Um banco pra chamar de seu
Foi dada a largada para o Open Banking.
E esta é uma excelente notícia para você, cliente.
Ser refém de algumas poucas instituições financeiras como fomos até hoje está com os dias contados. Após a publicação no ano passado da Lei Geral de Proteção de Dados e seguindo o caminho já adotado especialmente pelo Reino Unido, que regulou o novo mercado através da Competition and Market Authority (CMA), por países da União Europeia, onde desde o ano passado entrou em vigor a PSD2 (Payment Services Revised Directive), e por países asiáticos, o Banco Central anunciou recentemente o início da definição das regras do Open Banking no Brasil para que os bancos tradicionais desenvolvam e disponibilizem APIs (Application Programming Interfaces) para integração de serviços de terceiros.
A iniciativa representa uma grande transformação no universo monetário e é mais do que bem-vinda, apesar de ainda suscitar muita polêmica, especialmente no que tange à proteção de dados. A premissa é simples: seus dados pessoais e da sua empresa não pertencem aos bancos, mas a você, cliente.
Posto de uma maneira simples, o modelo permitirá o compartilhamento de informações dos bancos, se autorizado pelos correntistas, com outras instituições financeiras e fintechs, criando um novo ecossistema onde o principal beneficiário será o cliente, pessoa física ou jurídica, que poderá ampliar o acesso a serviços financeiros dentro de um cenário mais competitivo, democrático e inclusivo.
Um relatório da AT Kearney aponta 3 modelos principais de Open Banking: o Interno, nos quais bancos tradicionais desenvolvem suas próprias APIs para criarem seus próprios produtos internamente, continuando como proprietários da distribuição e da interface com o usuário; a Plataforma de Serviços, permitindo que terceiros criem novos produtos sobre a infraestrutura do banco para oferecer a seus clientes; e o Distribuidor, em que os terceiros compartilham com os bancos o acesso aos clientes.
Responsável pela controladoria de uma das maiores empresas de bebidas do País, enfrento todos os dias o desafio de fazer a complexa gestão financeira de um negócio que exige um olhar sempre atento às tendências da economia e muita rapidez na tomada de decisões.
Fazer a conciliação de todas as receitas e despesas, gerenciar o pagamento de fornecedores, definir a política de investimentos e contratar empréstimos não é tarefa para amadores. É preciso muito planejamento e organização para não se perder em meio a milhares de planilhas, boletos, contratos, contas a pagar e receber.
A escassez de oferta de serviços decorrente da concentração acaba por obrigar quem está no comando das empresas a optar por produtos de prateleira, que têm pouca ou nenhuma aderência com as necessidades específicas de cada negócio.
Boa notícia: com o Open Banking, anote aí, seu banco nunca mais será o mesmo. Por que?
A disrupção no setor bancário está apenas começando e já está dando o que falar. Assim como aconteceu em outros mercados, como transportes, varejo, entretenimento, viagens e tantos outros, o nascimento e entrada de novos players no lucrativo e até então concentrado mercado dos bancos é um caminho sem volta. E já está acontecendo em ritmo acelerado, desenhando um novo cenário global em que os bancos não serão mais os únicos donos da bola.
Muitos destes novos players têm origem no mercado digital. Na Ásia os aplicativos de pagamentos já superaram impressionantes 1 bilhão de usuários. Tudo é pago na China pelo WeChat, que muito mais do que um aplicativo de mensageria se tornou uma plataforma de pagamentos, ou pelo Alipay, a ferramenta do poderoso Alibaba. Os indianos adotaram o Google Pay e o PayTM e o país vem consolidando o mobile wallet como principal meio de pagamento.
No mercado norte-americano, as gigantes da tecnologia vêm demonstrando um grande apetite por abocanhar uma fatia do mercado de serviços financeiros, casos da Apple, que lançou um cartão de crédito com o Goldman Sachs; do Facebook, que está seguindo os passos do WeChat para permitir pagamentos pela sua plataforma; e a Amazon, que já oferece uma grande gama de soluções para organizações financeiras e varejistas, uma estratégia cujo objetivo é fortalecer seu próprio marketplace.
O interesse destes novos entrantes está em passar a comandar a última milha no relacionamento com os clientes, passando a ter a acesso a informações valiosas sobre comportamento de consumo. Na medida em que seus braços financeiros assumirem a operação das transações, os grandes varejistas e empresas de tecnologia terão o controle de uma massa crítica de dados sobre os clientes que serão o combustível para ampliar e estreitar o relacionamento em todo ciclo de compra e fidelizá-los.
Além de ser um negócio lucrativo, se transformar em uma empresa financeira ainda traz, de quebra, o ativo mais valioso para qualquer negócio: conhecer profundamente seus consumidores. Com a abertura de suas fronteiras através da implantação de APIs e a análise minuciosa de dados dos clientes, os bancos e as fintechs poderão competir ou fechar alianças para oferecer serviços financeiros inovadores que atendam tanto o mercado B2B quanto o B2C.
Mas é preciso ir com calma. Pouco a pouco, o Open Banking irá fortalecer um novo ecossistema financeiro, que somente será seguro e benéfico aos clientes na medida em que os poderes Executivo e Legislativo definirem as normas para intercâmbio de dados. O poder de controlar as informações será dos próprios consumidores, como já definido na União Europeia pela PSD2. Caberá a eles saber zelar pela segurança e privacidade dos seus dados, definindo com quais instituições deseja se relacionar e compartilhar suas informações.
Com uma menor concentração de mercado, os consumidores que são hoje desbancarizados irão contar com mais alternativas para serem incluídos no sistema financeiro.
Para o mercado corporativo, o Open Banking também irá trazer mais opções de serviços, como uma maior oferta de empréstimos através de novas modalidades de financiamento, plataformas de meios de pagamento, programas antifraude e ferramentas de gestão financeira, o que também irá atrair novos clientes para formalidade.
No final das contas, a abertura irá significar mais clientes para o setor financeiro, o que está chamando a atenção não só de grandes empresas de tecnologia e de outros setores de fora do mundo financeiro, mas também de venture capitalists de olho no explosivo segmento das fintechs.
Segundo estudo da CB Insights, somente no terceiro trimestre de 2018 foram investidos globalmente um total de US$ 5,64 bilhões em 375 fintechs, sendo que a Ásia, com US$ 270 milhões, e os Estados Unidos, com US$ 434 milhões, lideraram o volume de aportes.
Os bancos não vão querer ficar de fora da festa e o mais provável é que sigam investindo pesado em novas tecnologias e na aquisição ou parcerias com startups para que possam estar prontos para assumir a liderança de novas tendências, como Inteligência Artificial, Machine Learning, Robótica, Blockchain, Bitcoin, empréstimos e transações Peer to Peer e Mobile Banking.
De nada adiantou os taxistas protestarem contra a chegada dos aplicativos de transporte. Da mesma forma, não terá efeito tentar impedir o avanço das fintechs e do Open Banking. Aos banqueiros que até hoje desfrutaram de uma lucrativa zona de conforto, resta enxergar a abertura do mercado mais como uma nova grande oportunidade do que como uma nova grande ameaça.
Se de um lado eles poderão perder receita e parte do controle dos dados dos clientes, do outro poderão abocanhar uma saborosa fatia de novos mercados que serão semeados pelas startups. Com certeza, a concorrência irá aumentar. Mas há também muito o que colaborar. Afinal, é inevitável, todo cliente vai querer um banco pra chamar de seu.
(*) Diretor de Controladoria do Grupo Petrópolis, fabricante das marcas de cerveja Itaipava, Petra, Black Princess, Cacildis, Crystal, Lokal e Weltenburger Kloster, das marcas de vodka Nordka e Blue Spirit Ice, do refrigerante it!, dos energéticos TNT e MAGNETO, do isotônico IRONAGE e da água mineral Petra.
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5 aExcelente artigo Marcelo
Gerente de planejamento estratégico | Gestão de recursos, Estudos de viabilidade
5 aTudo o que é novo gera desconfiança, e artigos como este são extremamente importantes na construção de uma cultura nova/diferente.... Abordagem sensacional sobre o Open Banking, Marcelo! Adorei a leitura...