TIVE UM FILHO...ABANDONO O MEU SONHO?
Recentemente mencionei-vos que a pedido de uma querida amiga iria debruçar-me sobre as questões que os novos pais sofrem, nomeadamente no que respeita o seu próprio processo de individuação e a persecução dos seus sonhos após terem sido pais.
Notem: eu sou um péssimo exemplo de paternidade. Não tenho filhos. Não pretendo passar aqui nenhuma verdade, apenas uma perspectiva. Como coach, terapeuta, formador, tio e padrinho, tenho tido o privilégio de acompanhar (e ás vezes contribuir) para a educação de pais e filhos. E com base no que vi, senti e vivi e aprendi e aprendo diariamente, deixo-vos aqui não soluções, mas reflexões. As soluções podemos discutir juntos!
ANTES DE COMEÇAR. AMBOS ESTÃO A APRENDER
Seja o primeiro filho ou o segundo ou qualquer outro na fila, os filhos não são todos iguais. Os pais também não. Quando temos um filho, temos uma experiência com um novo indivíduo. Este indivíduo irá aprender tanto como irá ensinar. (espera, respira fundo.)
Irá aprender porque depende de nós no início da sua vida para o ajudar a perceber e encontrar o seu lugar no mundo, irá aprender quando o desafiarmos nos seus limites, ampliarmos e empoderarmos as suas competências, guiarmos a sua experiência do mundo, acolhermos os seus medos, celebrarmos as suas vitórias, dermos as mãos nos desafios, ou simplesmente estejamos lá para que o saiba... Mas também irá ensinar: irá ensinar-me a ser pai dele – diferente de pai dos outros, também meus, ou dos outros dos outros. Irá ensinar-me também a ser um outro eu, afiando o gume de quem sou e ajudando-me (espera-se) a fazer as pazes com quem não sou. Os filhos, em potencial (quando o meu ego não está em desequilíbrio) têm o potencial de serem excelentes mestres. O que queres ensinar? O que estás disposto a aprender?
COMEÇANDO PELO FIM
Se desistires dos teus sonhos, o que é que ensinaste ao teu filho? A desistir?
Será que é isso que lhe queres ensinar? “Não. Ensino-lhe que há valores que falam mais alto.“ Uma outra maneira de desculpar o desistir.
Não há nada mais alto que o sonho!
Porquê desistir do sonho? Em ultima análise ele não faz parte do sonho? Ou não beneficiará do seu resultado? Estás então a desistir de um futuro possível do teu filho? E os sonhos deles? Mais vale contar-lhe já a verdade e explicar-lhe que se os quer realizar que o faça depressa. “Depois, quando os teus filhos nascerem esquece. Olha para a mãe/pai. Eu também tinha sonhos.” E voilá, apresento-vos o sentimento de culpa– há tratados de psicoterapia escritos sobre este tema! (ou, “onde é que já vi este filme antes”)
VOLTANDO AO INÍCIO. O TEU SONHO TEM UM PLANO?
Como Coach, um dos meus papéis é garantir que o meu/ a minha cliente tem clareza e certeza daquilo que se propõe alcançar. Se chegaste aos 40 e não cumpriste o teu sonho estas são algumas questões que me parecem naturais. Experimentemos.
1. Qual é o teu sonho? Consegues defini-lo numa frase simples? Se não consegues, talvez o teu sonho seja só uma intenção ou até uma inspiração. Muitas vezes os nossos sonhos não são não verdadeiramente nossos, são projeções dos nossos pais, da sociedade, dos nossos medos, etc. Se tens dificuldade em explicar o teu sonho, talvez não seja teu! E ensinas o teu filho a necessidade de encontrar a sua própria voz.
2. Porque é que este sonho se tornou teu? Qual foi a tua motivação? O que mudou entretanto?
Se decidiste prosseguir este sonho, é porque acreditavas que valia a pena levar o plano avante. O que mudou? Começou a ficar difícil, tens pouco tempo, a criança precisa de muita atenção... e se ultrapassares todo o desconforto e superares os desafios o que há para ganhar? E ensinas o teu filho a importância do optimismo.
3. O teu plano é um plano? É SMART? Comprometeste-te com o plano? Tens acções concretas, timings, resultados a atingir claros?
Muitas vezes os nossos sonhos não se realizam porque nunca deixam de ser sonhos. Nas palavras do Greg Reid “Um sonho escrito num papel trona-se num objetivo. Um objetivo transformado em passos torna-se um plano. Um plano apoiado por ações trona os sonhos em realidade”. E ensinas o teu filho a planear o sucesso.
4. Qual é a pior coisa que pode acontecer se falhares? Esta pergunta lembra-me sempre da musica da Aalyiah “If at first you don't succeed ,Dust yourself off, and try again”, ou, “ Se à primeira não conseguires, sacode-te e tenta outra vez.” E ensinas ao teu filho o poder da resiliência.
5. O que é que está em jogo? Quanto de ti já deste? Quanto tempo, recursos, competência, aprendizagem, já dedicaste ao teu sonho e ao plano de o concretizar? Então se já dedicaste muito, de que é que valeu se desistes? E ensinas ao teu filho autovalorização.
6. A tua vida seria melhor se desistisses deste sonho. A tua. Não a da tua família ou do teu filho. A tua. Do teu Eu, do indivíduo que habita no ser uno que és. Porque se fosse melhor, talvez o teu sonho seja só uma obsessão. E ensinas ao teu filho o poder do desapego.
A REGRA DOS 5 ANOS.
Quando pesquisava para este artigo li muito sobre os novos pais e o desafio “sonho ou família”. Num dos artigos que li, o autor, pai, mencionava esta regra. Porquê 5 anos? Porque os primeiros 5 anos são determinantes no resto da vida do teu filho. São quando eles precisam mais de ti numa perspectiva holística, determinista e presencial.
“Então o que acontece aos 5 anos?” Não aos 5, mas aos 6 anos as crianças normalmente começam a escola e o seu horário e ocupação passa a ter menos necessidade da tua presença, permitindo-te investires outro tempo e recursos no teu sonho. Muitas vezes, sobreviver bem a estes 5 anos pode incluir ter de congelar carreira, optar por menos rendimento para ter um part-time, manter o trabalho, mas negociar para trabalhar de casa...ou seja, existem um sem número de opções. Portanto não é desistir, é só intervalo.
Nesta situação, em Portugal ainda temos muito que fazer para proteger e assegurar o direito das mães, mulheres, aos seus sonhos. Na nossa realidade, tal como Pleck verificou e escreveu em 1977: o trabalho dos homens interfere com a sua vida familiar, as obrigações familiares da mulher interferem com o trabalho. Precisamos de ter mais oportunidades de flexi-work, trabalho à distância, ou horário reduzido para que não prejudiquem a sua carreira e/ou os seus sonhos individuais. E para o pais também!
Penso que fica claro o meu ponto de vista.
Desistir ou não desistir de um sonho não cabe a um coach ou terapeuta ou a seja que for decidir por ti. Também não depende dos teus pais, irmão, amigos, família ou filho: não são eles que têm de viver sem o sonho. É o teu sonho. Tens de ser tu a decidir.
Como Coach, posso apenas ajudar-te a chegar à tua decisão e assegurar-me que é a que mais beneficia o teu Eu maior e te ajuda a viver a tua verdade.
Não prometo que vai ser fácil, posso apenas prometer que vai valer a pena!