Brasil no Centro da Agenda Climática Global: Reflexões da COP29, G20 e o caminho até Belém

Brasil no Centro da Agenda Climática Global: Reflexões da COP29, G20 e o caminho até Belém

A COP29, Conferência do Clima da ONU, realizada em Baku, no petroestado do Azerbaijão, se encerrou, deixando muito a desejar nos compromissos firmados em torno de uma economia menos carbonizada e que permita uma maior segurança nos sistemas climáticos globais. Com seu fim, o Brasil assume a presidência do evento e acelera os preparativos para a COP30, de Belém. A Conferência representa uma grande oportunidade para o Brasil em seus diversos setores, inclusive para empresas, ativistas e organizações que atuam na pauta climática. Porém, algumas decisões serão determinantes para que o país assuma a liderança na agenda verde e tire os devidos proveitos econômicos que a posição pode oferecer.

Tive a oportunidade de acompanhar de perto a COP29, em Baku, e o G20 no Rio de Janeiro, ambos eventos que evidenciaram os desafios da construção de consensos multilaterais, bem como o quanto a pauta ambiental pode ser instrumentalizada para fins distintos de sua efetiva promoção - o greenwashing. Neste texto, compartilho reflexões sobre o que podemos esperar para a COP30 e de que forma o setor privado poderá se beneficiar das oportunidades criadas.

Balanço da COP29 e G20 e o que elas deixam para o Brasil

A COP29 foi um evento no qual as expectativas já não eram elevadas. Tida por muitos como uma “COP de transição”, já que ocorre entre duas edições onde houve / se espera haver grandes progressos. Em Dubai, a COP28 começou com a aprovação do Fundo de Perdas e Danos para apoiar os países mais vulneráveis às mudanças climáticas. Houve ainda a divulgação do primeiro Balanço Global do Acordo de Paris (que busca limitar o aquecimento da terra) e, por fim, uma declaração na qual as nações reconheceram oficialmente a necessidade da transição “para longe dos combustíveis fósseis”. Por mais que os progressos estejam longe de atender à urgência climática, representam passos importantes no enfrentamento da mesma.

A edição de Baku recebeu o título de “COP do financiamento”, uma vez que tinha como principal missão organizar qual o valor, a forma e quem irá pagar o financiamento climático, incluindo o Fundo de Perdas e Danos. Negociações otimistas miravam no valor anual de US$ 1,3 trilhão até 2035, sendo US$ 1 tri a quantia mais realista. Sob muitos protestos,  inclusive com negociadores de países mais pobres e insulares deixando as salas de reunião, o valor de US$ 300 bi foi firmado, algo tido como muito aquém do que é realmente necessário para implementar ações efetivas que limitem o aquecimento global a 1,5°C, conforme o Acordo de Paris.

A frustração de Baku, somada ao resultado eleitoral dos EUA, traz uma grande pressão para a COP30, a primeira edição do evento na Amazônia e em um país com as características do Brasil. Com uma grande população, economia, território, grandes florestas, biodiversidade e uma matriz energética majoritariamente limpa, o Brasil tem potencial estratégico para liderar a agenda verde global.

O G20, realizado no Rio, foi um ensaio do que podemos entregar em Belém. Mostramos algo no que somos muito bons: colocar os países juntos para firmar consensos sobre temas fundamentais à humanidade. A edição carioca do encontro das 19 maiores economias do mundo mais a União Europeia e a Africana contaram com o lançamento da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. Ainda, foi emitida uma declaração final - o que não ocorria desde 2022 - que mencionou o desenvolvimento sustentável em aproximadamente um terço de suas disposições. Tudo isso em meio um cenário de polarização internacional, com conflitos armados eclodindo, desglobalização avançando - com a dissociação das cadeias de produção e esvaziamento de fóruns globais. Ponto para o Brasil.

COP30: Brasil sob os holofotes

A COP30 em Belém marca uma década desde a assinatura do Acordo de Paris (ocorrido na COP21, na cidade que o nomeia), um marco histórico na luta contra as mudanças climáticas. Esse marco temporal traz um simbolismo poderoso e amplia a responsabilidade do Brasil em liderar os esforços globais de mitigação e adaptação, consolidando o país como um ator chave na agenda climática, com potencial para protagonizá-la.

Os 10 anos do Acordo de Paris não serão apenas uma celebração simbólica, mas também uma oportunidade para revisar os compromissos assumidos pelas nações e repactuar novas metas climáticas mais ambiciosas. Este será um momento de avaliação profunda do progresso global desde 2015, incluindo as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) e o Novo Objetivo de Financiamento Climático (NCQG), de modo a alinhar estratégias com as mais recentes exigências científicas para limitar o aquecimento global a 1,5°C.

Entre os desafios mais prementes, destaca-se a necessidade de consolidar os avanços obtidos na regulamentação do mercado global de carbono, um dos pilares fundamentais do Acordo de Paris. A COP29 em Baku estabeleceu importantes diretrizes para garantir a transparência e a integridade desse mercado, enquanto o Brasil avançou com a aprovação de um marco regulatório nacional. Agora, a tarefa é promover a operacionalização efetiva dessas iniciativas, assegurando que tanto o mercado internacional quanto o brasileiro contribuam de maneira significativa para a redução das emissões e o desenvolvimento sustentável.

Além disso, a COP30 será uma oportunidade crucial para ampliar o impacto dos chamados empregos verdes, nos quais o Brasil já soma 10% dos postos de trabalho globais e têm um potencial exponencial de crescimento, já que as previsões dão conta da criação de 38,5 milhões de novas vagas globais até 2030, sendo 7,5 somente no Brasil.

COP30: Uma oportunidade e uma responsabilidade

A COP servirá como uma grande vitrine para o Brasil. Mais do que fortalecer sua reputação diplomática e de promotor da coesão internacional, o país estará em evidência também perante empresas e grupos investidores. Esse destaque será fundamental para atrair recursos e parcerias voltados ao desenvolvimento sustentável.

A Conferência se divide entre a Zona Azul, onde OSC - Organizações da Sociedade Civil, autoridades e imprensa têm acesso, e a Zona Verde, onde estão as empresas que atuam em pautas diretamente ligadas ou transversais ao tema do evento. A Zona Verde costuma ser maior do que a Azul, o que reforça o papel crucial do setor privado na promoção de uma economia sustentável e na execução dos compromissos climáticos globais - no que pese ainda necessitarmos de maior engajamento efetivo.

Trazer a COP para o Brasil será também uma forma de atrair projetos, parcerias e investimentos para nosso setor privado. Sobretudo tendo em conta que os pactos firmados pelas nações são, em grande parte, executados pelas empresas, que inovam e se adaptam às regulações e tendências resultantes. Entretanto, isso representa um desafio, na medida em que, não só o governo precisa mostrar que está fazendo a lição de casa tomando efetivas medidas e decisões na direção de descarbonizar nossa economia, mas também no âmbito empresarial. 

Para as empresas brasileiras, o evento representa uma chance de mostrar como estão preparadas para liderar com soluções práticas, enquanto fortalecem sua posição em um mercado global cada vez mais exigente quanto à sustentabilidade.

As maiores oportunidades que a COP trará devem atingir empresas que estejam prontas para conquistar a confiança de investidores, parceiros e do mercado no geral. Hoje vejo, sobretudo em meus trabalhos desenvolvidos pela H&P , uma procura crescente de empresas que, cientes desse movimento, procuram alinhar-se a boas práticas ambientais e sociais. Seja pela necessidade de atender regulamentações, seja pela pressão do mercado, empresas estão cada vez mais cientes de que práticas insustentáveis cada vez menos terão espaço na nova economia que se desenha.

Conclusão: o caminho irreversível para o setor privado

Ainda que retrocessos por parte de alguns governos sejam percalços previstos nessa caminhada, a fala do secretário-geral das Nações Unidas, Antonio Guterres, no seu discurso de abertura da COP29, evidencia uma tendência inexorável: “revolução da energia limpa está aqui e nenhum grupo, empresa ou governo pode pará-la”. Essa transformação vai além da energia limpa e atinge todos os eixos da Agenda Verde, desde a preservação da biodiversidade até a transição para modelos econômicos circulares.

COP30 será um marco para o Brasil, e o que está em jogo vai além de compromissos ambientais: trata-se de reafirmar nosso papel como líder global em sustentabilidade e em criar oportunidades para que o setor privado tenha a mais efetiva adesão a essa agenda. Enquanto profissional que atua nesse campo, é interesse meu, dos colegas de H&P e dos demais que partilham a causa e entusiasmo, garantir que esse protagonismo seja convertido em impactos positivos e duradouros. Essa missão exige ação imediata: cobrar do governo o estabelecimento de políticas robustas e apoiar o setor privado na adaptação a uma economia regenerativa.

O desenvolvimento sustentável para o Brasil não é um fardo, mas sim uma oportunidade. A COP30 será um grande catalisador e quem não souber aproveitar os espaços, não só deixará de ter ganhos financeiros, mas também estará rumo a uma obsolescência que o mercado não irá perdoar.

Fernanda Hilburg

Global Mobility Specialist | Expatriation | Immigration | Relocation | Inbound | Outbound | Polyglot | International Relations

2 d

Ótimo texto!!! Ansiosa para a próxima COP em Belém! 👏🏻👏🏻👏🏻🤩🤩🤩

Thaís Vasconcellos

Gerente de Relações Institucionais e Sustentabilidade - CARTÃO ELO - ESG e Finanças Sustentáveis

4 d

Boa, Victor! Penso que teremos uma grande responsabilidade para a COP 30, principalmente pelos temas não tão exitosos na COP 29, como por exemplo, o financiamento climático. E ainda, a meta de transição para o uso de combustíveis não fósseis, ponto que, infelizmente, não avançamos nessa COP. Além disso, com a Lei n. 15.042/2024 sancionada hoje, fica pra gente o desafio de regulamentar o normativo, em sinergia com o mercado global de carbono, assunto amplamente discutido em Baku. Que venha Belém! Estaremos lá!

Victória Vono

Internacionalista | Esp. Direito Internacional | MBA | M/L Immigration Consultant @ Drummond Advisors 🌎

4 d

Excelente síntese, Victor. Parabéns!

Rodrigo de Lima Lopes

International Relations | Business Administration | Journalism | Marketing | Tourism Management

4 d

Ótima reflexão, Victor! A COP30 em Belém será, sem dúvida, uma oportunidade histórica para o Brasil mostrar liderança na agenda verde e alinhar compromissos sustentáveis com benefícios econômicos reais. Como anfitriã, Belém tem o desafio e o privilégio de ser o palco central dessas discussões tão relevantes. Tenho certeza de que sua visão sobre o tema será muito bem-vinda por aqui. Espero que você possa nos visitar durante a Conferência e contribuir com esse debate essencial!

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