Primeiros passos como empresário: o vendedor ambulante que mudou minha forma de pensar
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Primeiros passos como empresário: o vendedor ambulante que mudou minha forma de pensar

Esta é a quarta parte de uma série de artigos que conta um pouco da minha história através de fatos que considero relevantes. Leia aqui a primeira, segunda e terceira parte.

Um ano antes de me formar, já tinha adquirido senso de responsabilidade no mundo. Entretanto, isso não significava que eu sabia o que iria fazer para sobreviver quando me formasse.

No caminho para a universidade, passava sempre num semáforo em que um vendedor de chicletes se divertia com o trabalho que fazia. Era um sol de rachar a cuca, o sujeito ficava suado com um avental cheio de bolsos (eram recortes de embalagens que mostravam o produto que estava em cada bolso, assim como seu preço), mas sempre com bom humor e saudando as pessoas. Um belo dia, montou uma banca de doces e se mudou do semáforo para o callcenter que ficava em frente.

Curioso, perguntei o que ele fazia da vida. Me contou que era contador, mas que não conseguia arrumar emprego e então decidiu abrir o próprio negocio. Ele queria abrir uma loja, mas o dinheiro que tinha era suficiente para o avental e, agora, a banca.

Já havia aprendido a lição e num lapso de inspiração, ouvindo musica alta, decidi: vou abrir uma empresa e depender somente de mim mesmo! Convenci o Boliviano e o Brasileiro, que não falava português, que, caso criássemos uma empresa, poderíamos fazer algum dinheiro. Para mim, representava talvez sair da casa do meu tio. Para eles, significava que poderiam beber mais vezes na semana e o Boliviano poderia comprar a guitarra que tanto queria.

Assim surgiu a não tão famosa, mas pretensiosa, Catálogos Panama.

Você tem uma loja e precisa de um site? Quer colocar fotografia de produtos na internet para deixar de ser um furreca? Ter um site com o nome do seu negócio (www.padaria.com)? Por $10 por mês, agora você pode!

Foi com $200 dólares difíceis de juntar entre três e um advogado, primo de um amigo, que abrimos uma S.A. Além disso, tínhamos um representante legal, site e 9 crachás. Três para cada um: vendedor, programador e gerente geral. A estratégia era bater de porta em porta para oferecer o serviço.

Como estávamos sempre juntos, era difícil explicar que tínhamos três gerentes gerais. Portanto, um fazia a vez de vendedor, outro de programador e um de gerente. Eu era sempre o vendedor porque os outros não tinham coragem de abordar as pessoas. O Boliviano era o programador e o Brazuca, gerente, afinal tinha um terno e cara de sério.

Tomei tantos “não” que dava até depressão. Entreguei panfleto em semáforo, fiz camisa dizendo “quer um site: fale comigo!” e mais um monte de coisas, mas nada funcionava. O índice de adesão era baixíssimo, abaixo de 1%. Depois de cerca de dois meses, havíamos conseguido 5 clientes e um deles estava dando em cima do Boliviano.

Depois de ver um panfleto pregado no quadro da Universidade, decidimos nos inscrever num evento cujo objetivo era que microempresas fizessem relacionamento umas com as outras. Chequei a lista de inscritos, colada na parede do prédio de uma associação de empresas (você escrevia seu nome, telefone e ramo na própria lista colada) e percebi que muitos eram profissionais liberais. O evento custava $100, então raspamos o dinheiro da conta e tiramos no pauzinho quem ia: sortudo, ganhei.

O terno do Brasileiro não cabia em mim, pois ele era muito mais alto. A solução foi recolher as mangas para dentro. Todos tinham 5 minutos para contar o que faziam enquanto um público de gente entediada se perguntava por qual motivo estavam naquele evento sem propósito. Fui um dos últimos e duas outras empresas já tinham apresentado que faziam sites de internet. Fiquei pensando se valia à pena gastar meus 5 minutos falando de site ou era melhor ir embora.

Durante as palestras, tentando vender um site para um advogado que sentou ao meu lado, eu folheava o catálogo impresso com os sites até que ele me disse: "se eu comprar esse de $10, ganho meu nome no domínio? E posso colocar no meu cartão de visitas? Não quero site, só quero o nome da minha empresa no email”. Uma luz acendeu quando percebi que estava vendendo o produto errado para o público errado.

Chegou minha vez! Subi no palco empolgado, jogando numa cadeira o terno que não cabia direito. Olhei para todos e bati palma, pedindo a atenção de quem queria apenas jogar conversa fora. Consegui a atenção deles por alguns segundos e disse:

Sou Ricardo, vendedor da Catálogos Panamá, e hoje estou vendendo cartões de visita profissionais e personalizados! Fazemos a arte sofisticada (pré-moldado, para dizer a verdade) e registramos sua empresa na internet para que seu email seja com o nome da empresa. Custa $10 ao mês e enviamos 4 versões ao ano, atualizadas para sempre mudar a forma que você se apresenta a seus clientes.

Vendi para 80 clientes neste dia. Foi tanta gente que se aproximou que eu parecia celebridade em show de rock: papel, caneta e letra feia anotando o nome e telefone de todo mundo. Estava feliz pois havia colocado a Catálogos Panamá no mapa!

Agora era só entregar o que tinha vendido. Foi a primeira vez que vendi uma coisa que ainda não existia, mas naquele momento já tive a certeza que essa não seria a última!

E essa história continua no próximo artigo...




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