Tóquio-2020 e os impactos de ser anfitrião de um megaevento esportivo
Um ano depois de inédito adiamento em 125 anos de história, começa nesta semana a 32a edição dos Jogos Olímpicos. Com audiência de cerca de 5 bilhões de pessoas, 200 horas de conteúdo de competições com 11 mil atletas de 200 países, os Jogos estão na categoria dos megaeventos esportivos. Como resultado, o Comitê Olímpico Internacional (COI), dono do evento, alcançou receita de US$ 5,7 bilhões no último ciclo olímpico com venda de patrocínios e direitos de transmissão, quase o dobro do que obteve 15 anos antes. Um negócio, portanto, altamente interessante para a sua organizadora, os seus patrocinadores e as empresas de mídia. Mas e para a cidade-sede, quais são os benefícios em ter a honra e a responsabilidade de organizar um dos maiores eventos do planeta?
Ao mesmo tempo em que crescem a atratividade e a movimentação financeira originadas destes megaeventos, aumentam a complexidade e os gastos requeridos para suas operacionalizações. No fim dos anos 2000, quando o Brasil foi escolhido como sede da Copa do Mundo e das Olimpíadas, o tema do risco e retorno desse tipo de candidatura passou a fazer parte dos debates econômicos por aqui. Isso porque receber um projeto dessa magnitude envolve compromissos de investimentos em infraestrutura esportiva e de mobilidade urbana, cujos impactos são de longo prazo. Com efeito, os orçamentos das últimas edições dos Jogos Olímpicos variam de US$ 11 bilhões (Rio-2016, com taxa de câmbio da época) a US$ 15 bilhões (Londres-2012 e Tóquio-2020), sendo parte bancada pelo comitê organizador e outra parte pelos governos locais.
Em contrapartida, a sede é colocada sob um imenso holofote mundial por pelo menos sete anos, desde o anúncio da escolha até o momento mágico da realização do evento em si. Espera-se com isso uma série de ganhos, alguns menos tangíveis, como influência geopolítica e cultural no mundo, até outros bastante visíveis, como aumento do turismo internacional, crescimento da prática esportiva local e melhoria das instalações. Sob um ponto de vista mais macro, pode fazer sentido para um país sediar um megaevento esportivo se houver potencial turístico pouco explorado e/ou déficit de infraestrutura esportiva e urbana. Por outro lado, também pode ser interessante se candidatar para receber este tipo de evento se o país já tem um amplo parque esportivo e índice alto de desenvolvimento urbano, já que neste caso não seriam necessários grandes gastos para a sua realização.
O Brasil, com a Copa do Mundo de 2014 e a Rio-2016, poderia à época se enquadrar no primeiro bloco: instalações esportivas bastante aquém do ideal, baixo índice de visitantes estrangeiros e malha urbana bem deficiente. De fato, após os eventos o país passou a ter pelo menos 14 arenas esportivas de nível internacional, número de turistas internacionais 29% maior (média atual de 6,2 milhões por ano contra 4,8 milhões na década anterior), e projetos importantes de infraestrutura (metrô, VLTs, BRTs, revitalizações urbanas). Mesmo assim, dado o alto volume de dinheiro público envolvido, persistem as dúvidas se os recursos poderiam ter sido direcionados para outros investimentos mais prioritários, se o retorno gerado é suficiente e se os custos de manutenção dos novos espaços se justificam.
O Japão claramente se enquadraria no segundo perfil: um país rico, com alto grau de desenvolvimento urbano e social, experiência prévia na realização de megaeventos e infraestrutura bastante avançada.
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Ainda assim, o orçamento de Tóquio-2020 está entre os mais altos da história, somente abaixo de Pequim-2008, o que vai de encontro ao esperado. Além disso, apesar do país ter um alto fluxo de turismo internacional (quase 32 milhões de visitantes por ano), havia a expectativa de que se pudesse aumentar este índice, já que o Japão não está entre os 10 maiores destinos do mundo. Lamentavelmente, por conta da pandemia e a consequente ausência de público nas competições, será mais difícil alcançar este objetivo.
Tóquio-2020 e a pandemia escancaram um desafio que vem crescendo a cada edição de megaevento esportivo: como minimizar os potenciais efeitos negativos para as sedes diante dos altos custos e requerimentos impostos para a sua realização. Para o dono da festa, além do risco de imagem e rejeição, pode haver redução no número de interessados em recebê-la: se havia dez candidatos para a edição de 2008 dos Jogos Olímpicos, para 2024 e 2028 foram apenas cinco, num processo bastante sofrido em que várias cidades declinaram. Ciente disso, o próprio COI lançou há sete anos a Agenda 2020, um conjunto de 40 recomendações para tornar os Jogos mais sustentáveis, sendo que quatro delas se referiam diretamente ao processo de candidatura. Mesmo assim, os resultados ainda não puderam ser percebidos.
Parece que estes eventos alcançaram tamanha envergadura que torna extremamente difícil para o organizador reduzir suas exigências e/ou adequá-las para realidade local. E pelo lado da sede, acaba sendo praticamente impossível de cancelá-lo mesmo diante de uma calamidade mundial por conta das pressões contratuais e do volume de dinheiro envolvido.
Os Jogos Olímpicos são uma celebração humana única, uma festa de consagração entre os povos em torno do esporte. E é também um negócio bilionário, com efeitos econômicos de longo prazo para o anfitrião. Um projeto só se sustenta ao longo do tempo se gerar benefícios duradouros e mútuos para todos os envolvidos, e daí a importância de se aprofundar o debate sobre o retorno para países que recebem este tipo de evento. De qualquer forma, pelas próximas semanas o mundo se voltará para Tóquio, onde teremos experiências memoráveis de superação humana por meio do esporte. Se tem um povo capaz de entregar um evento com excelência e em segurança mesmo numa pandemia, é o japonês. Ainda que apreensivos com os riscos sanitários envolvidos, esperamos que o acender da tocha no dia 23 de julho represente mais do que nunca o início de uma era de esperança por dias melhores.
Diretor Comercial| Consultor de Negócios| Coordenador de Negócios| Gerente Comercial| Gerente de Vendas| Coordenador Comercial| Coordenador de Vendas| Sales Manager| Head Comercial| Head de Vendas| Gestor Comercial
9 mFernando, 👍
Consultor de Gestão | Transformação Digital | Inovação | Treinamentos | Liderança | Resultados
1 a👏👏👏
Fundador da Trevisan Escola de Negócios e da Trevisan Auditores e Consultores. Professor e conselheiro. Medalha João Lyra mérito contábil, o maior reconhecimento do mundo contábil
3 aArtigo do Fernando é robusto, elegante e conciso. Relevante a leitura para todos os que se interessam por esportes. Fernando desmistifica a questão econômica que perpassa pelas olimpíadas e copas do mundo.