Por uma economia centrada na vida e na regeneração do humano que há em nós

Há quase 20 anos abri minha própria empresa para empreender e prestar serviços de consultoria. Ao escolher o nome que daria a ela, queria que fosse algo com significado para além do meu próprio nome, que remetesse ao propósito maior da minha atuação. Depois de muito pesquisar me deparei com a palavra Zoé, do grego, que significa Vida. Dar vida a novos projetos, ideias, empreendimentos. Inovar a vida. Zoé Inova. Pronto. De lá para cá passaram-se muitas vidas, das quais muito me orgulho. Iniciativas que tive o privilégio de empreender, apoiar, inspirar ou estruturar. Por conta da minha relação com projetos socioambientais e populações tradicionais, muitos pensavam que o Zoé vinha do povo indígena Zo’é, que vive nas florestas do Estado do Pará, ao norte do Rio Amazonas.

Convivi com esta pergunta por muitos anos, até que em 2022, ao visitar a magnífica exposição “Amazônia” do fotógrafo Sebastião Salgado, pude conhecer um pouco mais sobre esse povo e seu nome. Uma nova descoberta se fez!

“Os Zo’é falam uma língua do tronco Tupi-Guarani. Não se denominavam Zo’é quando começaram a conviver intensamente com os “brancos” nos anos 1980. A palavra, que quer dizer “nós”, era usada para dizer “somos gente”. Mas o uso recorrente da expressão acabou se tornando um termo de autodefinição.” (Exposição “Amazônia”, Sebastião Salgado)

Além de "vida", a palavra Zoé também pode ser entendida como "nós", "gente", "humano". Isso me fez refletir um pouco mais sobre o significado de atuar em prol da inovação de sistemas vivos e humanos. No meio disso tudo, a discussão global sobre um sistema econômico centrado na vida e na regeneração passa a fazer ainda mais sentido.

O conceito de economia centrada na vida não é novo. Mesmo enquanto Friedman & co estavam ocupados construindo seu paradigma focado no crescimento infinito, outros economistas e filósofos alertavam sobre seus perigos inerentes e propunham alternativas. Da importante obra "Os Limites do Crescimento" (1972), passando pelos economistas ecológicos dos anos 1980 e 90, uma longa lista de estudiosos se dedicaram a questionar uma “economia suicida” em favor de uma “economia que serve à vida”.

Todas essas pessoas e ideias inspiradoras mantiveram a chama acesa de diferentes maneiras para uma Economia Centrada na Vida. Mas, nos últimos anos, uma sensação de impulso maior e mais global foi sentida, sem dúvida devido a uma combinação dos efeitos cada vez mais visíveis das mudanças climáticas e da pandemia do COVID-19. Este golpe duplo paralisante pareceu, para muitos de nós, a gota d’água que faltava, e deu ao movimento um novo senso de urgência. A hora de uma mudança séria é agora - ou nunca.

A Zoé Inova, firme e forte, desde 2019 certificada pelo EcoSocial , continua sendo minha assinatura de alma, e também de alguns programas e workshops que conduzo para lideranças, e segue empenhada em promover a Economia Centrada na Vida. Sigo disposta a alimentar esta semente plantada por tantos nas últimas décadas, sobretudo apoiando o desenvolvimento de #liderançassustentáveis, com o objetivo de mostrar que a Economia Centrada na Vida não é apenas uma ideia ou uma tendência, mas um movimento poderoso com potencial revolucionário real, mas que precisa de líderes à sua altura.

Para atravessarmos a ponte entre estratégias corporativas em que a sustentabilidade vem como um apêndice separado, para estratégias adotam uma abordagem sustentável de forma integrada ao negócio, trabalhar de forma regenerativa nos ajudará a cruzar essa ponte mais rapidamente e ir além de evitar impactos negativos para curar o dano causado e desenvolver a capacidade de regeneração.

Em um artigo muito inspirador de Daniel Christian Wahl sobre a relação entre #sustentabilidade e #regeneração, ele diz que "a prática regenerativa começa e continua com o #desenvolvimentopessoal. Não é uma ferramenta, mas uma prática de participação consciente e cocriação. Vivendo em um relacionamento correto e praticando a arte da transformação, estamos nos realinhando com a própria vida. Trabalhar de forma regenerativa é trabalhar de forma evolutiva. Em uma cultura voltada para a solução de problemas e para a escala de soluções, é revolucionário convidar uma abordagem mais humilde, catalisando e revelando o potencial das pessoas como expressões regenerativas."

A liderança sustentável, no entanto, é algo que requer investimento pessoal, pois mexe profundamente com seu mundo interno (crenças, valores, hábitos), que por sua vez está intimamente conectado a todo um sistema social e cultural. Ao lado das habilidades tradicionais de liderança, é preciso que o líder se desenvolva no sentido de agir com visão de longo prazo, perspectivas ampliadas com um olhar ecossistêmico e humano. Mas também exige coragem e resiliência diante de pressões de curto prazo que podem desviar líderes bem-intencionados de um curso sustentável. É preciso estar preparado para aprender, se desenvolver e se transformar continuamente.

Finalizo com um exemplo inspirador de uma empresa que ousou colocar em prática a coerência inspirada por sua liderança (leia o artigo na íntegra). Através de uma estrutura societária absolutamente inovadora, em setembro de 2022, o fundador da Patagonia, Yvon Chouinard, anunciou a doação de 100% da empresa ainda em vida. A propriedade passou para uma série de fundos e trusts, que garantem que todo o lucro – cerca de US$ 100 milhões anuais – será destinado para combater as mudanças climáticas e proteger terras virgens em todo o mundo. Ou nas palavras da própria Patagonia: a Terra virou sua única acionista.

Ser um líder sustentável e regenerativo é estar a serviço para além do projeto, da empresa, da indústria ou do estado-nação, colocando-se em um "relacionamento correto" com o dinâmico planeta vivo do qual todos dependem. Felizmente a liderança não é um traço genético, mas uma habilidade que pode ser desenvolvida. E sorte nossa que vivemos em uma era de tantas possibilidades e instrumentos, como por exemplo os Inner Development Goals.

Por fim, se a vida é tudo o que temos, ela é necessariamente o centro. E se fizermos bem a nossa lição de casa, os próximos anos podem ser os mais ricos e surpreendentes de nossas vidas para todos os que se dispuserem a esta jornada de transformação interna e externa.

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