Rio enfrenta corrida contra o tempo para definir gestão de hospitais como Alberto Torres e Instituto do Cérebro; entenda

Governo do Estado pede que Alerj prorrogue por três anos limite para assumir unidades geridas por Organizações Sociais: oito unidades ainda estão sob responsabilidade de OSs e com contratos vencendo nas próximas semanas

Por — Rio de Janeiro


Adolescente foi transferido para o Hospital Estadual Alberto Torres (HEAT) Divulgação/HEAT

Em meio a escândalos que culminaram no impeachment do então governador Wilson Witzel, a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) aprovou em agosto de 2020 uma lei que impede Organizações Sociais de administrar unidades estaduais de saúde a partir de 31 de julho deste ano. Os quatro anos de prazo seriam para o governo transferir gradualmente UPAs e hospitais para a Fundação Saúde, uma empresa estadual. No entanto, a 44 dias de a medida entrar em vigor, oito unidades continuam sendo geridas por entidades privadas. Ontem, o governador Cláudio Castro (PL) enviou uma mensagem pedindo a deputados que estendam o prazo previsto na lei por três anos.

“A premência que reveste a presente iniciativa está alicerçada na necessidade de garantir a continuidade e a efetividade dos serviços de saúde prestados à população fluminense pelas unidades de saúde que ainda operam sob gestão de Organizações Sociais”, explica Castro no texto encaminhado à Alerj. “Sendo assim, a prorrogação do prazo até 31 de julho de 2027 constituirá uma importante medida para assegurar que o Poder Executivo possa dispor de condições necessárias para a transferência integral das unidades estaduais para Fundação Saúde”, completa, na mensagem.

R$ 83,8 milhões mensais

Entre as unidades que ainda estão sob responsabilidade de Organizações Sociais está o Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer, única unidade pública especializada em neurocirurgia do país, e o Hospital estadual Alberto Torres — referência no atendimento de trauma no Rio. Por mês, todos os contratos de gestão ainda nas mãos de OSs custam R$ 83,8 milhões aos cofres públicos.

Ao longo dos últimos três anos, a Fundação Saúde assumiu 55 hospitais e UPAs que eram administrados por OSs. O último contrato incorporado foi o do Complexo Estadual de Saúde da Penha, do qual fazem parte o Hospital Getúlio Vargas e uma UPA.

A 44 dias do prazo, Governo do Rio pede que Alerj prorrogue por três anos limite para assumir hospitais geridos por Organizações Sociais — Foto: Editoria Arte

O governador pediu para o projeto tramitar em regime de urgência na Alerj. Apesar de matérias enviadas pelo Executivo terem de praxe esse tipo de tratamento, neste caso os deputados terão que se debruçar sobre o tema quanto antes. Isso porque a Assembleia entrará de recesso na sexta-feira da próxima semana, dia 28, véspera do fim do contrato de gestão do Hospital Estadual da Criança. A unidade de referência em atendimento pediátrico de alta complexidade em ortopedia, transplantes e tratamento de câncer ainda está sob a responsabilidade de uma entidade privada. O restante dos contratos com OSs vence ao logo do mês que vem.

Presidente da Comissão de Saúde da Alerj, Tande Vieira (PP) é a favor da ampliação do prazo. Ele cita como exemplo a complexidade da gestão do Hospital Regional do Médio Paraíba Doutora Zilda Arns Neumann, em Volta Redonda.

— Desta forma, o governo poderá amadurecer a ideia e ver se vale a pena construir um projeto alternativo para manter esses hospitais remanescentes que são muito especializados. É um processo que, se não for feito com calma, pode prejudicar a qualidade do serviço — afirma Vieira.

‘Puxadinho contratual’

No caso do Hospital Estadual dos Lagos Nossa Senhora de Nazareth, em Saquarema, a saída encontrada pelo governo estadual foi um “puxadinho contratual”. O acordo de gestão da unidade com o Instituto Marie Pierre de Saúde (Imaps) terminava em 14 de maio. Para manter o atendimento, a Secretaria estadual de Saúde fez um aditivo ao contrato de 78 dias por R$ 17,9 milhões. Assim a OS ficará à frente do hospital até 31 de julho.

Uma saída parecida está sendo desenhada para o Hospital da Criança. Na última semana, a Subsecretaria de Atenção à Saúde pediu aos técnicos um parecer jurídico para estender o prazo previsto no contrato por 32 dias “para que não haja interrupção da prestação de serviços”.

Por nota, a Secretaria estadual de Saúde (SES) afirma que gradativamente vem assumindo hospitais e UPAs e, “devido à complexidade desse processo, essa transferência precisa de um tempo de maturidade para que todas as unidades passem a ser geridas pela Fundação Saúde, principalmente, as especializadas”. A SES acrescenta que o pedido à Alerj foi feito para “garantir o pleno funcionamento da rede, assegurando a qualidade dos serviços especializados à população, sem prejuízos a seus colaboradores”.

O projeto enviado à Alerj, no entanto, abre uma brecha jurídica para que a Fundação Saúde devolva a gestão de unidades a OSs. O texto não define que hospitais teriam o prazo do contrato ampliado. Internamente, técnicos da Fundação Saúde já alertaram que o orçamento previsto para o órgão este ano não é suficiente para gerir todas as unidades. A especialista em saúde pública e sanitarista Lígia Bahia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), critica a falta de tempo para debater o futuro da rede estadual, mas concorda que é preciso analisar as necessidades de cada unidade para saber qual seria a melhor forma de administrar.

— Não é ser contra as OSs, mas elas precisam ser pontuais, mais voltadas para a especialização. O que não podemos ter são aquelas organizações gigantescas e com bases políticas.

Na última década, as Organizações Sociais estiveram no centro de diversos escândalos. A lei que prevê o fim da gestão de unidades de saúde por entidades privadas foi votada 24 dias antes de o Superior Tribunal de Justiça (STJ) afastar do cargo o governador Wilson Witzel por suspeitas de fraudes na contratação de OSs. Ele sofreu impeachment no ano seguinte, mas sempre negou as denúncias.

Autor da emenda em 2020 que estipulou o prazo para a saída das OSs da Saúde estadual, o deputado Luiz Paulo (PSD) diz ser contra a prorrogação:

— Adiar para 2027 é deixar para o próximo governo fazer. A OS, além de não deixar legado ao estado, não tem um controle rígido. Todos sabem desse prazo há tempo. Se for uma questão pontual de alguma unidade, como o Instituto de Cérebro, poderia ter vindo destacado na mensagem.

Também seguem administrados por OSs uma UPA de São Gonçalo e os hospitais João Batista Caffaro, em Itaboraí, e Roberto Chabo, em Araruama.

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