pinho, mogno… Agora são cumaru, ipê, jatobá, cedrinho e garapeira. As outras mais de 100 espécies comerciais são solenemente ignoradas, apesar de também serem fantásticas, como todo bom carpinteiro sabe.

b) A grande maioria dos consumidores não sabe identificar espécies de madeira e, portanto, levam o que o vendedor disser que está oferecendo. 


Ou seja, ele acaba levando qualquer espécie comercial no lugar da “madeira de lei” que ele tanto queria, desde que o vendedor seja minimamente convincente. Vários estudos e levantamentos demonstram que inúmeras outras espécies são vendidas, de maneira fraudulenta, no lugar das espécies da moda.

c) Apesar de ficarem sinceramente deprimidos ao ver as reportagens versando sobre a destruição da floresta, os consumidores têm como segundo fator de decisão de compra o preço (o primeiro fator é ser madeira de lei) não levando em conta questões a origem e legalidade.


Esta combinação é a tempestade perfeita, no que tange a aceleração do desmatamento ilegal, por vários motivos. Começa que a floresta não tem só as espécies da moda, e a demanda por estas poucas espécies faz com que a destruição “ande” ainda mais rápido, pois os madeireiros têm de ir mais fundo na floresta para achar as tais espécies. Também, como não há disponibilidade real de “espécies da moda” para atender toda a demanda, os intermediários (os que esquentam a madeira ilegal e a tornam legal) também alteram a espécie das madeiras nos documentos falsificados, pois tem a certeza de que a maioria dos consumidores não sabe o que está comprando.

Mas o fator que mais fomenta a ilegalidade do comércio de madeira é o preço aviltado praticado pelo mercado ilegal. Em geral, o valor do metro cúbico, praticado nos grandes centros de comercialização de madeira, para uma mesma espécie, em média é 30% inferior ao preço praticado por empresas que atuam estritamente na legalidade.

Isto explica porque uma empresa do porte da Precious Woods Amazônia exporta aproximadamente 90% de toda sua produção, pois o mercado interno não remunera componentes de custo, como: impostos, atendimento as leis trabalhistas, desenvolvimento de tecnologia, aquisição de terras (ou obtenção de concessão de uso de florestas), burocracias governamentais, além do atendimento per si das leis ambientais que, apesar de indiscutivelmente necessárias, acabam por impingir custos operacionais relacionados a: licenciamento, investimentos em infra estrutura, treinamento, estudos básicos entre outros que, de forma alguma, são feitos pelos operadores ilegais.

Como a Liberdade econômica pode contribuir para reduzir o desmatamento da floresta tropical.

Um dos fundamentos do pensamento Neoliberal, a liberdade econômica, é que o Mercado tem sua “sabedoria” e que os agentes de mercado devem ter liberdade total para vender ou comprar (a qualquer preço que encontre um interessado na transação) e que que todos sejam livres para produzir, vender, comprar qualquer coisa que possa ser produzida. Não obstante, este mecanismo deve funcionar o mais livre possível do controle do Estado, segundo esta mesma linha de pensamento. Indubitavelmente o mercado tem sua “sabedoria” e seu poder de auto regulação tende a ser tanto maior quanto menos burocrático e quanto menos controle externo sofrer.

Mas esta “sabedoria” é, em última instancia, limitada pelos princípios e conceitos dos próprios atores de mercado, sendo assim subserviente as limitações destes. Então, não se pode esperar que o mercado venha a se movimentar no sentido de moralizar o mercado ilegal de madeira se os consumidores não tiverem a noção de nexo causal entre o ato de sua compra e o desmatamento.

Em outras palavras, ainda que se preocupe com a destruição das florestas, o consumidor que considera preço como fator principal de decisão de compra não tem consciência de que esta consumindo um produto ilegal, produto este que se auto promove pela concorrência desleal. Muito menos tem noção das máculas ambientais e sociais que explicam este menor preço final da madeira ilegal e que, de certa forma, acabam fazendo deste consumidor um criminoso culposo por adquirir produto ilegal.

Por outro lado, é interessante considerar que a “originação” de outros produtos, especialmente agora com o advento do COVID 19, seja um importante fator de decisão para a sua comercialização, de forma que fatores relacionados a segurança alimentar tais como: onde, por quem e como foi produzido e transportado, fazem parte dos requisitos básicos para precificação, ou mesmo para a negociação, de muitos produtos como carne, café, leite, óleo de palma, etc.

Infelizmente o mercado da madeira é tão profundamente maculado pela ilegalidade e pela concorrência desleal, há tanto tempo, que modelos econômicos tradicionais não se aplicam em seu formato comum, e demandariam profundo trabalho de conscientização dos compradores para que viessem a se tornar um mecanismo eficiente de combate a ilegalidade.

A “originação” praticamente não é levada em conta no mercado madeireiro e, na maioria das vezes, há uma falsa impressão de que mecanismos de comando e controle estatais são eficientes.

Como já abordado, os mecanismos de comando e controle Estatais são feitos em larga escala, globalmente, mas a maior parte da madeira tropical comercializada no mundo é ilegal.

Não obstante, a noção de preço da madeira que o consumidor final tem é extremamente descolada da realidade, dada a magnitude da concorrência desleal promovida pelo mercado ilegal, que inunda o mercado com madeira de baixo preço.

Então, num cenário de liberdade de mercado, marcado por baixa eficiência dos mecanismos de comando e controle por parte do Estado, seria fundamental que mecanismos de conscientização voltados ao consumidor final fossem deflagrados de forma contundente, visando mostrar que o comprador pode ser o indutor da redução da devastação de florestas e da melhora da qualidade de vida de centenas de milhares de pessoas que vivem na florestas.

Este seria um caminho para agregar a “sabedora do mercado” fatores que efetivamente seriam capazes mudar para melhor o terrível cenário atual que observamos em nossas florestas e na vida dos povos que nela habitam.



Jeanicolau Simone de Lacerda é Engenheiro Florestal com mais de 33 anos de vivência na área florestal e outras áreas afins. Trabalhou, em grandes empresas de papel e celulose e de chapas. Foi Perito Judicial em causas possessórias e ambientais em Comarcas do Estado de São Paulo. Foi diretor de ONG voltada a recuperação da Mata Atlântica e hoje é consultor independente de empresas líderes mundiais nas áreas de mineração, petróleo e gás, açúcar e álcool, manejo florestal, entre outras.

Fernando Lacerda

Professor | Mentor de candidatos e Executivos - Contribuir para tornar pessoas e empresas maiores e melhores

3 a

Espetacular. A parte que fala que ¨Manejo é obter o que o que a floresta lhe dá, e não tirar o que você quer dela¨é sensacional!!

Eduardo Francisco Ribeiro

Geólogo-Geotécnico Sênior | Cientista de Dados | MEng Engenharia Geotécnica | MSc Recursos Minerais

3 a

Muito bom Jean!

As premissas estão de alguma forma confusas, levando a conclusão para um lugar que se opõe diametralmente da realidade esperada com a liberdade econômica do uso de madeira nativa e sua escravidão atual para favorecer a indústria de espécies introduzidas....

Regina Whitaker

Legal Associate na LEGACIS

3 a

Parabéns pela objetividade do artigo! Mas ainda há muito trabalho a ser feito... abs

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