A experiência para reduzir desigualdades
Cena de O Preço do Desafio, filme que conta a história real de Jaime Escalante. O professor boliviano mudou a vida de centenas de estudantes pobres nos Estados Unidos, na maioria de origem latina, ensinando-lhes Matemática Avançada quando ainda estav

A experiência para reduzir desigualdades

Publicado originalmente em NSC Total.

O Brasil tem professores bem capacitados, com a motivação certa e contam com bons ambientes de trabalho, em escolas que valorizam a inovação.

Em seus anos formativos, a grande maioria dos docentes (83%) estudou sobre os conteúdos que ensina, aprendeu pedagogia e adquiriu técnicas de ensino. Quase todos (95%) são motivados principalmente pela oportunidade de influenciar o desenvolvimento das crianças e contribuir para a sociedade. Além disso, 80% garantem contar com o apoio de seus pares e 94% dizem ter um bom relacionamento com os estudantes.

Foi o que apurou a TALIS (sigla em inglês para a Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem, coordenada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico — OCDE, que entrevistou profissionais da educação e analisou dados do setor de 45 países.

O estudo também indica que o Brasil tem um bom número (67%) de profissionais com mais de dez anos em sala de aula, mas que os aloca mal. No artigo anterior desta série vimos como a distribuição de docentes experientes se relaciona com o desempenho estudantil em avaliações internacionais.

Por que isso acontece?

A alocação de talentos nas escolas públicas não resulta do encontro de necessidades e recursos. De um modo geral, as complexidades sociais dos estudantes de bairros mais pobres não são atendidas pelos professores que mais estudaram e com mais tempo em sala de aula. E há pouco que o gestor da pasta da educação possa fazer a respeito.

Em Joinville, por exemplo, a lei determina que para ocupar uma vaga em uma escola da rede municipal a pessoa interessada seja concursada e devidamente habilitada para a posição. Se houver mais de uma candidata, terá preferência a que vencer a prova de títulos e somar mais tempo como servidora pública.

O último da fila pega a última vaga. A seleção não considera o desempenho pregresso do profissional, como seu perfil dialoga com a proposta pedagógica da escola em que pretende trabalhar, ou com a condição socioeconômica dos estudantes por ela atendidos.

Tempo de casa e titulação são também os critérios usados para o aumento da remuneração dos docentes da rede pública. É de se imaginar que os que recebem melhores salários vivam em bairros com melhor nível socioeconômico e que a maioria prefira trabalhar em escolas próximas de suas casas. Faz sentido para o indivíduo e imagino que o objetivo do legislador tenha sido valorizar o profissional sênior que investe em sua formação.

Entretanto, o efeito colateral dessa estrutura é que ela prejudica o acesso dos alunos mais pobres aos professores mais tarimbados. Como a experiência do docente é um importante recurso para a superação dos obstáculos socioeconômicos ao aprendizado, fortalece-se a tendência de desempenhos baixos e desigualdades altas. Coletivamente, reproduzimos resultados contrários aos que queremos. (Saiba mais em O que deve ser feito para crianças e adolescentes aprenderem bem o que é mais importante?)

Os poderes executivo e legislativo precisam conjugar seus esforços com as forças da sociedade mais relevantes ao assunto para encontrar maneiras mais inteligentes de propiciar ao docente o reconhecimento que lhe é devido e, ao mesmo tempo, garantir uma estrutura jurídica que permita os gestores da educação pública possibilitar aos estudantes dos níveis socioeconômicos mais baixos o acesso aos melhores e mais experientes professores.

Especificamente, em Joinville, devemos rever as normas do processo de habilitação de carga horária dos professores estabelecidas pelo Decreto Nº 33.045, de 13 de novembro de 2018.

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