Portugal Giro
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Portugal visto de dentro por um jornalista carioca

Informações da coluna

Gian Amato

Jornalista há mais de 20 anos, fez diversas coberturas internacionais por O Globo. Escreve de Portugal desde 2017.

Por

A brasileira Letícia Leite Vieira, de 27 anos, foi deportada hoje de Madri após ficar 56 dias presa na capital da Espanha, tempo que o advogado Diego Bove diz ser excessivo.

Bove conta que foi avisado da detenção por grupos de ativistas em Portugal e tentou que ela permanecesse na Espanha, onde atuou como empregada doméstica, cuidadora de idosa e diz ter proposta para trabalhar em um hotel. Mas o governo determinou a expulsão.

Ela deveria embarcar às 12h20m de hoje, horário de Madri. O voo saiu com 20 minutos de atraso enquanto advogados e grupos de direitos humanos apelavam para impedir a deportação.

A brasileira enviou mensagens para a família confirmando a escolta até o voo, que já estava partindo naquele momento. Seu desembarque será por volta de 18h no Rio.

No domingo, Vieira enviou mensagem ao Portugal Giro por intermédio de Bove. Ela contou que foi vítima de xenofobia no dia de sua audiência.

— No dia da audiência cautelar fui xingada e disseram que eu deveria voltar para o meu “puto país”. Além disso, no mesmo dia da prisão, o policial à paisana disse que ele estava buscando uma pessoa, que não era eu, mas que eu tive a “má” sorte de estar no lugar errado. (No portão da minha casa, como pode!?) — escreveu ela.

A brasileira diz que emigrou porque sofria racismo no Brasil e foi vítima de violência doméstica, com registro criminal. Desembarcou como turista na Espanha para tentar depois a regularização.

— Sempre tive o sonho de sair do país e ter melhores condições de vida. Com três meses, eu perdi meu passaporte. Por falta de conhecimento, fui até à Polícia Nacional registrar um boletim de ocorrência e ganhei uma carta de expulsão — contou.

Ela disse que a partir da carta começou a ser defendida por uma advogada pública. Segundo Vieira, a magistrada deveria atuar na documentação:

— Das vezes que a procurei, a resposta era que o processo seguia em andamento. Depois, pedi ajuda a outros advogados e eles diziam que só poderiam começar o trâmite de legalização após completar três anos no país.

O advogado acrescenta os detalhes do dia da prisão.

— Foi parada por dois policiais à paisana. Deram ordem de prisão para duas mulheres em endereço naquela rua. Não mostraram o mandado. Ao pedirem os documentos, verificaram que Letícia não tinha autorização de residência e levaram ela para a delegacia — disse Bove.

Mesmo com processo de perda de passaporte em andamento, como verificado pelos policiais à paisana na delegacia, trabalho, endereço fixo e uma ficha criminal limpa tanto no Brasil quanto na Espanha, ela ficou presa.

— Foi terrível! A princípio, um susto, mas imaginei que seria resolvido logo, pelo fato de não ter delito, residência fixa e um contrato de trabalho. Mas o pesadelo se estende até hoje. Tive que ficar no calabouço e isso foi muito traumatizante. Porém, ali, os policiais me trataram com respeito — descreveu Vieira.

A advogada pública disse à Vieira que não recebeu nenhuma notificação da delegacia. A brasileira teria perdido contato com ela. Para Bove, o processo foi definido em tempo recorde.

— Todos os recursos foram feitos no sentido de que ela teria o mínimo para receber autorização de residência. E pelo excesso do tempo de detenção. As decisões da juíza do caso saíram muito mais rápido do que o normal e todas negando os recursos — disse Bove.

O advogado tentou suspender a deportação, mesmo que de forma temporária, para ganhar alguns dias e recorrer alegando o que chamou de “vícios do processo”.

— Houve excesso de prazo de detenção, falta de comunicação pessoal dos trâmites do primeiro processo do passaporte com consequente restrição de defesa. E atos da polícia viciados por xenofobia e racismo — explicou o advogado, que fará denúncia ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos e tentará reverter a decisão:

— Após ter acesso ao processo que começou pela perda do passaporte, saber se de fato as comunicações não foram enviadas ou se foram para o lugar certo. Acontecendo um ou outro, invalidar o processo e trazer ela. E pedir o asilo pelo risco dela no Brasil estar próxima do ex-companheiro.

O caso chamou atenção de ativistas em Portugal, como a Casa Odara, e na Espanha. A Rede Espanhola de Imigração e Ajuda ao Refugiado condenou em nota a decisão de deportar a brasileira.

“A Rede (...) lançou um desesperado pedido de ajuda ao Ministério da Igualdade para evitar a iminente deportação de L.L.V, uma mulher racializada de origem afrodescendente do Brasil, de apenas 27 anos, vítima de violência de gênero em seu país de origem”, informou o comunicado intitulado “Vamos acabar com a deportação devido à violência de gênero na Espanha: um apelo urgente à ação humanitária”.

“Durante o mandato de Jair Bolsonaro, Letícia denunciou seu então companheiro por agressão, decisão que no Brasil pode acarretar sério risco à vida da vítima, especialmente para as mulheres afrodescendentes. Após a denúncia, Letícia se refugiou na Espanha na esperança de encontrar segurança e justiça”, completou a Rede.

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