VERTICALIZAÇÃO DA SAÚDE SUPLEMENTAR
VERTICALIZAÇÃO DA SAÚDE SUPLEMENTAR
Com mercado de aquisições aquecido, tendência seguirá em expansão nos próximos anos, ressignificando o papel da tecnologia nas organizações
A verticalização da Saúde Suplementar brasileira está aquecida. O modelo de atuação com foco em redes próprias de hospitais teve início na década de 1980, mas se expandiu de forma acelerada em 2019 com uma nova característica: a aquisição de pequenas e médias operadoras em todas as regiões brasileiras, em um movimento de ida às compras que, muitas vezes, envolve aportes estrangeiros e cifras bilionárias.
Esse movimento de verticalização na Saúde está criando megaoperadoras, com carteiras de milhões de vidas e sinistralidade média de 60%, ou seja, 20% a menos que as tradicionais operadoras.
A concentração é apresentada como uma possível solução para lidar com o crescente custo assistencial - preocupação válida em um País no qual somente 30% dos habitantes, em média, têm acesso a planos de Saúde. Ou seja, há espaço para expansão dos serviços privados.
Mas, nesse cenário, há sustentabilidade para todo o sistema de Saúde a longo prazo?
O primeiro ponto de reflexão a respeito desse questionamento está no papel que hoje assumem as Santas Casas e hospitais filantrópicos dentro do sistema de Saúde brasileiro. Responsáveis por 50% das internações do Sistema Único de Saúde (SUS), essas instituições correm o risco de perder sua fatia de receitas das operadoras privadas, hoje já comprometida com endividamentos, o que cria um grande desarranjo no setor público, cujos recursos estão escassos.
Outro ponto de atenção reside no alerta da Confederação Nacional de Saúde (CNS), que já manifestou sua preocupação com o impacto do modelo. Na visão da entidade, a verticalização em Saúde tira a opção de escolha do consumidor, restringe a livre concorrência e pode levar a uma concentração de mercado que estimula o aumento de preços e a diminuição da qualidade assistencial.
Essa preocupação tem sua lógica, afinal, um dos principais motivadores da gestão verticalizada é o maior controle dos custos da assistência, o que pode mexer na sustentabilidade do modelo a longo prazo. Mas o ponto crucial do controle dos gastos de qualquer organização de Saúde deve estar no combate ao desperdício. Em um setor que historicamente tem muito desperdício, podendo chegar a 30% de tudo o que gasta, é a incorporação de tecnologias da informação que traz mais eficiência, aumenta a qualidade dos serviços e, consequentemente, a competitividade.
Soluções como prontuário eletrônico do paciente (PEP) integrado a sistemas de gestão e de atendimento da rede promovem uma visão ampla sobre o caminho do beneficiário dentro do sistema de Saúde Suplementar. Essas tecnologias permitem a geração de indicadores - como tempo médio por atendimento, período gasto em filas e outros - que auxiliam a gestão a tomar medidas para melhorar a eficiência e a qualidade do atendimento. Nesse modelo, a diminuição do custo é uma consequência da excelência dos serviços.
Do lado das operadoras, para que a busca pela redução de custo não signifique perda de qualidade e, consequentemente, de competitividade, elas precisam investir imediatamente no cuidado da saúde, com atenção primária e foco no bem-estar dos indivíduos. Devem, ainda, adotar modelos de medicina por evidência e protocolos clínicos aceitos e referendados. Esses instrumentos existem para diminuir ao máximo possíveis perdas de eficiência na prestação do serviço, como, por exemplo, condução confusa do paciente no ambiente hospitalar, exames não recomendados e permanência além do necessário.
Já os hospitais privados e também os filantrópicos devem se reinventar para não perderem espaço. Isso significa trabalhar sob uma ótica com foco na qualidade de vida, não mais no tratamento das doenças. Da mesma forma que na rede verticalizada, aqui também a tecnologia tem como papel promover mais eficiência e eficácia à assistência, possibilitando um cuidado integrado - que é crucial para reduzir intercorrências e, consequentemente, entregar mais valor.
O mercado pode esperar que o movimento de verticalização siga em expansão no Brasil nos próximos anos. O que não pode esperar é que ele seja conduzido com o único objetivo de reduzir custos, com pouca ou nenhuma preocupação com o principal interessado nesse cenário: o indivíduo que precisa dos serviços de saúde e que deve estar no centro do cuidar.
Dr. CARLOS ROBERTO R. PEREIRA
GESTÃO DE RISCO EM SAÚDE