Arquipélago Galápagos: Uma experiência socioambiental, quase darwiniana.

Arquipélago Galápagos: Uma experiência socioambiental, quase darwiniana.

Em tempo de mudanças climáticas, quando nações e indivíduos deveriam refletir como mitigar seus impactos no planeta, buscava entender como se daria na prática o conceito de desenvolvimento sustentável, isto é, como poderia aliar o desenvolvimento econômico à preservação ambiental.

Em 2011, passei 15 dias no arquipélago de Galápagos. Localizado a 1000 km da costa do Equador e desde 1978 declarado patrimônio Mundial, é formado por 58 ilhas, sendo apenas quatro habitadas: Ilha de Santa Cruz, São Cistobál, Isabela, e Floreana que juntas somam, segundo censo da época, 25.000 habitantes.

Formado por erupções vulcânicas há 7 milhões de anos no meio do oceano Pacífico, o arquipélago nunca foi conectado a nenhum continente. Os seres que alcançaram esse pedaço de paraíso desenvolveram características próprias: 90% das espécies de répteis são exclusivas de lá, bem como metade das 58 espécies de pássaros. Algumas espécies vegetais também são peculiares e exclusivas. O próprio nome Galápagos veio de uma espécie endêmica: as tartarugas gigantes. Há ainda lobos marinhos, iguanas marinhas – exclusividade de Galápagos – tubarões de várias espécies, arraias gigantes, milhares de peixes, corais, enfim, uma diversidade sem igual.

Este arquipélago me proporcionou, assim como a Darwin, estudar diferentes ecossistemas e suas formas de vida. Enquanto Darwin estudou a vida animal para elaborar a Teoria Evolucionista, observando a adaptação das espécies em diferentes ecossistemas, foquei exclusivamente no Ser Humano e em sua relação com o ecossistema no qual está inserido.

As quatro ilhas habitadas, desde Santa Cruz - com a maior população - à Floriana - com a menor - cada uma ao seu jeito, me possibilitou compará-las e observar como a ação humana interfere no seu meio.

Primeiramente, é imperioso alertar que embora seja um patrimônio da humanidade, tanto os turistas de seus barcos de passeio quanto os telespectadores de programas como os da Discovery Chanel desconhecem a verdadeira transformação que o arquipélago vem sofrendo.

Apesar de 93% do território ser protegido como reserva ambiental, o restante é destinado à habitação e atividades agropecuárias de subsistência que cada vez mais pressionam o limite de expansão urbana.

À título de exemplo, a população das tartarugas Galápagos, espécie que inspirou a teoria darwinista, década após década, diminui sua população apesar de existir um esforço local para evitar sua extinção através da reprodução assistida em cativeiro. A população que era de aproximadamente de 100.000 indivíduos no início do século passado, hoje é de apenas 1050 indivíduos.

Inicialmente, eram consumidas pelos humanos que as consideravam iguaria, ao passo que hoje fazem parte da cadeia trófica de espécies introduzidas pelo homem no arquipélago (em 1900 havia 112 espécies exóticas registradas; em 2007, o total chegava a 1.321).

Hoje, o impacto humano é inevitável e irreversível. O acesso ao arquipélago foi facilitado em razão da reestruturação do aeroporto local, construído pelos americanos na Segunda Guerra Mundial por considerá-la uma base estratégica no Pacífico.

Assim, com o aeroporto, a Ilha de Santa Cruz se tornou a principal entrada do arquipélago e potencializou todo e qualquer tipo de atividade humana, sendo o turismo a principal fonte de renda do arquipélago.

Em 1975 eram 7000 mil visitantes, em 1985 eram 17.840 e em 1989 mais que dobrou para 42.000. O aumento do turismo levou ao incremento da construção civil, da imigração em busca de oportunidades de emprego e um aumento na "importação" de suprimentos vindos do território continental do Equador.

Com o crescimento populacional, veio à reboque o crescimento da infraestrutura: saneamento básico, rede de telefonia móvel, pavimentação, porto etc. Contudo, apenas para não fugir do óbvio, a ocupação e deu de forma descontrolada. Diante disso, utilizaram-se de instrumentos para mitigar os efeitos adversos: i) Para residir no arquipélago é obrigatório se casar com um nativo; ii) o turismo passou a ser controlado por taxas de ingresso, variando de $50 a $100; iii) A importação de suprimentos que possuem potencial de introduzir espécies exóticas, tais como aquelas trazidas nos cascos dos navios ou na bagagem dos visitantes, foi instituída uma inspeção sanitária obrigatória no aeroporto continental e na chegada ao arquipélago.

Por estas razões, Porto Ayora, centro urbano da ilha de Santa Cruz, tornou-se a ilha mais populosa com aproximadamente 11 mil habitantes. Consequentemente, possui a melhor infraestrutura urbana do arquipélago com tem diversos estabelecimentos comerciais, agências de turismo e bancárias, restaurantes, hotéis de luxo, albergues, cybers café, casas noturnas, entre outros.

Assim, à primeira vista, quem busca um paraíso natural isolado do mundo se frustrará por não encontrá-lo em Santa Cruz. A praia balneável mais próxima, Tortuga Bay, localiza-se à uma hora de caminhada do porto, não sendo possível acessá-la por outro meio. Há ainda os efeitos colaterais, como trânsito de carros e de barcos e poluição sonora, algo inimaginável nas outras ilhas.

Como ilha mais populosa, se fez imperativo o investimento em geração energética de fontes limpas e gestão dos resíduos sólidos de forma a mitigar qualquer impacto ambiental. Neste aspecto, houve investimentos em uma usina eólica, o que é temerário tamanha a avifauna local. Há, ainda, postos de coleta seletiva dos resíduos sólidos, mas não são muitos, como também as lixeiras. No fim, prevalece o bom senso dos turistas e habitantes na destinação adequada dos resíduos.

Certo é que por se tratar de um arquipélago longe do continente, o descarte dos resíduos é tarefa tortuosa. Neste caso, deveriam incinerar o lixo ou reutilizá-lo como fonte de biogás, após privilegiar a reciclagem dos materiais não-orgânicos e compostagem dos orgânicos.

Este impacto latente, afasta a aproximação dos animais, ainda que se possa encontrar pelicanos, arraias e leões marinhos no porto em quantidade inferior se comparado à Ilha de São Cristobál.

Esta, por sua vez, é a ilha mais velha do arquipélago com 7 milhões de anos e a segunda mais povoada com 6 mil habitantes que residem na capital do arquipélago Puerto Baquerizo Moreno, centro urbano da segunda maior ilha do arquipélago em extensão.

Nesta ilha, a principal atividade econômica é a pesca, apesar do crescente investimento privado em turismo, como a construção de um novo aeroporto. Sendo assim, embora possua uma infraestrutura urbana básica, a qualidade de vida é aparentemente superior e é notoriamente mais tranquila.

Lá, a natureza é presença constante. As praias localizam-se a poucos metros do porto e dos principais hotéis. O calçadão a beira mar chama atenção não só pela revitalização, mas também pelos imensos e simpáticos anfitriões da ilha: os leões marinhos. Eles estão por todas as partes e encantam até mesmo o visitante mais medroso. Podem ser encontrados deitados, dormindo, amamentando, nadando, brincando ou qualquer outra, maneira que lhes forem convenientes, demonstrando que sua relação com a espécie humana é curiosa: eles não temem a presença humana, inclusive te acompanham a um banho de mar. Além deles, ainda encontram-se iguanas marinhas e terrestres, tartarugas marinhas e terrestres, arraias e uma diversidade de pássaros.

A partir deste momento, percebe-se o porquê do arquipélago ser considerado um pedaço de paraíso perdido. A convivência harmoniosa entre Seres Humanos e animais se mostra possível. Para isso, deve-se respeitar duas regras básicas: não tocá-los - em hipótese alguma - e manter uma distância mínima de 02 metros. Todos os visitantes e nativos respeitam-nas. Mas o contrário é falso. verdadeiro. Há momentos em que se está relaxando na praia e um leão marinho, de surpresa, poderá atropelá-lo se não tiver atenção.

Os seis mil habitantes da ilha são abastecidos desde 2007 por uma usina eólica construída por capital misto. Tem 3 hélices com capacidade de 800Kw cada uma. A usina pode gerar 6.600 MWh/ ano, o que levou à redução de 52% do consumo de diesel empregado na geração de energia elétrica. Consequentemente, reduziu-se em 2.800 ton/ ano a emissão de CO2.

Antes de entrar em operação, esta usina passou por avaliações ambientais e alterou alguns requisitos técnicos para preservar as espécies locais, como o Petrel de Galápagos (Pterodroma phaeopygia), pássaro com risco de extinção que durante o dia permanece "pescando no mar" e só retorna à ilha à noite. Além disso, 03 km de linhas de transmissão de energia elétrica foram instalados sob a terra.

Noutra via, em nível menor de ocupação, encontra-se a Ilha de Isabela. É a de maior extensão, porém a mais jovem. Com aproximadamente 1600 habitantes, tem como grande atrativo seus cinco vulcões ativos, sendo um deles o ponto mais alto do arquipélago, o vulcão Wolf. Ao contrário de Santa Cruz e São Cristobál não possui qualquer estrutura turística. Há apenas pousadas e restaurantes e poucas agências turísticas. As vias públicas não são pavimentadas, sendo compostas de terra e areia. O principal meio de locomoção são as bicicletas, enquanto os carros são utilizados apenas para fins turísticos.

Logo de cara, percebe-se que o impacto antrópico não chegou a esta ilha. Tubarões, tartarugas, leões marinhos, pássaros – entre eles flamingos e pinguins – são facilmente encontrados. De tão pequena, presenciei uma experiência curiosa: em Porto Villamil, o centro urbano da ilha, há 4 cachorros comunitários que permanecem soltos e livres o tempo inteiro; Todos os habitantes se conhecem pelo nome e são conscientizados acerca da patrimônio que possuem.

Nesta ilha, estava sendo introduzido um sistema híbrido fotovoltaico-diesel capaz de gerar 700 Kwh. Certamente, esta é a melhor opção de produção energética, tamanha é a incidência de Sol nesta região, exclusive os impactos na geração energética.

Por último, a ilha Floreana. A primeira a ser habitada, porém a menos populosa com aproximadamente 150 habitantes. Não tem qualquer estrutura turística. Não há hotéis ou restaurantes. Pode-se conhecê-la somente através de tours diários saindo de Santa Cruz ou por cruzeiros. Nesta ilha a natureza está intacta. Não há qualquer impacto humano. E para mantê-la assim, construíram em 2006 um sistema de geração elétrica fotovoltaica com capacidade de 20.6 KMh, suprindo 30% da demanda energética. A demanda restante é suprida por diesel.

Tecidos os cenários de cada ilha, em razão de suas diferenças em extensão, estrutura urbana, idade, população e preservação ambiental, possibilitou-me certificar que quanto maior a presença humana, maior será seu impacto e transformação no meio inserido.

Nas ilhas mais populosas via-se claramente a natureza se perdendo em meio ao caos “urbano”, enquanto nas ilhas menos habitadas a natureza era encantadora e intacta.

Em linhas gerais, a principal diferença entre minhas observações e a de Darwin, é que ele constatou que os animais se adaptaram às condições impostas pela natureza, enquanto as minhas o ser humano é quem adaptou a natureza às suas necessidades.

A conclusão é um tanto óbvia, afinal vivemos no Antropoceno, mas observá-las em campo e em ecossistemas semelhantes, a evidência é assustadora.

Ainda acredito no Desenvolvimento Sustentável, desde que através de basilar consciência ecológica dos habitantes que priorizariam a preservação ambiental em detrimento do desenvolvimento econômico.

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