A Segunda Idade das Trevas

A Segunda Idade das Trevas

Na última década do século XV Cristóvão colombo adentra os mares americanos em sua jornada em busca de um novo mundo, porém o que a história escondeu por cerca de 100 anos é o fato que ele trazia em seus navios cerca de 80 toneladas de maconha. Maconha, esta, no formato de cordas, redes, velas e outros utensílios navais. Você deve estar se perguntando se esse fato é real (o que é bom), mas tem uma pegadinha nele. De fato, eram 80 toneladas de uma planta, mas eram plantas de Cânhamo uma subespécie da Cannabis. Porém, além de ser um anagrama de maconha, o cânhamo vem da mesma família que a “droga” o que dificulta a difusão de verdades sobre a planta

Cordas feitas de Cânhamo

Assim como o cânhamo (Cannabis Ruderalis), a popular maconha, que por anos vêm sendo satanizada por políticas autoritárias, xenofóbicas e racistas, também é originária da espécie Cannabis, que atualmente vem sendo estudada por médicos e farmacêuticos em diversos países do mundo. O termo Maconha tem se difundido popularmente no Brasil como sinônimo de uma droga altamente utilizada por marginais e vagabundos. Isso vem em decorrência de políticas de criminalização de drogas apoiadas pelos homens do Governo dos Estados Unidos em meados de 1937, quando Harry Jacob Anslinger, comissário do serviço de narcóticos, junto de William Randolph Hearst, empresário no ramo de jornais, começaram uma onda de falsas notícias sobre o uso de maconha como mostra na notícia “Marijuana: assassina de jovens”. O nome americano Marijuana, também foi inventado por eles a fim de relacionar a origem da droga aos vizinhos mexicanos, criando assim uma difusão ideológica de xenofobia, que era altamente vantajosa para a política norte americana da época, dominada por uma classe média branca que via com antipatia as minorias marginalizadas. Passado alguns anos a própria ONU e outros países do mundo reconheceram a necessidade de se combater um mercado de tráfico internacional de drogas que acabou criminalizando não só drogas pesadas como Cocaína e Heroína, mas a Maconha e como efeito colateral, a própria espécie da Cannabis como um todo.

A Liamba ou diamba, erva conhecida no Rio Grande do Norte há décadas e utilizada como um potente ingrediente para chás usados no tratamento de pessoas com câncer, é também, na verdade, a mesma Cannabis. Um pouco diferente dos norte-americanos, no Brasil a maconha era “coisa de negro”, fumada nos terreiros de candomblé para facilitar a incorporação. A onda propagada pela ONU pegou muito bem no país, que desde 1920 havia implementado uma lei federal antimaconha e vislumbrou na política de “Guerra as Drogas” do Governo Norte-Americano de Richard Nixon (1969 a 1974) como uma solução muito conveniente e lucrativa para a contenção dos negros marginalizados brasileiros, partindo de um equivocado pressuposto de aumento de violência por parte desses usuários.

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Por quase 100 anos, a Cannabis, estigmatizada pela denominação de maconha e consequentemente tratada como droga, sofreu com uma quase total ausência de incentivos e investimentos públicos ou privados direcionados à pesquisa científica em universidades, livros e estudos. As políticas Internacionais de “Guerra as drogas” além de gerar uma opressão violenta contra usuários, causaram um terrorismo psicológico em massa na população ocidental no que se refere até mesmo a falar ou discutir sobre elas, incentivando dessa forma todo o mercado a desenvolver uma visão conservadora e pejorativa em relação a produtos, empresas, instituições de ensino e pesquisa que tivessem qualquer relação com os termos Cannabis, Cânhamo e Maconha. Essas consequências sociais acarretaram um preconceito nacional aos termos ou a qualquer coisa, pessoa ou lugar que remetessem à planta.

“Nós fomos presos por 12 e 18” Essa é a fala de Marcelo D2, um dos maiores rappers brasileiros. Na frase, ele responde ao participante Monark do Flow Podcast, se referindo aos artigos 12 e 18 da lei de Drogas de 1976 (Lei 6368/76) que implicam em Tráfico de drogas e Formação de quadrilha respectivamente. Esse caso ocorreu quando ele e seus companheiros de sua famosa banda de rap rock Planet Hemp foram afrontados por policiais em seu camarim após um show. Marcelo ainda comenta sobre o preconceito que sofreu pelos policiais e conta como isso faz muita referência a seu histórico vindo das favelas do Rio de Janeiro e expondo sua indignação frente ao atraso ideológico que o governo de nosso país demonstra em comparação a países como Canadá, Holanda e Israel. O relato do rapper pode ser generalizado por toda uma geração de música popular em periferias e ruas de todo o país. O Rap, Hip-Hop, Punk, Rock, Funk e até mesmo o Samba, são estilos musicais que carregam diversos artistas que em forma de repressão, desenvolveram diversas obras criticando, comentando ou até mesmo ridicularizando a “visão brasileira” em relação as drogas.

“Idade das Trevas” foi o termo adotado pelos humanistas do século XVII, para caracterizar toda a Idade Média como um tempo de ruína, flagelo, obscurantismo de conhecimento e desigualdade. Mascarada como uma luta contra substâncias ilícitas, as políticas de “Guerra as Drogas” causaram uma onda de terror, racismo, preconceito e obscuridão de informações relacionadas a planta Cannabis. Com o tempo as inclinações dessas políticas começaram a se tornar transparentes a algumas parcelas da população que atualmente estão estudando as inúmeras utilidades dessa planta. Apresentando utilidades como cosméticos, alimentos, tecidos, fibras, recuperador de solo, bioconstrução, materiais plásticos, combustíveis, papel, acolchoado e o mais importante, demonstrando grande potencial como fitofármaco no tratamento de doenças, tanto psicológicas, como depressão, ansiedade e insônia quanto físicas como Alzheimer, Parkinson e Esclerose Múltipla. Todos esses 100 anos de desinformação somados a uma pandemia mundial (COVID-19) nos fez voltar à Idade das Trevas: dentro de nossas casas, com medo do mundo exterior e com mais medo das consequências que o futuro trará. Mudanças ideológicas precisam acontecer para que posturas preconceituosas, racistas e opressoras parem de ser aceitas e somente então as políticas que as apoiam parem de fazer sentido. O país precisa reeducar e conscientizar.

Andrés Ortega, 12/07/2021


João Pedro Resende

Engenheiro químico | Growth

3y

Parabéns pelo artigo Andrés!

Alfonso Antonio Maldonado Gómez

Implementação, Treinamento, Customer Success

3y

Em geral existe um preconceito não só da maconha e sim de muitas plantas que durante centenas de anos foram utilizadas com efetividade pelos antigos povos. E pior do que isso estigmagizam de forma legal e pratica esse conhecimento. Fazendo com que de fato, vivamos numa era das trevas continuamente.

Muito bom! Obrigada pela compilação de informação, sempre bom!

Leonardo Jesus

Engenheiro Agrônomo | Mestre em Desenvolvimento Rural | Doutorando em Fitotecnia - UFV

3y

Parabéns pelo artigo Andrés, excelente abordagem geopolítica e sociocultural da cânabis!

Gabriel Fernandes Araujo

Partner & Digital Innovation Manager @ weme

3y

Boa demais Andres!

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