True Crime
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True Crime

Histórias, detalhes e personagens de crimes reais que mais parecem ficção

Informações da coluna

Ullisses Campbell

Com 25 anos de carreira, sempre atuou como repórter. Passou pelas redações de O Liberal, Correio Braziliense e Veja. É autor da coleção “Mulheres Assassinas”

Por — São Paulo

Após passar nove anos preso em Tremembé, o marceneiro Diego Fernando Marques Costa, de 30, obteve o direito à sua primeira saída temporária. Ele deixou a penitenciária na última terça-feira para passar sete dias com a família, no benefício conhecido como “saidinha de Santo Antônio”. Ao atravessar os portões da cadeia, o primeiro rosto que Diego viu foi o da vendedora Mayara Batista, de 32 anos, sua nova namorada — a despeito da quase uma década encarcerados. Os dois se abraçaram e se beijaram por mais de uma hora.

Diego e Mayara se conheceram por cartas. Um colega de cela já conhecia a vendedora e achou que os dois foram feitos um para o outro. O marceneiro escreveu, então, à mulher, que respondeu de imediato, dando início a uma troca de correspondências que durou quase um ano. O namoro foi selado quando Mayara enviou uma foto para Diego, que retribuiu com outra imagem. Ao ver o pretendente, Mayara se apaixonou imediatamente: “Foi amor à primeira vista. Ele é o tipo de homem com quem sempre sonhei”, contou ao blog, na porta da penitenciária. Ao ouvir a declaração, Diego cobriu a amada de mais beijos.

O marceneiro Diego Fernando Marques Costa e a vendedora Mayara Batista — Foto: Ullisses Campbell
O marceneiro Diego Fernando Marques Costa e a vendedora Mayara Batista — Foto: Ullisses Campbell

Nas cadeias de São Paulo, é comum que presos, tanto homens quanto mulheres, troquem cartas com pessoas que estão em liberdade. Toda correspondência que entra e sai do sistema carcerário passa por um filtro da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), que mantém funcionários nas unidades com a função de abrir os envelopes e ler cada linha. Se houver conteúdo erótico, seja em texto ou imagem, ou qualquer outra coisa que não seja papel, a mensagem é descartada. As “censoras” das cadeias também riscam trechos que julguem inapropriados, como palavrões, xingamentos e, principalmente, frases que possam conter códigos para execução de novos crimes — a principal função da triagem.

Como a “saidinha de Santo Antônio” coincidiu com o Dia dos Namorados, Diego e Mayara aproveitaram a primeira semana juntos para trocar alianças de compromisso. “Vamos nos casar em breve”, anunciou ele. A oficialização da relação é fundamental para a vida a dois, já que a SAP só permite visitas íntimas a casais que tenham, no mínimo, um atestado de união estável lavrado em cartório.

Diego e Mayara também trocaram presentes no Dia dos Namorados. Ele deu a ela uma blusa preta, e a vendedora o presenteou com um moletom, já que nas cadeias de Tremembé o frio é quase insuportável. “Nunca imaginei que encontraria a mulher da minha vida estando preso”, suspirou Diego.

O crime

Fora da penitenciária, Diego tem outras pendências para resolver. Uma mulher afirma que engravidou dele pouco antes da sua prisão, ocorrida em 2015. Ele não tem dúvidas, pois passou uma noite com ela após uma noitada — mesmo assim, pediu um exame de DNA para ter 100% de certeza de que a criança, hoje com 9 anos, é sua filha. Hoje, segunda-feira, fim da saidinha, o marceneiro retornou para a prisão.

Como boa parte dos presos, Diego assegura que não cometeu o crime do qual é acusado. Ele conta que, embora trabalhasse como marceneiro, fazia "bico" comprando e vendendo carros. Certa vez, fez um negócio com Victor Isidoro, de 30 anos, trocando um Gol 2011 por um Chevette 1996. No entanto, quando verificou a documentação do Gol que estava em seu poder, Diego descobriu multas acumuladas que somavam R$ 4 mil.

Na noite de 11 de março de 2015, segundo relata, Diego foi ao encontro de uma namorada numa rua sem saída na cidade de Cruzeiro (SP), onde morava. No caminho, deparou-se com Victor, que pediu sua ajuda. Ele estava com um Chevrolet Cruze novo, mas não conseguia tirá-lo da garagem porque não sabia dirigir veículos de câmbio automático.

Diego conta que decidiu ajudar, mas foi surpreendido pela presença do empresário Sérgio Valério Bastos, de 47 anos, amarrado e amordaçado na sala. A vítima era dona do carro automático e havia sido sequestrada por ter mantido, segundo Vitor, um romance com a sua companheira. Diego conta que “foi coagido” por Victor a participar das próximas ações, que passam, a partir daqui, a ser relatadas pelo Ministério Público.

Sérgio Valério Bastos, de 47 anos: morto com seis tiros — Foto: Reprodução
Sérgio Valério Bastos, de 47 anos: morto com seis tiros — Foto: Reprodução

A promotoria sustenta que Victor, Diego e Júlia Alves Marcelino, de 19 anos, namorada de Victor, se uniram para sequestrar o empresário. Victor colocou Sérgio no porta-malas do Cruze e seguiu com a jovem até as proximidades da Via Dutra (BR-116), ainda no município de Cruzeiro. Diego seguiu atrás em seu Gol. No caminho, a vítima conseguiu acionar uma trava e abrir o porta-malas do carro em movimento, mesmo estando com os pés e as mãos amarradas. Victor parou e fechou o porta-malas. Na segunda vez que Sérgio acionou a trava, foi Diego quem desceu do carro e fechou. Ele nega. “Não vi ninguém no porta-malas”, garante.

A vítima abriu o porta-malas pela terceira e última vez. Irritado, Victor pegou uma arma calibre 38 e disparou seis tiros no rosto do empresário. Presos, os três foram condenados por latrocínio, pois eles fizeram uma limpa nos pertences da vítima, inclusive saques na conta bancária. Victor pegou 28 anos de prisão; Diego, 27; e Júlia, 23.

Oum advogado, Diego descobriu que reabrir seu processo para reexaminá-lo juridicamente custaria cerca de R$ 50 mil. Diante do preço salgado, resolveu se apegar à religiosidade. “Tudo o que eu passei na cadeia faz parte dos planos de Deus. Vou cumprir minha pena até o fim e ser feliz com a mulher que escolhi para ficar o resto da vida ao meu lado”, resigna-se.

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