SOBRE INFÂNCIA E LITERATURA
Recuperei imagem dos meus 5, 6 anos, para ilustrar texto sobre o meu décimo livro, “Confissões de um cadáver adiado”, publicado pela Editora Urutau. A foto me é cara por vários motivos: porque me remete aos bons e felizes tempos da infância na Vila Gotuzzo e na “Pracinha”; porque me faz valorizar ainda mais minhas origens; porque lembra que honrei os ensinamentos dos meus pais, me tornando um cidadão de bons princípios, dos quais destaco o humanismo e a empatia, sobretudo com os humildes, os discriminados e os deserdados da vida. Me remete, ainda, ao início dos anos 1960, quando, precocemente, me apaixonei pela literatura e fiz dela motivo de vida, apesar dos revezes e batalhas diárias pela sobrevivência. Também é testemunho de que um menino pobre, cujo destino marcado era a servidão, soltou-se das amarras e armadilhas – que mantêm a maioria presa a um contexto de miséria intelectual – e ganhou o mundo das letras. Essa fuga de um Sistema que explora, oprime e marginaliza, só foi possível porque os livros me libertaram e salvaram. Nesses tempos obscuros, em que estamos irreversivelmente contaminados pelo poder destrutivo das “telas”, sempre é hora de dizer que a leitura é um dos poucos prazeres humanos que contempla os sentidos de forma plena e nos faz pessoas lúcidas, esclarecidas, empáticas e humanitárias. Por fim, antecipo que boa parte da minha vida, mesmo antes desse menino (ele queria ser palhaço de circo e se tornou escritor) cuja inocência e postura, de certo modo, revelam o que ele próprio sequer imaginava, está descrita no livro, além da batalha para superar cânceres consecutivos, em 2011 e 2012. “Confissões”, portanto, é uma obra autobiográfica para ser lida com os olhos da alma, da emoção e da esperança. Foi escrita para os que acreditam na redenção, para quem cultiva a humildade, a empatia, a fraternidade, a igualdade e a liberdade; especialmente para quem enfrenta dificuldades ou enfermidades, pois é prova inquestionável de que o único problema insuperável é a morte.