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Por Rafael Bizarelo — Rio de Janeiro


Doze anos depois da demolição do Autódromo de Jacarepaguá, o Rio de Janeiro caminha para a construção de um novo circuito. Aprovado pela Câmara dos Vereadores, o empreendimento aguarda aprovação do prefeito da cidade, Eduardo Paes, que propôs o próprio PLC. Em entrevista exclusiva ao ge, o arquiteto da obra, Sergio Moreira Dias, destrinchou o projeto do Autódromo Parque de Guaratiba, que promete unir tecnologia e preservação ambiental em uma iniciativa visando revitalizar a região.

Imagem simula projeto de Autódromo em Guaratiba, na Zona Oeste do Rio de Janeiro — Foto: Reprodução/Câmara do Rio de Janeiro

As últimas semanas foram de total avanço para o nascimento do Autódromo Parque de Guaratiba. No dia 18 de julho, a Câmara dos Vereadores aprovou o projeto de lei para a construção de um circuito no bairro de Guaratiba, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. O empreendimento aguarda sanção ou veto do prefeito Eduardo Paes, que propôs a PLC em março deste ano e apoia publicamente o projeto. A Prefeitura prevê a participação governamental para a melhora do transporte público e urbanização na região, mas não fará investimentos na construção do autódromo. Todo o investimento na obra será feito pela iniciativa privada.

Comparação entre os traçados dos Autódromos de Jacarepaguá e Guaratiba — Foto: Infoesporte e Reprodução/Câmara do Rio de Janeiro

Ao ge, o arquiteto por trás do projeto, Sergio Moreira Dias, também responsável pela revitalização de São Januário, estádio do Vasco da Gama, revelou uma homenagem ao Autódromo de Jacarepaguá, palco de corridas da Fórmula 1 entre 1981 e 1989. A pista foi demolida em 2012 para a construção do Parque Olímpico do Rio de Janeiro, complexo esportivo e de lazer construído para os Jogos Olímpicos de 2016. Há doze anos, também foi aprovada a construção de um novo autódromo na cidade, mas a ideia não saiu do papel.

- O primeiro projeto, na verdade não se chama nem de projeto, mas um estudo conceitual, foi de trazer para Guaratiba o mesmo desenho do autódromo de Jacarepaguá, para trazer um simbolismo de homenagem às nossas curvas, às nossas corridas, aos vencedores... então a gente propôs exatamente a mesma implantação cabendo perfeitamente na área - disse o arquiteto.

São 35 anos sem uma corrida de Fórmula 1 no Rio de Janeiro. O cenário, para o arquiteto, é que a cidade volte a ser palco da categoria, mas também de outras, como Indy, Fórmula E e campeonatos de caminhões e motos. Para isso, ele conta com a parceira com a Rock World, empresa que gere festivais como o Rock in Rio e o The Town e, segundo Sergio Dias, “abraçou o projeto” como operador primário. O objetivo é levar hotéis, escolas de pilotos e técnicas e criar um mundo de turismo de eventos.

Guaratiba será um autódromo estilo parque. Antes, a capacidade de 18 mil pessoas divulgada no projeto gerou questionamentos, mas o número representa apenas as arquibancadas fixas. Interlagos possui o mesmo limite nas arquibancadas e, mesmo assim, recebeu 267 mil torcedores em três dias da etapa em 2023. Na F1, o Circuito de Albert Park, em Melbourne, na Austrália, é um exemplo de autódromo parque.

- Vai ser implantado por muito paisagismo, então vão ter desenhos paisagísticos de taludes, de locais onde as pessoas se concentram. Mas é um é um autódromo para 100 mil, 150 mil pessoas de capacidade no evento, como todos os autódromos internacionais. O que se pretende levar para lá é coisa de primeiro mundo e evidentemente que o Brasil não terá nada igual.

Imagem aérea do Albert Park, sede do GP da Austrália de Fórmula 1 na temporada 2022 — Foto: Reprodução

Revitalizar Guaratiba é um dos grandes objetivos de Sergio Moreira Dias, que cita uma "derrubada de muro". Hoje, o bairro é destino para trilhas e visitas às praias, mas ainda está fora do caminho comum dos turistas no Rio de Janeiro. O local em que planeja-se construir o autódromo, em um terreno de dois milhões de metros quadrados com acesso na Avenida Dom João VI, está a cerca de 31km do Parque Olímpico.

- Esse é o momento. Vamos chamar de "derrubada de um muro" para levar para lá um equipamento de padrão internacional.

Nos últimos anos, Guaratiba passou a sofrer com o crescimento das ocupações irregulares. Em 2022, um levantamento feito pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, feito a pedido do G1, indicou que a Zona Oeste concentrava 70% das demolições de imóveis irregulares em áreas de proteção ambiental, e Guaratiba liderava junto do Recreio dos Bandeirantes. A milícia também possui forte atuação na região.

- Hoje não tem essa fertilidade de eventos ou de equipamentos turísticos e coisas parecidas, você leva para lá o melhor do mundo, a melhor empresa de projetos de autódromo do mundo (Populous, que ainda negocia), a maior empresa de eventos do mundo, uma empresa que produz o Rock in Rio. Então você vai ter no Autódromo de Guaratiba um projeto incomparável para o Brasil. Comparável só para alguns projetos do mundo, mas poucos. A gente tem orgulho de levar para Guaratiba o melhor equipamento do possível. Não é só cumprir uma exigência de "trocou Jacarepaguá por Guaratiba", não é isso.

Terreno que pode receber Autódromo em Guaratiba, Zona Oeste do Rio de Janeiro — Foto: Reprodução/Câmara do Rio de Janeiro

A área utilizada para a construção do autódromo não possuiu bom histórico. Em 2013, a missa de encerramento da Jornada Mundial da Juventude, com presença do Papa Francisco, ocorria no então "Campo da Fé". A chuva, porém, impediu a realização do ato no local, que estava alagada, e a missa foi transferida para Copacabana.

- Foi uma experiência, vamos dizer, traumática, que a gente não pode levar em consideração um trauma ou uma experiência de insucesso e dizer: "agora, a vida inteira, isso aí vai ser classificado como um local inviável". É claro que tem que se levar para lá projetos de infraestrutura, de macrodrenagem, de solo... tem uma área lá que já está extremamente consolidada, tem ruas. Tudo já foi impactado lá de alguma maneira. Mas você tem que agora levantar greides (elevações que evitam o acúmulo de água), entra uma série de projetos técnicos, que não podem permitir que o evento que aconteceu se repita.

- A gente vai fazer um trabalho muito grande. Não é uma semana, não é um evento de um dia, que basicamente foram feitos aterros para cumprir um evento de um dia e depois acabava. Esse aí é um evento para a vida, investimento pesado de milhões de reais que vão ser implantados ali e evidentemente que vão demandar.

Campo da Fé, que seria palco da JMJ 2013, ficou alagado por fortes chuvas em Guaratiba — Foto: Darlan Alvarenga/G1

O primeiro esboço da pista conta com um traçado de 5,020 km de extensão, cinco mil metros quadrados destinados para a área dos boxes - com 23 garagens -, outros 3,981 mil metros quadrados para o paddock. O projeto do Autódromo de Guaratiba inclui um plano de replantio, e a manutenção de uma área de preservação permanente e um manguezal em cerca de 43 mil metros quadrados da área, que totaliza pouco mais de dois milhões de m². Estima-se que o autódromo em si ocupe 2% da taxa total de ocupação da área.

A última iniciativa para a construção de um autódromo no Rio de Janeiro teve fim exatamente pela questão ambiental. O Campo de Instrução do Camboatá, uma área militar que não era mais utilizada pelo Exército Brasileiro, seria o palco do circuito de Deodoro. Visitas de Chase Carey, então chefão da F1, ao Rio chegaram a acontecer, mas depois de surgirem suspeitas de irregularidades na concorrência e questões relativas ao estudo de impacto ambiental, houve protestos de ambientalistas. Em 2021, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro aprovou por unanimidade o projeto que transformava a Floresta do Camboatá em Refúgio de Vida Silvestre (Revis), o que eliminou as chances de um autódromo em Deodoro.

- Todas as providências ambientais de licenciamento vão ser feitas preliminarmente para exatamente não acontecer o que aconteceu em Deodoro. Não foi dada a largada, e os carros já estavam na pista. Isso gera uma preocupação ambiental muito grande. É gastar muito tempo no planejamento e no projeto para quando estiver pronto, para dar largada, deixar a Fórmula 1 acontecer.

Visão do projeto do novo autódromo do Rio, em Deodoro — Foto: Divulgação

- Quando existem reservas de proteção ambiental particular, você tem um cuidado maior do que o poder público não consegue fazer. Essa passa a ser obrigação do proprietário, do operador. Toda a área de proteção ambiental, manguezal, e o replantio, que se você olhar a imagem, é um autódromo verde. E hoje, na verdade, não é. É só aquela área que foi aterrada para a JMJ, e você vê que não tem um metro quadrado de vegetação e, ao contrário, a gente vai ter uma área de replantio fantástica, que compensa qualquer emissão de gás carbônico durante a vida inteira. A gente vai tratar da área ambiental como uma propriedade, como o diferencial.

Por enquanto, ainda não há prazo para que a primeira pedra seja colocada em Guaratiba. A área recebeu o EIA/RIMA (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental) para se transformar no grande loteamento e ainda aguarda a elaboração completa do projeto - até o momento, apenas um conceito foi apresentado.

Com o projeto apresentado, será feito um orçamento para liberar parte do potencial construtivo, que será gradual. Conforme a obra avançar, serão liberados mais metros quadrados para a construção. O prazo da obra é de dois anos e meio.

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