Uma jornada sem fim rumo ao Lean
Faz parte do pensamento humano, quando deparado com um desafio, tentar prever com grande exatidão cada passo que deve ser dado para se atingir um cenário futuro desejado. Uma explicação para esse padrão reside na segurança que um caminho claro, e muitas vez planejado sem obstáculos, confere a uma jornada que se mostra dura quando percorrida. Ficamos confortáveis quando a probabilidade de sucesso é grande!
Você certamente já recorreu a um mapa rodoviário para guiá-lo no trajeto entre duas cidades. Ou até mesmo, já fez uso de mapas digitais disponíveis na internet, que a partir da informação do ponto de destino e origem, mostram com detalhe o caminho a ser trilhado. E, para ser mais moderno, convenhamos que nada é melhor do que usar um dispositivo GPS que atualiza a cada instante a posição onde estamos, a distância que falta até a chegada, avisa quando saímos da rota traçada, além de realizar correções de trajeto devido ao erro causado por um motorista distraído ou uma rua inesperadamente interditada.
Após muitos desafios sabemos que o Lean é uma jornada, que se por um lado não tem linha de chegada, por outro oferece grandes resultados às empresas que desfrutam do percurso.
O que podemos enxergar sobre o caminho trilhado com êxito na implantação do Lean? Existe um método, estágios ou processo para posicionar a empresa na trajetória correta rumo a resultados positivos e sustentáveis por meio do Lean?
Estabelecer uma condição-alvo
Para iniciar uma jornada rumo ao Lean o primeiro passo é determinar a condição-alvo que a empresa deseja alcançar no futuro. Essa condição deve descrever o estado almejado, mas não como você vai chegar nela. Isso porque as pessoas tendem a querer pular para enunciar as soluções, utilizando do chamado “passo do gênio”, onde a solução é conseguida sem uma observação e análise do estado atual. Visto sob outra ótica seria como dar um diagnóstico e prescrever um remédio para um paciente, sem analisar os sintomas e hábitos de vida da pessoa. Qual seria a chance de um insucesso neste caso?
É importante dizer que a condição-alvo não é opcional. Ela se mantém. O “como” atingir é opcional, e nesse ponto podemos tirar vantagem da criatividade e da atitude de “arregaçar as mangas” do ser humano.
Saindo do “modo de implementação” para o “modo de resolução de problema”
Estabelecido a condição-alvo caímos na tentação de querer percorrer o caminho com o auxílio de um plano de implementação formado por uma série de passos, com informações de entradas e saídas pré-definidas. Mike Rother (co-autor de Aprendendo a Enxergar, e Toyota Kata) apresenta uma interessante analogia para que mudemos o nosso “modo de implementação” para um “modo de resolução de problema”.
Segundo Rother, a jornada rumo ao Lean pode ser visualizada por meio da analogia da lanterna. Nela o caminho até a condição-alvo é representado por uma séria de degraus de uma escada, mas onde existe uma escuridão entre onde estamos e os degraus que queremos alcançar. Para nos guiar em cada passo da subida utilizamos da luz de uma lanterna que ilumina até certa distância. Para ver adiante e iluminar os obstáculos no percurso é necessário darmos um passo a frente.
Como a condição-alvo encontra-se além do feixe de luz da lanterna, não é possível prever o caminho com exatidão. O que significa dizer que somente por meio da experimentação é possível conhecer o caminho.
Como podemos entender o significado da lanterna e dos degraus?
A lanterna pode ser entendida como o método científico de formular hipóteses e testá-las a partir da observação direta, enquanto os degraus representam uma série de procedimentos de experimentações que fornecem informações para que um próximo passo seja dado. Esse procedimento foi apresentado aos japoneses no início da década de 50 por W. Edward Deming, e é conhecido como ciclo PDCA (Planeje, Faça, Verifique, Aja).
Aprendizagem contínua
O grande risco do “modo de implementação” é cegar a organização para o aprendizado contínuo que vem com as experimentações provenientes do uso do ciclo PDCA. Um dos motivos que levam ao fracasso no curto prazo do Lean está associado à aplicação das ferramentas sem o estabelecimento de uma condição-alvo e sem uma análise criteriosa da situação atual. Já no longo prazo, quando as pessoas não se sentem desafiadas pela condição-alvo a empresa passa a colecionar melhorias como as obras em exposição em um museu.
Como uma evidência, basta lembrar de eventos kaizen para redução do tempo de troca de ferramentas de uma máquina, no qual após uma grande celebração do time pela redução do tempo conseguido, não ocorre o monitoramento desse tempo, e muito menos a melhoria constante ao longo do ano.
Por outro lado, sabemos quando uma empresa entra no “modo de resolução de problemas” quando as pessoas vêem a incerteza do caminho a ser percorrido com normalidade e sentem-se incomodadas com a ausência de problemas a serem resolvidos.
Assim, desenvolva a sua organização, departamento ou célula de trabalho para entrar no modo de resolução de problemas. Dessa maneira, os novos desafios serão encarados pelas pessoas de modo natural, já que os problemas anteriores serão uma fonte de aprendizagem para fortalecer a musculatura e aumentar a flexibilidade do seu time para as próximas batalhas.
Fábio Alves
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Texto inicialmente publicado em 04/05/2011.