2. Da Tokenização a STOs
Jardim Botânico, Rio de Janeiro, março 2020

2. Da Tokenização a STOs

Estamos vivenciando hoje uma inegável reestruturação do mercado de capitais tal qual o conhecemos. Isso porque não só as criptomoedas trazem redução de custos e de burocracia às transações em geral, como também são uma excelente porta de entrada ao universo cripto para aquelas empresas interessadas em criar tokens para angariar capital.

Tokens são unidades de valor ou de conta cuja natureza jurídica não é fixa ou única, mas são representativos da totalidade ou fração da titularidade de um criptoativo adquirido em contrapartida a um investimento feito.

Tanto podem ser currency tokens, como utility tokens e até security tokens. Em cada caso, assumem uma representação diferente que oferece uma prerrogativa específica a seu titular e, assim, dependendo dessa prerrogativa ganham uma interpretação distinta de autarquias reguladoras no Brasil e fora dele.

Inicialmente, a única forma de criar um token era por meio da bifurcação do código fonte do Bitcoin mediante a alteração de um ou outro atributo ali presente, o resultado disso, invariavelmente, era uma criptomoeda que, em alguma medida, seria melhor ou pior do que a criptomoeda original.

No entanto, com o surgimento da Blockchain do Ethereum e o desenvolvimento e implantação do respectivo protocolo ERC-20, a tokenização de ativos ganhou uma proporção totalmente nova, já que facilita consideravelmente o processo em termos técnicos e financeiros. Praticamente qualquer ativo passou, assim, a ser tokenizável em curto prazo.

Tecnicamente falando, esse salto de funcionalidade se deve à adição de uma camada de smart contracts à tecnologia blockchain, inaugurando uma nova era de possibilidades para a criptoeconomia.

Finalmente, assim, foi criada a ferramenta ou arquitetura de sistema capaz de democratizar o acesso a capital por meio da venda de tokens para o financiamento de projetos em estágio inicial. É nesse momento que surgem as, hoje, já famosas, para o bem e para o mal, ICOs – Initial Coin Offerings.

O pico de popularidade das ICOs data do final de 2017 e já em meados de 2018, no entanto, as demandas por esse tipo de alternativa de levantamento de recursos começaram a diminuir, ainda que até hoje novos projetos sigam sendo anunciados no mercado.

De acordo com estatísticas do ICOdata, o total de investimentos de ICO registrado em 2018 foi de 7.8 bilhões de dólares, mais alto, inclusive, do que os 6.2 bilhões de dólares de 2017. Até hoje, ICOs são a forma mais popular de levantar dinheiro na indústria do blockchain e criptoativos.

Apesar disso, a confiança do mercado na legitimidade das ICOs sofreu uma redução drástica nos últimos tempos, tendo em vista que muitas das vezes acabaram se revelando golpes contra os investidores e fraudes milionárias. Em vários casos, investidores alocaram recursos em projetos que eram bons demais para ser verdade e as promessas nunca chegaram a ser cumpridas na prática.

Ou seja, aquilo que parecia ser um ótimo negócio em teoria, em certos casos, nunca chegou a se consubstanciar efetivamente, permanecendo, assim, meras expectativas de negócio, o que gerou prejuízo a milhares de investidores mundo afora.

Mas não é só de fraude que sofrem as ICOs, outro relevante motivo para o insucesso de muitos dos investimentos feitos dessa maneira está na falta de atenção às obrigações regulatórias e legais como um todo. Isso criou um mercado repleto de promessas boas demais para serem verdade e muitos investidores inexperientes, ou não, acabaram caindo no canto do enriquecimento fácil e rápido.

Diferentemente dos tradicionais IPOs – Initial Public Offerings, em que apenas investidores qualificados têm o privilégio de participar da primeira rodada de investimentos em novos e promissores projetos, nos ICOs qualquer interessado pode comprar diretamente das companhias emissoras as coins que estão lançando no mercado primário e aqui, ainda, sem distinção se seriam currency tokens, utility tokens ou security tokens.

Para tentar esclarecer a distinção entre eles precisamos entender minimamente a lógica por trás de cada um deles. Currency tokens, como seu nome já diz, nada mais são do que moedas virtuais que assumem a forma de tokens, ou seja, são as próprias criptomoedas em si, tais como Bitcoin, Ethereum, LiteCoin, ZCash, Dash e Ripple.

Já os utility tokens representam o direito ao uso de um produto ou serviço, condicionados ao fato de que o projeto ao qual pertencem seja efetivamente lançado. Eles aproximam-se mais da noção de créditos para uso específico dentro de uma plataforma ou empreendimento específico.

Pense, por exemplo, nas milhas de programas de fidelidade de companhias aéreas, assim como em produtos adquiridos em campanhas de crowdfunding que são “reservados” para que uma vez levantado o capital inicial para sua produção, sejam de fato produzidos e entregues ao investidor-colaborador.

Alguns exemplos práticos e brasileiros de utility tokens são aqueles criados por clubes de futebol como o Corinthians (Timãocoin)6, o Atlético Mineiro (Galocoin) e o Fortaleza (Leãocoin), por exemplo. Tais times estão emitindo tokens destinados primordialmente aos seus respectivos torcedores, que poderão utilizá-los para adquirir produtos e serviços de parceiros do clube, bem como para fazer doações ao clube dentro dessa rede específica. Ou seja, utility tokens só têm valor e utilidade no âmbito das plataformas às quais pertencem.

Por fim, security tokens, como se pode imaginar, representam uma security, ou seja, a propriedade fracionada de uma empresa, projeto, ou empreendimento, por exemplo. Tais tokens são embasados em um ativo e são fundamentalmente regulados. Portanto, muito se assemelham a ações de uma companhia aberta obtidas por meio de IPOs.

Security tokens são um caso de uso muito interessante de blockchain porque representam basicamente o casamento entre inovação e regulação ao unir as vantagens de adotar novos modelos de financiamento menos burocráticos e mais eficientes que os tradicionais IPOs, mas sem deixar de lado a segurança jurídica própria de formas de financiamento tradicionais.

Apesar de oferecerem mais segurança em termos regulatórios do que os demais tokens, os security tokens não pretendem exatamente substituir as ações de uma companhia propriamente dita. Na realidade, eles passam a oferecer funcionalidades adicionais atreladas subjacentes a esse token e resultantes do uso de tecnologias como blockchain e smart contracts. Dentre tais atributos próprios dos securtity tokens, estariam, por exemplo, a rápida e eficiente distribuição de dividendos ou lucros por meio da automação de pagamentos instantâneos com menores custos e muito mais celeridade.

Diante do exposto, era previsível o deslocamento mínimo de alguns projetos de ICOs para uma nova e alternativa forma de oferta dos security tokens chamada STO – security token offering.

Nessa nova opção de financiamento, o compliance com a regulação incidente passa a estar embutido na própria lógica e construção do token em si que, nesse caso, necessariamente conta com um ativo que o lastreie por trás, podendo gerar, assim, atratividade e interesse também de investidores mais avessos ao risco e, portanto, inicialmente receosos de adentrar o universo cripto após tantos casos de golpes e fraudes no âmbito dos ICOs e tanta incerteza do ponto de vista legal.

A maior vantagem dos STOs reside no fato de que, desde o ponto de partida, buscam registro e aprovação da respectiva autoridade reguladora, respeitando, assim, seus guidelines e normas. Ou seja, seguem passo a passo o framework de preparação para a venda de ativos e são construídos para respeitar todas as regras das regulações de securities e operar inteiramente dentro da lei.

Sendo assim, investir em tokens por meio de STOs, em sua essência, significa dizer que se está legalmente adquirindo a propriedade, ou uma porção, de um ativo físico ou digital. Isso porque tais ofertas de security tokens são meticulosamente esculpidas e planejadas para cumprir com todos os requisitos previstos nas legislações e normas que recaem sobre sua operação.

Portanto, STOs podem se tornar, no futuro próximo, a forma preferida de crowdfunding de projetos e empreendimentos no universo cripto. A regulação traz benefícios tanto para os usuários finais como para o projeto em si.

Em resumo, STOs passam por um teste rigoroso antes de serem lançados no mercado, o que aumenta consideravelmente seu nível de legitimidade perante investidores e reguladores e garante, em alguma medida, que os donos do projeto em que você investiu não irão sumir do dia para a noite com os fundos que você alocou.

Além disso, o valor dos security tokens está intrinsecamente ligado ao valor da empresa que os está vendendo. Sendo assim, ao invés dessa avaliação se basear na popularidade desse token dentro da comunidade cripto, ele está, de fato, ligado ao valor real da empresa.

Por fim, levando em conta o fato da empresa que está rodando o STO ter previamente realizado uma espécie de varredura geral regulatória, o risco do governo ou de qualquer autoridade derrubar o projeto fica consideravelmente reduzido.

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Esta é a terceira parte de uma série de textos que, em conjunto, reproduzem o artigo completo "Security Token Offerings (STOs): DLTs, Regulação e Novas Formas de Financiamento", de minha autoria em conjunto com Ciro Martin. O texto em sua totalidade foi originalmente publicado em dezembro de 2019, no Volume IV do livro "Atualidades em Direito Societário e Mercado de Capitais" organizado por Felipe Hanzmann, disponível na Amazon.


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Michael Angel

Business technology consultant | Blockchain Developer | Hedera Hashgraph Specialist | Helping enterprises with technology solutions to scale | Creating Innovative Products for Enterprises

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