Também em transportes, diagnóstico errado pode matar o paciente

Também em transportes, diagnóstico errado pode matar o paciente

Procuro alguém que acenda velas ao invés de amaldiçoar a escuridão. (Joshua Harris)

42,7% das estatísticas são inventadas na hora. (Steven Wright)

O momento é grave. A greve dos caminhoneiros expôs a fragilidade do país e de sua infraestrutura de transportes, fato que não é novo nem tampouco desconhecido para os especialistas na área.

A recomendação é de muita calma neste momento de crise. É exatamente nestes momentos que aparecem os palpiteiros, “engenheiros de obras prontas”, “messias do momento” que apresentam soluções fáceis e que utilizam estatísticas simplórias, daí tirando conclusões estapafúrdias. A mídia tem ecoado estas soluções milagrosas, contribuindo para a desinformação sistêmica e generalizada sobre o setor.

Um exemplo pode ser as comparações inconsequentes entre o market share da rodovia na matriz modal do Brasil e dos Estados Unidos podem levar a conclusões descabidas como afirmar que o Brasil é um país rodoviarista e que a causa do descaso da ferrovia no país é a rodovia.   

De fato, a rodovia sofre tanto com o descaso e a incapacidade da gestão pública quanto os demais modos. Um país que possui apenas 12% de sua rede pavimentada e um estado como o Rio Grande do Sul, que possui apenas 8%, não podem ser considerados rodoviaristas.

A tabela abaixo mostra que comparações sérias devem levar em conta também os números absolutos e a quantidade de rodovias pavimentadas.

A rede pavimentada americana é mais do que o dobro de toda a rede de rodovias brasileira e 18 vezes o tamanho da rede pavimentada de nosso país.

Alguns artigos e manifestações que tenho visto, inclusive em jornais supostamente sérios, têm responsabilizado as rodovias pelos problemas nas ferrovias, o que é claramente uma sandice.

Temo que conclusões equivocadas acabem sugerindo que os investimentos em rodovias (que foram irrisórios nas últimas décadas) devam ser ainda mais reduzidos para ampliar a rede de ferrovias. Seria mais um erro incorrido na área, que já sofre endemicamente de carência de recursos e de aporte intelectual em sua gestão. De fato, o que o país precisa é ampliar os investimentos em TODAS as modalidades de transportes, assim como qualificar a gestão e eficiência do gasto público na área, não apenas em termos de novas obras, mas também em manutenção, operação das vias existentes.

Os problemas centrais de transportes sempre foram (e continuam sendo) a falta de conhecimento, a falta de formação e despreparo técnico/econômico dos tomadores de decisão, e a incompetência sistêmica que imperam na área.

Ouvindo, vendo e lendo alguns “experts” também me preocupei com essa percepção carente de informações sobre a questão de infraestrutura.

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