Transparência até que ponto?

O Brasil assistiu, perplexo, durante esta semana, as imagens da agressão de Luis Felipe Manvailer a Tatiane Spitzner registradas pelas câmaras do circuito interno de tv do prédio em que residiam. O conteúdo é obviamente chocante. Ver uma mulher sendo brutalmente agredida por seu companheiro até o ponto de um provável assassinato é algo que jamais deveríamos presenciar. O registro incontestável dos atos de violência provocados por Luis Felipe servirão como prova no seu processo de julgamento - material valioso para a polícia. Agora, quem poderá defender o direito de privacidade de Tatiane, ao ver estas imagens vazadas? Será que era desejo dela ter seus últimos (horríveis) momentos de vida sofrendo a violência de seu marido esparramados na mídia - "na boca do povo"? Será que seus familiares foram consultados? Ou ainda, será que eles queriam ver sua filha, irmã, tia passar por esta crueldade e guardar como sua última lembrança momentos tão terríveis?

Esta história infeliz ilustra um dos maiores paradoxos que vivemos em nossa sociedade hoje. A mesma tecnologia que nos auxilia é a tecnologia que pode nos prejudicar. Então, como resolvemos este dilema? Não creio que a resposta seja retroceder o uso da tecnologia, mas garantir que existam mecanismos que garantam seu uso adequado protegendo a privacidade dos dados pessoais.

O Senado e o Congresso brasileiros aprovaram recentemente, em caráter emergencial e por unanimidade, o projeto de lei número 53 - marco legal que regulamenta o uso, a proteção e a transferência de dados pessoais no Brasil. O projeto aguarda agora a sanção presidencial. O texto garante maior controle dos cidadãos sobre suas informações pessoais: exige consentimento explícito para coleta e uso dos dados, tanto pelo poder público quanto pela iniciativa privada, e obriga a oferta de opções para o usuário visualizar, corrigir e excluir esses dados. Ele vem em uma linha muito similar com a legislação que vem sendo aplicadas em outros países, como por exemplo o GDPR (General Data Protection Regulation) que entrou em vigor na Comunidade Europeia em maio deste ano - talvez o marco regulatório mais abrangente e severo com relação ao tema.

Além da legislação - que é certamente um grande avanço - é fundamental aumentar o nível de conscientização de toda a sociedade para o tema. A tecnologia é uma ferramenta fundamental para o processo de democratização. Através dela é possível obter transparência e agilidade, empoderar indíviduos, desburocratizar processos, aumentar a eficiência e melhorar a segurança. O que tem que se coibir é seu uso abusivo com o objetivo de gerar ganhos e benefícios sem levar em consideração o respeito ao indivíduo.

* Este artigo foi escrito por mim e representa minhas opiniões pessoais.

Gilvan de Azevedo

Global Head of Management Consulting & Innovation

5 a

Ana que esse debate será cada vez mais importante! Talvez empresas de tecnologia possam desenvolver no futuro um sistema de de AI que monitore os sistemas de comunicação de forma que uma legislação futura que coiba esse exagero possa ter efetividade (nenhum familiar irá autorizar um grau de exposição como esse). Esse futuro guardião (AI based) poderá ser uma possível solução essas questões éticas e morais da transparência. Parabéns pelo artigo e principalmente pelo interesse em se posicionar e colaborar com essa mudança da nossa sociedade. Sds P.S.(Excelente sua palestra ontem (03/04) no CCE-Puc)

Antonio Abreu

Senior Partner Candido de Oliveira Advogados

6 a

As cenas expostas me pareceram tão chocantes que custei a ver os filmes integralmente não obstante a divulgação maciça e repetitiva. De fato, a mídia perdeu a cerimônia e nos brinda todos os dias com cenas totalmente desnecessárias. No caso, creio que o problema vai além da violação de privacidade. De qualquer modo, temo que já tenhamos leis em excesso e pouca disposição para cumpri-las diante de tanta regulamentação desnecessária. Mas é importante concentrar o foco no que realmente importa e construir compromissos éticos e humanitários em prol de uma sociedade mais civilizada e menos destrutiva dos valores que precisam ser preservados.

Renata Ramos

Administradora com especialização em Finanças, Gerência da Mudança e Gestão de Impacto como Multiplicadora B. Experiência corporativa de 20 anos. Há 15 anos atua como consultora de Gestão para PMEs.

6 a

Muito interessante a colocação. A questão da privacidade precisa ser regulamentada e ser um fator de preocupação.

Rubens Milito Mendonça

Senior Technical Marketing Manager Antenna Business @Huawei

6 a

Muito bem colocado o tema. A impunidade e agressão a qualquer pessoa de qualquer forma deve ser recriminando e punido. Porém, a privacidade e o direito das pessoas de se manterem protegidas de julgamentos ou até mesmo pre-conceitos que surgem devido a forma que os temas são tratados de forma coletiva prejudica e muito nossa necessidade de privacidade.

Fabio Rua

Vice President, Public Policy, Communications & ESG @General Motors South America. Co-Founder @ Brasil, País Digital. Father of four 🤩

6 a

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