Sistemas nacionais de inovação: o caso da EMBRAER.

Sistemas nacionais de inovação: o caso da EMBRAER.

Por Paulo Gala

[Artigo editado pela equipe 100PORCENTO, sem revisão do autor]

 

A EMBRAER nasceu como uma iniciativa do governo brasileiro dentro de um projeto estratégico para se implementar a indústria aeronáutica no país. São considerados os precursores da Embraer o antigo Centro Técnico Aeroespacial (CTA), que em 2009 passou a ser denominado Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA) e o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Ambas as instituições foram criadas, respectivamente em 1946 e 1950, pela Forca Aérea brasileira. Em 1946 foi criada a Comissão de Organização do Centro Técnico de Aeronáutica (COCTA), com sede temporária no Campo de Marte (zona norte de São Paulo) com o objetivo de viabilizar o início da execução do plano geral de estabelecimento do Centro Técnico de Aeronáutica (CTA). Após pouco mais de 4 anos de atuação, em 1950, a COCTA concluiu a implantação, na cidade paulista de São José dos Campos, das duas primeiras unidades do Centro Técnico de Aeronáutica: o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) e o Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento (IPD). Embora ainda sob a gestão da COCTA e sem todas as unidades implantadas, em pouco tempo o Centro Técnico de Aeronáutica se tornou o principal centro de pesquisas aeronáuticas do Brasil. O IPD absorveu grande parte dos engenheiros aeronáuticos formados pelo ITA, especialmente os militares.

No IPD foram projetados três dos quatro primeiros aparelhos fabricados pela Embraer: o Bandeirante, o avião agrícola Ipanema e o planador Urupema. A própria criação da Embraer foi uma iniciativa de um grupo de engenheiros militares que atuava no IPD. Dessa forma, pode-se estabelecer as origens da Embraer na própria implantação do CTA, de onde saíram os principais projetistas e dirigentes da indústria aeronáutica brasileira da década de 1970. Fundada no ano de 1969 como uma sociedade de economia mista vinculada ao então Ministério da Aeronáutica, a Embraer teve, inicialmente, a maior parte de seu quadro de funcionários formado com pessoal oriundo do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), que fazia parte do então CTA. De certo modo, a então EMBRAER nasceu dentro do CTA. Durante as décadas de 1970 e 1980 a EMBRAER conquistou importante projeção nacional e internacional com os aviões Bandeirante, Xingu e Brasília. Ao iniciar uma parceria com a Itália em 1981, foi possível elaborar o avião de ataque ar-terra AMX, considerado um importante salto tecnológico para a elaboração de novos projetos.

Em 1988 teve início o desenvolvimento de um avião binacional que seria projetado e construído tanto pela então EMBRAER quanto pela argentina Fabrica Militar de Aviones (FMA). A aeronave teve a designação de CBA-123, sendo CBA a sigla para Cooperação Brasil-Argentina. Em 1990 o primeiro protótipo voou, mas seu alto preço, além da crise econômica e política da época, acabou com o projeto. O final da década de 1980 foi marcado por crises financeiras que abalaram a economia brasileira e atingiram em cheio a então EMBRAER, que quase fechou. Em 1994, durante o governo Itamar Franco, a empresa foi leiloada, para depois passar por um longo processo de reestruturação e apresentar novos projetos que a tornariam uma gigante do setor. Antes de ser privatizada, a companhia estava à beira da falência. Depois de alguns anos da privatização e com a fundamental ajuda financeira do BNDES no final dos anos 90, a empresa passou a ser a terceira maior fabricante de jatos comerciais do mundo. Essa recuperação de mercado após a privatização foi resultado do sucesso do programa ERJ-145, uma aeronave concebida para acompanhar a tendência mundial na aviação regional na época, que era de utilizar aviões de maior porte, com propulsão a jato. O sucesso continuou com os modelos ERJ-170 e ERJ-190. Uma das áreas em que a empresa mais investiu nessa época foi em pesquisa e desenvolvimento.

Essa breve historia da Embraer ilustra de forma prática o funcionamento de um “Sistema Nacional de Inovação” (Lundvall 2010, seguindo F.List e neoschumpeterianos): um grupo articulado de instituições dos setores público e privado (agências de fomento e financiamento, instituições financeiras, empresas públicas e privadas, instituições de ensino e pesquisa, etc.) cujas atividades geram e difundem novas tecnologias, sendo a inovação seu aspecto crucial. O nível de articulação entre os diversos atores que compõem um sistema desses determina a capacidade de uma cidade, região ou país em gerar inovações. Um sistema Nacional de Inovação compõe-se do envolvimento e integração entre três principais agentes: o Estado, responsável por aplicar e fomentar políticas públicas de ciência e tecnologia; universidades e institutos de pesquisa responsáveis por criar e disseminar o conhecimento e empresas responsáveis pelo investimento na transformação do conhecimento em produtos. Nesses sistemas o investimento público e a ação do Estado como fomentador, financiador e aglutinador são sempre essenciais.  O caso da Embraer ilustra bem o ponto.

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