Elisama Santos - Entre laços

Por Elisama Santos

Elisama Santos é psicanalista, educadora parental, escritora, palestrante, mãe de Miguel, 9 anos, e Helena, 7. Autora do livro "Educação não violenta"

 


Talvez esse seja um dos textos mais difíceis que já escrevi aqui. Escrevo com nó na garganta, num misto de desabafo e esperança de que o futuro nos reserve dias melhores. Comecei a minha coluna na CRESCER falando de questões raciais. Até que eu quis falar de outros assuntos: de relacionamento, de brincadeira, de festinha. Eu não queria que a minha cor definisse o que posso ou devo escrever, eu queria diversificar os assuntos. Acontece que, para pessoas negras no Brasil, o racismo não dá descanso. A gente quer esquecer o tema e viver outras coisas, mas ele volta angustiando, doendo, machucando. A gente quer esquecer dele, mas ele não esquece de nós.

Elisama Santos: "Negros não sentem prazer em falar sobre racismo" — Foto: Crescer
Elisama Santos: "Negros não sentem prazer em falar sobre racismo" — Foto: Crescer

Meu marido e eu decidimos que, no ano que vem, vamos mudar as crianças de escola, e essa decisão tem mexido comigo. A escola costuma ser um ambiente opressor para crianças negras. É na escola, em regra, que sentimos na pele a distância entre o padrão e quem somos. Que as nossas capacidades intelectuais são desacreditadas, que a nossa aparência é ridicularizada, que escutamos coisas que nos marcarão para sempre. Eu achei que havia superado as dores da vida escolar. Que agora, com superior completo, duas pós-graduações, sete livros publicados e quase 40 anos eu já não carregava qualquer mágoa ou dor desse passado. Mas, a cada sessão de terapia, os medos pelo que pode acontecer com os meus filhos me fazem lembrar o que vivi e percebo que há camadas cada vez mais profundas nessa dor.

Eu queria que essa decisão fosse mais simples. Pensar na pedagogia, no espaço físico, na proximidade. Queria me preocupar apenas com o trânsito, o valor da mensalidade, os banheiros limpos. Eu queria que observar as questões raciais fosse opcional, como o é para as mães e pais brancos. Mas eu preciso de mais. Quantos alunos negros estão na sala? Quantos professores e professoras negras há na escola? Como ela lida com os casos de racismo? Como são as famílias? E, por mais que as respostas estejam corretas, eu ainda duvido que a teoria e a prática estejam realmente alinhadas.

À medida que a mensalidade aumenta, a quantidade de pessoas da minha cor diminui. A solidão aumenta junto. Ofertar melhores condições de ensino para as minhas crianças negras significa torná-las cada vez mais solitárias em suas salas de aula. Me alegro descobrindo que minha filha terá outras três crianças da cor dela. TRÊS. Que triste ter de me contentar com tão pouco.

Escutar a cria repetir frases que ouvi há 30 anos rasga o coração”
— Elisama Santos

Consolar o choro de uma cria que acaba de sofrer racismo é uma das situações mais dolorosas que uma mãe pode viver. Escutá-la repetir frases que ouvi há 30 anos rasga o coração. Tantos anos se passaram. Tantos. A criança que fui chora em mim enquanto a consolo. Escolho uma escola pensando em redução de danos. Me esforço para lembrar que os meus filhos têm uma consciência que eu não tinha, uma autoestima que nunca construí em mim, um apoio que os meus pais não sabiam me dar. Luto por um mundo melhor, por escolas verdadeiramente inclusivas, mas, de verdade, queria mesmo não precisar lutar. Queria, de vez em quando, só existir. Que pena que ainda não seja possível.

Elisama Santos é psicanalista, educadora parental, escritora, palestrante, mãe de Miguel, 8 anos, e Helena, 6 (Foto: Divulgação) — Foto: Crescer
Elisama Santos é psicanalista, educadora parental, escritora, palestrante, mãe de Miguel, 8 anos, e Helena, 6 (Foto: Divulgação) — Foto: Crescer

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