Aquele que acompanha [coach?] deve estar consciente que a pessoa busca espaço de liberdade interior

Considerando a necessidade premente de aplicação prática no acompanhamento e ajuda às almas (às pessoas), na continuidade da disciplina de Autoconhecimento e Orientação Espiritual, no curso de pós-graduação em Espiritualidade Cristã e Orientação Espiritual (ECOE), na FAJE, tendo visto que "enquanto espírito encarnado, isto é, alma que se exprime no corpo informado por um espírito imortal, o homem é chamado ao amor nesta sua totalidade unificada. O amor abraça também o corpo humano e o corpo torna-se participante do amor espiritual" (JOÃO PAULO II, 1981, 11), hoje tentamos "sentir e saborear as coisas internamente", porque entender não alimenta nem satisfaz. Parece que alguns conseguimos sentir e, talvez, até vê-lo face a face... Quem sabe?

Aquele(a) que acompanha [coach?], já desde o primeiro momento em que se estabelece a relação com o acompanhado, deve estar consciente, e não só dar por suposto, que a pessoa está “situada” e “condicionada” por um acúmulo de circunstâncias e pressões, vivências e experiências que a deixam “desordenada” e que ela busca espaço de liberdade interior para poder reorientar sua vida (PALAORO, 2017, p. 51).

É difícil estabelecer uma fronteira definida, definitiva entre a psicoterapia e a orientação espiritual, ou o acompanhamento espiritual. Os territórios são diferentes, os processos não são idênticos, mas as demandas psíquicas reclamam e apontam para demandas espirituais, posto que “enquanto espírito encarnado, isto é, alma que se exprime no corpo informado por um espírito imortal, o homem é chamado ao amor nesta sua totalidade unificada” (JOÃO PAULO II, 1981, n. 11). Por isso é que todos os componentes da personalidade se orientam para o AMOR.

Sem rejeitar nem negar o que os sentidos nos oferecem, porque “a experiência mística é uma experiência humana” (Cf. COSTA, 2016, Tema 4, p. 27-34), recordo o escopo da psicologia, e da filosofia também: a experiência do desejo, e as paixões que ele suscita. Se o desejo é o que a alma aporta como início, a pessoa pode, de livre arbítrio, fazer (ou reconhecer) meta o objeto de um desejo vivo e constante de amar o AMOR. É o próprio AMOR quem deseja tal meta (ibid. p. 20-21). “De fato, é Deus que desperta em vocês a vontade e a ação, conforme a sua benevolência” (Fl 2, 13). Donde se há que cuidar para olhar com olhos benevolentes para as expressões apaixonadas, posto que são experiências humanas, e que

não são as paixões enquanto tais que são negativas (como pensavam os estoicos e os neoplatônicos): mas a sua tendência egoísta. É dela que o cristão se deve libertar, para chegar àquele estado de liberdade positiva que a era clássica cristã chamava “apátheia”, a Idade Média “impassibilitas”, e os Exercícios Espirituais de Santo Inácio “indiferencia” (CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ, 1989, n. 18).

Tendência egoísta é o que move uma sociedade consumista, hedonista, excessivamente competitiva. Enquanto predomina o individualismo, a depressão torna-se corriqueira. Vale a pena reproduzir um pequeno texto de São João da Cruz, numa leitura de Luis Jorge González, que me esclareceu muitíssimo, e que há mais de quatro séculos tocou nesse assunto tão atual:

Qual a diferença entre essa noite passiva do espírito e a depressão? Se muito há de semelhante, há dois pontos que nos permitem diferenciar as duas experiências: Primeiro, a Noite é operada diretamente por Deus, que é Amor e, por isso, pode realizar uma obra que purifica, transforma e aperfeiçoa os seus filhos para torná-los semelhantes a Ele. Permanece claro, pois, que não é Deus a causa do sofrimento deles, mas muito mais a impuridade deles e imperfeições. Segundo, a pessoa que se encontra na noite passiva, não obstante a sua angústia, sofrimento e obscuridade, vive uma atitude fundamentalmente oposta à depressão: em fé, esperança e amor (GONZÁLEZ, Luis Jorge. Psicologia dei mistici, p. 172, in COSTA, 2016, Tema 4, p. 39).

Podemos encontrar métodos e processos do desenvolvimento humano em plenitude, descritos pelos místicos da Tradição, afinados com os métodos e processos da moderna Psicologia Transpessoal, em especial a Abordagem Integrativa (SALDANHA, 2006), no que diz respeito ao progresso rumo à união com Deus, ao desenvolvimento humano em plenitude. “Os místicos são testemunhas do fato que o crescimento humano em plenitude… é uma vocação para todos os filhos de Deus” (COSTA, 2016, Tema 4, p. 22), pois “a razão mais sublime da dignidade do homem consiste na sua vocação à união com Deus” (Cf. Const. Past. Gaudium et spes, n. 19).

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Referências

CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ. Carta aos bispos da Igreja Católica acerca de alguns aspectos da meditação cristã. Roma : Libreria Editrice Vaticana, 1989. Disponível em: <http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/documents/rc_con_cfaith_doc_19891015_meditazione-cristiana_po.html>. Acesso em: 03 abr. 2016.

COSTA, Alfredo Sampaio. Oração cristã e orientação espiritual. Belo Horizonte : FAJE, 2016, (Apostila - não publicada).

JOÃO PAULO II, Papa. Exortação apostólica Familiaris Consortio [...] sobre a função da família cristã no mundo de hoje. Roma : Libreria Editrice Vaticana, 1981. Disponível em <http://w2.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/apost_exhortations/documents/hf_jp-ii_exh_19811122_familiaris-consortio.html>. Acesso em 27 ago. 2016.

PALAORO, Adroaldo. O acompanhamento nos EVC : alguns pontos importantes a serem considerados (no olhar de um padre jesuíta). ITAICÍ - Revista de Espiritualidade Inaciana. São Paulo, n. 109, p. 43-57, set. 2017.

SALDANHA, Vera P. Didática transpessoal : perspectivas inovadoras para uma educação integral. Tese (doutorado) Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação. Campinas, SP: [s.n.], 2006.

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