Nos Estados Unidos, os 200 maiores franqueados operam 33 mil lojas e faturam cerca de US$ 43 bilhões, o equivalente a R$ 270 bilhões de reais - R$ 30 bilhões a mais que a receita das redes de franchising no Brasil em 2023. “Ainda estamos longe da realidade americana, porém, atravessamos um momento de transição importante”, afirma Denis Santini, CEO da CommUnit. “A grande sacada é a mudança de papéis. Antes o franqueado crescia e queria virar franqueador. Hoje não, quanto melhor e mais profissional o franqueado, melhor para a rede e para o setor”.
A mudança é tão significativa que investidores começam a olhar os resultados dos multifranqueados profissionais. “O Brasil conta com grupos donos de operações com índices de governança, compliance e resultados muitas vezes melhores do que o de muitas franqueadoras”, afirma José Carlos Semenzato, fundador da holding SMZTO, com 15 marcas no portfólio, que juntas movimentaram R$ 8 bilhões em 2023. Ele prevê que, num futuro próximo, haverá um movimento de fusões e aquisições com foco em multifranqueados, além de investimentos de fundos de médio porte e family offices.
Segundo estudo da CommUnit, existem 58.149 franqueados no país (até outubro de 2023), destes, 31.270 têm uma única franquia e 179 comandam mais de 50 unidades. Nas estimativas da Associação Brasileira de Franchising, 83% das redes (2.700) possuem multifranqueados, que respondem por 30% das operações (57.412).
É o caso de Erik Cavalhieri, à frente de 28 franquias das marcas O Boticário, Quem disse, Berenice?, Sunglass Hut e Eudora. “Os movimentos de fusões e aquisições, assim como a ida da indústria ao varejo, são observados de perto por quem opera bem”, afirma. “Mas não basta querer. É da franqueadora a palavra final se abrirá ou não oportunidade de expansão.”
Às vezes é preciso insistir. Foi o que fez Leandra Priante em 2011, quando decidiu abrir uma franquia da 5aSèc em Belém do Pará. “Como não havia expansão territorial, preparei um estudo detalhado provando a eficiência de se investir em maior capilaridade, uma vez que o consumidor busca conveniência”, lembra. A estratégia deu certo. Hoje comanda 14 unidades, com faturamento anual de R$ 7 milhões. O desafio, diz, é manter o padrão em todas as lojas, o que exige a criação de uma boa estrutura de back office. “Temos 50 colaboradores que atuam em quatro frentes: financeiro, RH, comercial e controller”, observa, acrescentando que é preciso conhecer as entrelinhas da operação para saber a hora certa de crescer.
A opinião é compartilhada por Wesley Masterson, dono de sete franquias da rede de saúde Clínica da Cidade. “O início é sempre difícil. Vendemos nosso apartamento para comprar a primeira franquia. As outras vieram com o tempo, sempre com segurança e os pés no chão”, diz. Segundo ele, uma das vantagens de ser multifranqueado é a possibilidade de enxergar mais rápido tanto as vulnerabilidades quanto as oportunidades.
Cabe ao franqueador analisar quem na rede tem perfil para ser multifranqueado, porque nem todo mundo está preparado, mesmo tendo capital. “O franqueado pode ser excelente para uma loja, onde ele é o faz tudo”, diz Jae Ho Lee, CEO da Morana, com 300 franquias e média de 2,7 unidades por franqueado. “Quando passa a ter quatro, cinco lojas, precisa ter outras competências, como liderança e gestão”. Deixa de ser gerente de loja para ser um operador de rede.
Para Clodoaldo Nascimento, presidente da ABF Rio, o avanço dos grupos de multifranqueados é resultado da profissionalização do setor e de uma agenda positiva, que se traduz em lucratividade e incentiva o crescimento. “Apesar dos bons resultados, ainda há marcas que temem ter franqueados com muitas unidades”, afirma. “Franqueadora e franqueado têm de crescer juntos e, muitas vezes, isso acende um sinal de alerta.”
O multifranqueado ao mesmo tempo que tem know-how e alavanca o crescimento da rede, ganha autonomia. “Ele se transforma num parceiro de negócio que participa da mesa de negociação”, diz Cristy Martins, diretora da comissão de franqueados da ABF. “Isso traz benefícios como a disseminação das melhores práticas na rede e segurança de expansão com a mesma base. Porém, exige sabedoria para equilibrar autonomia e controle, a fim de manter a padronização da marca e dos serviços.”
Não ter estrutura para atender a demanda desse perfil de franqueado é, na visão de Sedi Novaes, multifranqueada das redes CNA e Maple Bear, um dos principais entraves para o crescimento. “Um dos gargalos das franqueadoras é não conseguir ‘clusterizar’ os multifranqueados”, diz. “A maioria não encontrou a fórmula certa, sobretudo em relação à consultoria, submetendo o grupo à treinamentos de baixa assertividade”. A empresária participa de 8 das 16 franquias da família, fazendo a gestão de 6 e como investidora em 2.