Vamos Falar Sobre Meritocracia?

Vamos Falar Sobre Meritocracia?

Tenho lido diversos textos onde a questão da meritocracia transpassa vários setores da sociedade brasileira. Entretanto, percebo que nossa visão sobre o tema é bastante viesado, gerando uma visão míope do problema estrutural brasileiro.

Todos nós ao nascer, chegamos a este mundo sem nenhuma habilidade nata latente. Não somos capazes, sozinhos, de garantir nossa própria sobrevivência. Interessante que, dentre todos os seres vivos, o ser humano, talvez, seja o que menos tem capacidade de sobreviver sozinho no meio ambiente. No entanto, dominamos o planeta e nos tornamos a espécie hegemônica. A obra do prof. Yuval Noah Harari intitulada “Sapiens – Uma breve história da humanidade” discorre sobre esse tema de forma bastante interessante, valendo a leitura.

De qualquer forma, o ser humano chega a este mundo com nenhum estoque de conhecimento ou habilidade. Então, há medida em que o homem se depara com o mundo, ele é afetado por este, fazendo com que seu estoque de conhecimento aumente, elevando também sua capacidade de analisar, criticar e formar opinião. Uma espiral crescente.

Entretanto, a capacidade cognitiva do ser humano, como é sabida, é a grande consumidora de energia. Precisa ser alimentada para que as sinapses possam ser formadas. Além disso, estímulos cognitivos também fomentam as sinapses, tornando o córtex central mais capacitado para analisar, criticar, formar opinião e, consequentemente, expandir sua capacidade e estoque de conhecimento, que implicarão necessariamente na qualidade das atividades que serão desenvolvidas por este individuo.

Em outras palavras: para sermos capazes precisamos de alimentação e estímulos cognitivos adequados.

Quando falamos em “meritocracia” deveria ser subentendido que as pessoas tiveram o mesmo acesso à alimentação adequada, alimentação esta que ajudará na formação óssea, muscular e cognitivas de seus corpos. Subentende-se também que aqueles indivíduos forma estimulados cognitivamente de modo a desenvolver os múltiplos aspectos da inteligência: (i) inteligência linguística; (ii) Inteligência Motora; (iii) Inteligência espacial; (iv) Inteligência musical; (v) Inteligência interpessoal; (vi) inteligência lógica; e (vii) Inteligência intrapessoal.

Obviamente que, diante das desigualdades presentes na sociedade brasileira desde os primórdios da colonização portuguesa, partes da sociedade tiveram os estímulos educacionais adequados aliados a uma alimentação de qualidade. Foram estimulados a analisar, criticar, formaram opinião, expandiram a sua capacidade cognitiva melhorando o seu desempenho. A questão que surge aqui é: e a maioria dos brasileiros que não tiveram todos esses insumos?

Discutir meritocracia num ambiente onde parcela significativa da sociedade é mal alimentada e educada se configura numa das maiores covardias e injustiças que se pode fazer contra um povo, uma nação. A formação e desenvolvimento do cérebro se dá principalmente até os 7 ou 8 anos de idade. Pessoas que não receberam alimentação e estímulos adequados até essa idade, correm sério risco de terem suas capacidades cognitivas limitadas, o que dificultará sua capacidade de aprendizagem, impactando diretamente no seu desempenho produtivo e criativo.

O saneamento básico precário também é vilão. Em pleno século XXI, existem milhões de lares brasileiros que não são atendidos com água potável ou tratamento de esgotos. Doenças de veiculação hídrica como o Cólera, contribuem em muito para reduzir a capacidade cognitiva dos seres humanos. Na luta pela sobrevivência, pensar é um luxo. Na tentativa de manter o corpo vivo, a capacidade cognitiva fica em segundo plano. Novamente, crianças que são frequentemente infectadas por doenças causadas pela ausência de saneamento básico terão poucas chances de se desenvolverem.

Então, antes de discutirmos meritocracia, o que devemos discutir é uma escola pública integral, que permita ao menos 5 refeições diárias. Escola essa que estimule os 7 aspectos da inteligência, com ensino e prática de esportes, música, teatro, artesanatos. Uma escola que promova, desde cedo o senso de honra, o senso de competitividade através de concursos intra e extra escolares de modalidades artísticas, de dança, esportes, matemática, poesia, etc.

Uma escola que fique aberta aos fins de semana, para serem centros de entretenimento para os alunos, retirando das ruas as crianças e jovens. Minimizando a chance de serem cooptados pela marginalidade que oferece ganhos efêmeros.

Assim, após duas ou três gerações, poderemos discutir meritocracia entre pessoas que foram estimuladas e alimentadas igualmente. Pessoas capacitadas para discutirem e direcionarem o seu futuro. Pessoas com senso de honra e justiça, competitivas, que não admitirão que pessoas mal intencionadas ditem seus rumos.

Nesse dia, eu adorarei discutir meritocracia. Enquanto esse dia não chegar, permaneço apontando as covardias.

André Brown




Karina Albuquerque

Supervisora de laboratório de controle da qualidade na Casa da Moeda do Brasil - CMB

6 a

 Já havia lido um tempo atrás, mas não tinha comentado e nem curtido. Fazendo os dois agora rsrsrs Acerca do segundo parágrafo, vou tentar recuperar um artigo sobre uma descoberta recente, de como os homo sapiens foram responsáveis diretos pela extinção de outros hominídeos(sim, na base do extermínio proposital mesmo), apenas a título de curiosidade. Além de tudo que foi exposto, também gostaria de complementar com outro viés da nossa sociedade: a hiper valorização de certas áreas do conhecimento em detrimento de outras, como é explicito na diferenciação dos campos do saber em ciências humanas e ciências exatas. E ainda, dentro dessa classificação abrangente, existem ainda a valoração dentro das áreas mais especificas. O que acha André?

Gilber Terzi

Engenheiro Mecânico | Gestor de Facilities (Facility Manager) | Gestor Predial | Gestor de Manutenção

6 a
Nei Junior

Analista de comércio exterior

6 a

Perfeito mestre !!!

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