Os jovens e o ostracismo
O que me faria querer sair de casa para viver uma experiência universitária?
Quanto de adicional salarial seria necessário para que eu fosse trabalhar em um escritório?
Perguntas feitas com certa regularidade por jovens que sempre viveram os desafios do "para casa". Não fossem os reforços nas escolas, as monitorias ofertadas, muitos não teriam iniciado a lista de tarefas que só valia 2 pontos na Etapa. Há tempos, as apostilas do ensino fundamental e do ensino médio não gastam nem borracha, tão menos o lápis.
A autonomia de processo de formação, permeada pela incentivo da meritocracia não foi suficiente para favorecer a disciplina do "homework" que não chegava a ser um "to do" efetivo na realidade escolar. E, na hora de ingressar no ambiente universitário, a janela que se abre é a do Teams, com uma promessa de interação que fica restrita ao uso do chat, quando acontece, suportada pela discrição costumeira.
Na conveniência do espaço, o mesmo jovem busca um estágio que seja home office. Uma entrega que permita a interação mediada pela tecnologia, evitando o desgaste do deslocamento, a experiência da marmita ou o desafio do tempo, diante da expectativa de que será possível ter tempo para ir a academia, praticar o hobby e relacionar com as pessoas que realmente importam.
Mas... os dias passam e as metas de socialização vão se tornando cada vez mais desafiadoras. A urgência do trabalho, a procrastinação aos estudos, o desafio de manter-se atualizado com os acontecimentos do ambiente de trabalho não dão tempo para a vida ideal.
E quando estar com quem importa acontece, bate um cansaço, uma queda de energia, uma dificuldade de achar interessante o tempo com alguém, o desafio da fila do fast food, a constatação de que vale a pena fazer compra on-line a ter que viver o desgaste de levar o empurrão de um carrinho no supermercado, abaixar para procurar uma mercadoria, comparar preços que não estão claros, colocar as compras no balcão, empacotar, pagar estacionamento, levar para o carro, subir as escadas, tirar das sacolas e armazenar. Viva o Ifood.
Quando a Universidade oferece a possibilidade de realizar a disciplina presencial, a tentação por fazer mais disciplinas EAD e on-line é insuportavelmente irresistível. O pensamento de que o deslocamento pode durar muito tempo, os colegas podem não ser legais, o professor pode ser pegajoso e cheio de retórica sem ser possível passar na velocidade 1.5x beira uma crise de pânico que logo cessa pela sensação de estar alojado na cadeira confortável de gamer. Um pensamento que só consegue ser vencido porque a opção presencial concentra as 4 aulas em uma única noite, e se mostra menos insuportável após 8 horas de tela no trabalho.
Nem banho de vitamina D, nem banho de lua... sem necessidade de acompanhar os colegas pelas ruas da cidade pelo senso de coletividade que dissipa os riscos do percurso. Apenas biblioteca digital. Sem DA, sem totó, sem calourada ou formatura. A vida acadêmica vai se arrastando sem uma clara percepção da frustração experimentada.
Jovens que tinham muito por fazer, mas se rendem ao mais prático e conveniente! Os jovens que tiveram as mamadeiras esterilizadas no microondas, o fogão utilizado para fazer miojo, e as tantas peripécias culinárias da Air Fryer seguindo as dicas dos Reels. Amo comidas instantâneas e as facilidades eletrodomésticas!
O jovens que atuam em postos de trabalho que não suam a camisa, e que nem tem interesse pelo pão por ter glúten. Jovens que buscam entender a linguagem figurada de Gênesis 3:19 ... do suor do teu rosto comerás o teu pão! Eles suam os neurônios, se esgotam mentalmente, superaram os enciclopedistas em nível de informação e observam os desafios das soft skills. A geração da sensibilidade, que por vezes é confundida com sustentabilidade.
Os jovens que iniciaram a faculdade na pandemia, não tiveram a oportunidade do contato inicial, da calourada, dos churrascos da turma, das saídas após a aula. Os jovens que já acessaram informações em densidade superior a qualquer filósofo, que praticam um consumo informacional sem fronteiras territoriais, mas que estão contidos a espaços de trabalho com baixa interação criativa. Liderados pelos que se amedrontam em buscar sua própria carreira e insistem em manter uma presencialidade excessiva para dar conta das neuras coletivas, aqueles que se impõe como guardiões da cultura organizacional e das longas reuniões, mesmo que pelo Zoom ou pelo Teams.
O Jovem? Ele se confronta com uma decisão de disparidade entre ter o vínculo empregatício ou ficar dois anos sem rendimentos, mas com muitas oportunidades de acesso aos coworkings, pela perspectiva empreendedora.
Um jovem sustentável que receia em dar grandes passos e não conseguir ter o ideal de família tão abordado nas sessões de terapia. O peso da responsabilidade, o medo de não alcançar o padrão desejado (acima da curva), se vê assoberbado e acaba por render tempo a distrações do dia a dia, favorecendo a procrastinação, a ausência de mudança e a certeza de que pelo menos o que eu tenho, eu garanto.
Mas, ao acessar o ambiente universitário e me deparar com uma turma do quarto ano de engenharia, naquele típico curso em que os irregulares são a maioria, encontrei jovens que estão buscando alternativas para conter energias e escolher as matérias que possam dar a garantia de aprovação. E neste momento, quando a grade precisa encaixar a carga horária necessária de tópicos para formar... vem a pergunta sobre o motivo da Universidade não ofertar aula na sexta-feira a noite, no presencial. Verdade que esta também é a pergunta dos vários bares e restaurantes que deixaram de receber os alunos após as aulas. Uma formação complementar importante, que garante a socialização entre os jovens!
Entrei na sala, poupei os 10 primeiros minutos para sentir a turma e ouvi um comentário na conversa entre os alunos: _Início de semestre... vai ser uma hora só pedindo pra gente se apresentar! Esperei mais um minuto e dei início à prosa. Vamos falar de... porque é importante para... e tem este impacto na sua carreira profissional. A chave da atenção aconteceu quando perguntei: _O que você acha que vai te levar de 5 salários mínimos a R$ 30.000? _O que as pessoas que estão com este salário de R$ 30.000 tem em comum? Pronto! Agora o conteúdo era importante, fazia sentido!
Mas, depois de uma hora falando com vontade... uma pessoa balbuciou um comentário. Ouvi e completei a frase tímida. Ela tomou coragem e continuou com a conexão! Comecei a baixar o tom de voz a cada resposta até que a sala começou a interagir. Eles não falavam comigo, eles interagiam com os colegas! Abordavam assuntos aleatórios, talvez sobre o que eles estavam enquanto eu falava ;).
Enquanto a conversa aumentava, passei pelas fileiras, esbarrando, fazendo contato visual, permitindo o contato físico com o toque no ombro, o comentário sobre algo aleatório. A turma ativou sem nenhuma proposta de conteúdo. Eles estavam de volta! Retomei e rodei mais 20 minutos. Garanti a chave do aprendizado do dia e fomos para o intervalo.
Uma turma tentou sair discretamente para não ofender pelo não retorno no segundo horário. Outra turma abordou diretamente, e perguntou se teria chamada. No retorno do intervalo, a abordagem foi diferente! Os que ficaram fizeram entregas.
Falaram comigo e para a turma. Trouxeram suas frustrações permeadas pelas expectativas que não foram correspondidas. Jovens que a princípio estavam silenciosos fizeram perguntas sobre o sentido, a lógica, a percepção, e queriam saber as minhas crenças sobre o cenário organizacional e também sobre os desafios da carreira.
Professora, meu chefe pede para fazermos reuniões regulares por estarmos no remoto, mas quando eu terminei de dar o relatório nesta semana, ele disse que não tinha ouvido nada porque estava no Instagram. Ele não está atento às minhas demandas, que limitam o desempenho no trabalho! O que faço, com quem interajo?
Outro trouxe a informação que demitiram 500 pessoas na empresa nesta semana e disseram que era por ajuste. Mas, professora! As pessoas estão comentando que a empresa vai fechar...
A jovem que tinha experiência em consultoria, pelos trabalhos que tem desenvolvido foi contar sobre as dores que tem percebido na condução dos negócios, o desafio que os gestores tem em adotar ferramentas e metodologias convergindo para o alcance de resultados.
Interagindo, ponderando, abordando o conteúdo chave da aula, eis a palavra mais antiga e que ecoa nas entrelinhas deste cenário => Management 3.0. Mas, transcrevendo para termos... "de quando sua avó era jovem", SUPERVISÃO! Olho no olho, cara-crachá, feedback... EU VEJO VOCÊ, estamos juntos para alcançar este resultado. Interação homem-homem mediada pelas condições dos recursos homem-máquina. Subsidiariedade!
Agora... o jovem que consegue entrar no ônibus lotado, enfrentar o metrô, e chegar no horário para os compromissos... com certeza é um jovem mais autoconfiante, determinado e que tem consciência de quantas pessoas ele ainda precisa apoiar para melhorar o dia dele.
Continuo me indagando sobre os motivos, as causas internalizadas que levam o jovem a se distrair do "mundo real" para viver o ostracismo social. Um cenário muito atraente para os que não tem medo de viver consigo mesmo! Mas... será que eles tem tido condições dignas de viver esta experiência?
Qual tem sido de fato o incentivo para as pessoas estarem presentes nos espaços, promovendo interações se o ambiente do encontro se revela em um impetrante silêncio para ouvir algo que eu poderia ter escutado em 1.5x?
A sala de aula silenciosa, com o homework em grupo a ser feito em outro momento parece ser uma condição cruel à abordagem com jovens, nos dias atuais. Mas, como garantir que o empregador passe no corredor e perceba que estou dando aula? Ou até mesmo... que o jovem supere seus pressupostos e me avalie bem no instrumento institucional?
Vou voltar e ler alguns parágrafos... no presencial ou no EAD, eu vejo você, estamos juntos, estamos criando uma experiência única e colaborativa! Mas... ainda precisamos criar novos rituais, formar repertórios sobre novas formas de vivenciar os encontros para a aprendizagem.