Sistemas nacionais de inovação, mudanças tecnológicas e transformações industriais.
Por Paulo Gala e Gabriella Livramento
Giovanni Dosi, ao escrever o livro Technical change and industrial transformation: the theory and an application to the semiconductor industry (1984), detalhou minuciosamente o surgimento da indústria de semicondutores com a intenção de verificar os componentes exógenos e endógenos que tornaram o ambiente propício ao seu surgimento em alguns países específicos. Dosi criticou algumas teorias que tentam explicar o processo de inovação como um simples aspecto da indução pela demanda ou pelo fator coercitivo da oferta; são falhos pelo fato de não englobar toda a complexidade de fatores que envolvem o processo, embora ambos tenham pontos importantes e necessários. O autor separou em três sistemas o processo inovativo: “sistema científico”, “sistema tecnológico” e “sistema econômico”. Muito embora eles estejam intensamente sobrepostos há a distinção dos esforços, das dinâmicas e das estruturas desses sistemas. Os sistemas são independentes de certa maneira; o campo científico depende dos esforços dos pesquisadores das universidades e das empresas, assim como interesses econômicos por trás das pesquisas. O campo tecnológico depende de fatores como a trajetória tecnológica das empresas bem como a disposição em inovar os processos. No que se refere ao sistema econômico, cabe ressaltar que os efeitos institucionais diretos em relação ao surgimento de tecnologias não são uma regra geral, mesmo com exceções na história.
Então fica a indagação, como de fato surgem as inovações e as mudanças científicas? Dosi sugere que, muito embora haja distinção nos esforços dos três sistemas, as condições econômicas interagem com o processo de seleção de novas tecnologias, como a influência no longo prazo dos fatores econômicos e tecnológicos no que tange a mudança científica. Além disso, Dosi enfatiza o papel primordial das instituições de pesquisa e o custeio dessas pesquisas mesmo que não sejam rentáveis no curto prazo. Nos países em que Dosi observou o surgimento da indústria de semicondutores, como Reino Unido, Alemanha, Itália e EUA, a pesquisa teve grande relevância e apoio das entidades financeiras para o seu custeio. Nota-se que muito embora os esforços sejam independentes, o organismo que se formam entre as instituições de pesquisa, empresas e instituições financeiras propiciam o surgimento das inovações.
O Japão foi case relevante que Dosi ressaltou no livro como um exemplo de sucesso na transformação tecnológica estrutural do país. O esforço japonês esteve muito ligado ao sistema econômico e ao sistema científico, as medidas institucionais do governo foram: a) restrição ao investimento estrangeiro; b) definição institucional e monitoramento público dos termos dos acordos de licenciamento; c) controle das importações temporário; d) fixação de metas tecnológicas e o estabelecimento de centros de pesquisa em conjunto com as principais empresas. Nota-se que o Japão alcançou o patamar europeu de tecnologia e avançou em termos de inovação através de uma política industrial coordenada com forte aparato do governo. O que fica evidente nos três casos – europeu, norte americano e japonês – é que o sistema científico tem um peso relevante no processo de inovação, os cases tiveram esse sistema como ponto de intersecção. Os arranjos produtivos nos diferentes países possuem graus e disposições diferentes entre si, seria um erro generalizar de onde deveriam vir os esforços: mercado ou instituições governamentais; em todos os casos, os sistemas se agregaram, mesmo que em diferentes períodos, a fim de estimular a trajetória tecnológica.
Resumo segundo Lundvall (2010) seguindo F.List e neoschumpeterianos: um sistema nacional de inovação com os três pilares acima reune um grupo articulado de instituições dos setores público e privado (agências de fomento e financiamento, instituições financeiras, empresas públicas e privadas, instituições de ensino e pesquisa, etc.) cujas atividades geram e difundem novas tecnologias, sendo a inovação seu aspecto crucial. O nível de articulação entre os diversos atores que compõem um sistema desses determina a capacidade de uma cidade, região ou país em gerar inovações. Um sistema Nacional de Inovação compõe-se do envolvimento e integração entre três principais agentes: o Estado, responsável por aplicar e fomentar políticas públicas de ciência e tecnologia; Universidades e Institutos de pesquisa responsáveis por criar e disseminar o conhecimento e Empresas responsáveis pelo investimento na transformação do conhecimento em produtos. Nesses sistemas o investimento público e a ação do Estado como fomentador, financiador e aglutinador são sempre essenciais.