Vitória de Pirro
Assim deve acabar a greve dos caminhoneiros! Todos devem comemorar ao mesmo tempo que chorar as perdas e, principalmente, a catastrófica situação estrutural do País...
15 dias foi o prazo para uma definição final à esta crise de desabastecimento originada pela greve dos caminhoneiros, após um acordo entre esta classe e o governo, diante de alguns ganhos pelos quais brigavam, apesar de que, a questão principal que se buscava (a de eliminar o PIS-COFINS sobre o diesel) ainda não foi conquistada e é bem provável que nem se consiga. Talvez, no máximo, uma redução do percentual, o que não deixa de ser um ganho para os profissionais deste serviço.
Contudo, o que há de se considerar de ganho real com estas manifestações, além dos 12 itens descritos no acordo, é ter conseguido em tão pouco tempo enfatizar 3 tópicos de grande relevância e impacto na vida de todos: 1- demonstrar a força dos trabalhadores, de forma apartidária e sem interesses políticos e pessoais, por algo que pode trazer benefícios para toda a sociedade; 2- enfatizar a crise gerada e o alto custo da corrupção sobre a economia que acaba sendo paga por todos os trabalhadores e empresas; e 3- evidenciar a falta de infraestrutura logística do País, que dificulta e encarece as movimentações de carga, restringindo fortemente a competitividade das empresas e do próprio País diante do chamado custo Brasil.
Dentre estes três tópicos, destaca-se para o objetivo deste artigo o terceiro...e é justamente por esta realidade que deve ser corrigida a colocação de que a crise de desabastecimento que se vive neste momento foi causada pela greve dos caminhoneiros. Não! A greve dos caminhoneiros, assim como o próprio desabastecimento das cidades são consequências. Consequências dos altos custos dos insumos para o transporte rodoviário e da falta de investimentos em estrutura logística para escoamento da produção e circulação de mercadorias, dentro do País ou para importação e exportação, não favorecendo a movimentação de carga por outros modais, tendo o Brasil tanta capacidade (e necessidade) para desenvolvimento do transporte ferroviário e marítimo de interior e cabotagem, sem falar no aéreo e dutoviário.
Não é de hoje que ocorrem fatos de problemas com movimentação de carga pela questão de falta de estrutura, como grande tempo de espera de navios para carregamento e descarga nos portos por conta de grandes safras em períodos chuvosos, ou quando em 2014 todo o estado do Acre ficou desabastecido porque o único meio de acesso dos principais suprimentos é via rodovia, que ficou inundada por vários dias impedindo a passagem de caminhões. Sem contar nos corriqueiros fatos de acidentes em rodovias, que muitas vezes geram perdas financeiras para todos os envolvidos.
Para ilustrar essa realidade brasileira, pode ser citado o ranking do índice de desempenho logístico divulgado em 2014 pelo Banco Mundial, que apresenta o Brasil em 65º lugar, como também o ranking de competitividade de 2016 apresentado pelo Fórum Econômico Mundial, estando o Brasil em sua pior posição desde 2007, com o 81º.
Não vale a pena discutir neste momento se essa situação foi provada por decisões de investimento equivocadas ou por interesses políticos bem definidos, que vem de anos e anos, mas que é extremamente necessário que este posicionamento seja redirecionado para o desenvolvimento logístico, pois para evitar novas situações como estas de desabastecimento e greves, muitos esforços e investimentos devem ser realizados na logística brasileira para que seja possível uma efetiva redução do preço dos insumos para movimentação de carga, maior produtividade nas atividades logísticas e menor risco e custo para os produtores, empresas e consumidores, já que todo o País e sua economia perdem com isso.
Essa greve trouxe grandes perdas...perdas para as empresas que deixaram de faturar por não conseguir suprimentos para atender seus clientes, consumidores que ficaram sem produto e muitas vezes pagaram mais caro para comprar o que se precisava, hospitais e serviços de saúde em estado de alerta, entre tantos outros prejuízos financeiros e qualitativos... mas deve ser enfatizado também que os próprios caminhoneiros perderam muito nestes 5 dias parados, o que representa um período significativo de ganho, uma vez que a grande maioria deles ganham por viagem e volume de produtos carregados, e ainda assim abriram mão destes ganhos para brigarem por uma condição mais justa do seu principal e mais custoso insumo.
Antes de finalizar este artigo, deve-se ressaltar só mais um ponto crítico ainda não abordado: o comportamento e a preparação das empresas diante de situações como esta. Uns dizem que não havia o que fazer, outros acham que greves, chuvas e outros eventos fora de seu controle são as causas das perdas e redução do nível de serviço. Contudo, precisa ser observado que uma greve como esta não ocorre da noite para o dia e normalmente vai ganhando força e se espalhando para outras regiões a partir do seu início. Isso quer dizer que as empresas têm um certo tempo, mesmo que em alguns casos seja curto, para se preparar para as consequências da greve, evitando maiores prejuízos, maiores custos e reduzir os riscos de não atendimento a clientes.
Porém, para isso é preciso que a empresa e seus gestores estejam atualizados e preparados para tomadas de decisões que direcionem ações de contingência e que seus processos sejam flexíveis para mudanças rápidas, se ajustando para um novo cenário temporário. Um processo logístico direcionado a resultados e à estratégia da empresa, assim como a capacitação da equipe, favorecem essa flexibilidade e à adaptação para suportar momentos de crise com menos perdas e maior segurança.
Por fim, fica então o reconhecimento aos esforços dos caminhoneiros, que apesar das perdas que eles e toda a sociedade tiveram com este movimento, conquistaram o que pode ser considerada uma vitória autêntica de todos.