Advocacia 3.5 ou 4.0?
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Advocacia 3.5 ou 4.0?

Em meu último artigo tratei da questão da lei de proteção de dados brasileira e da GDPR, trazendo um enfoque geral sobre as mudanças pelas quais as empresas terão que passar a respeito do tratamento/proteção de dados.

Desde meados deste ano tenho me esforçado para participar de vários eventos a respeito do desenvolvimento e uso de novas tecnologias, IOT, Inteligência Artificial, Design Thinking, marketing digital, GDPR/LGPD enfim, tudo relacionado à nominada Indústria 4.0 ou 4ª Revolução Industrial.

E, em todos esses eventos sempre existem discussões pontuais ou painéis/agenda destacada para tratar da figura do jurista e suas atividades e formação frente a tais mudanças, que muito exigirão de nós um elevado grau de preparo, desprendimento quanto a conceitos arcaicos, métodos e modos de tomadas de decisão e entrega dos serviços jurídicos, mas, acima de tudo, uma proximidade com conceitos e atividades que, há alguns anos sequer passava pelas nossas cabeças que deveríamos nos ocupar.

Pois bem, chegou o momento para que os ranços (vícios de postura, linguagem e modo de pensar e operar)  fiquem no passado e, como sempre tenho dito, nos reinventemos: não há mais espaço para desculpas de que nossa formação acadêmica nos “moldou” a pensar de forma extremamente legalista, sem aceitar a assunção de riscos, olhando para os conceitos legais como empecilhos e a ausência deles como impossibilidades de criação de negócios ou modelos contratuais.  

Já percebo, há alguns anos, a figura do advogado do corpo jurídico das empresas como um “parceiro” dos seus clientes internos, esforçando-se para ajudar a viabilizar negócios, de forma segura e, em certa medida, criativa, sem o “não” na ponta da língua, repensando formas de apresentar os ganhos que o departamento jurídico traz e desestigmatizar a sua imagem de  mero centro de custos, fazendo questionários para avaliação do grau de satisfação dos seus clientes internos (por meio de sistemas eletrônicos ou por meio de reuniões presenciais, curtas, onde fica frente a frente com o gestor da área cliente e lhe pede para falar sobre as falhas, os pontos de melhoria e as interfaces que poderiam ser melhoradas entre as áreas), enfim, tenho presenciado ganhos do jurista corporativo frente aos demais membros da empresa, quer em imagem quer em participação dos centros de tomadas de decisão.

Mas isso é apenas a ponta, precisamos mais. Temos obrigação de mergulhar em temas mais caros aos nossos clientes que, hoje em dia, basicamente, gira ao redor da tecnologia: usar os dados, por exemplo, da pesquisa de satisfação que falei acima e, com isso, de forma sistemática, criar um plano de ataque mais célere, desenhado com o cliente interno, inclusive com reflexos na redução de gastos e otimização nos ganhos; usar os sistemas de dosimetria para mapear dados de contencioso e, com isso, criar savings e redução de contingências; criar e/ou otimizar o sistema/software que cria, controla a geração e armazena os contratos ; ajudar o cliente interno no uso e melhoria sistemas de mapeamento antecipado de demandas de novos negócios, já antevendo e desenhando instrumentos jurídicos adequados para essas novas demandas.

Enfim, as empresas precisam ter um corpo jurídico focado no negócio, que saiba e queira ser mais do que o parceiro: queira estar à frente das inovações; use a proatividade para investir tempo e modelar novas saídas jurídicas, ainda que não testadas; se coloque frente a frente com os clientes internos para modelar ou ajustar o jurídico de forma a terem advogados multitarefas, visionários, que queiram realmente vestir a camisa, o que implica, tomar riscos.

Infelizmente, como disse acima, nossa formação é avessa à figura do advogado que assume riscos, muito ao contrário, somos ensinados a reduzir ou minimizar, ou pior, não correr riscos: numa situação perigosa, caia fora, era o que nos ensinaram nas academias. O administrador é que deve tomar risco: o advogado, no máximo, vai apresentar o grau de risco. Não dá mais.

O direito é uma ciência que lida com fatos e, por isso, acaba tendo que achar saídas para o que de novo se avista e aparece; por óbvio não podemos passar a ser uma ciência da adivinhação, e sair dando sugestões tresloucadas de hipóteses jurídicas para casos ou fatos ainda não performados. Não é possível; não é da essência.

Mas fato é que não podemos mais nos quedar inertes, frente ao jargão de que o direito corre atrás dos fatos, que está sempre atrasado. Temos que estar juntos, na largada! O tempo urge; o que antes demorava um ciclo de 30 anos para mudar, hoje já se altera em 2 anos (ou menos, a depender da indústria).

Não podemos nos armar sob as desculpas de que o legislador não dispôs sobre o tema; que há um vácuo legislativo; que não há segurança jurídica: daqui para a frente a segurança será substituída pela inovação, pela aventura da mudança, pelo conhecer o desconhecido, por criar e colocar em prática um mundo imaginado, por viver a experiência da renovação constante.

Por isso a provocação do título deste artigo: nós, juristas, queremos continuar correndo atrás dos novos fatos ou queremos estar ao lado deles? Queremos ser meros expectadores das mudanças ou queremos participar das mesmas? Queremos ser os meros usuários de uma tecnologia feita por alguém ou queremos, no mínimo, tentar estar ao lado daqueles que as criam?

Eu, no alto dos meus 29 anos de carreira, tendo convivido nestes últimos meses nas mesas de eventos onde jovens empreendedores e juristas descortinaram novidades e instalaram discussões profundas sobre as transformações, quero mais é mudar os rumos da carreira, me reinventar e, com isso, ainda que de forma pontual, poder contribuir para mudanças na área que tanto amo – a advocacia – e, como reflexo e consequência, trazer melhorias para a sociedade, diretas ou indiretas.

Vamos nos reinventar? É preciso! 


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