"A caixa preta da governança" de Sandra Guerra
Acredito que você concorde que o ESG seja o grande assunto do momento no mundo corporativo. Além de necessário para a construção de um futuro, o desenvolvimento de metodologias sustentáveis é a chave para a prosperidade dos negócios. Nesse ponto, muitos se preocupam com o lado ambiental (E) e social (S) e acabam deixando em segundo plano a governança (G). Em “A caixa preta da governança” a conceituada autora e conselheira Sandra Guerra desmistifica os segredos e as engrenagens das salas de reuniões dos Conselhos Administrativos (CA), jogando a luz sobre o que acontece dentro das quatro paredes.
Um ponto chave para o entendimento para aqueles que transitam nesse meio dos conselhos administrativos, e principalmente para aqueles que desejam transitar, é que todo CA é formado por pessoas. Todo resultado advindo do CA, seja ele positivo ou negativo, é fruto do debate de ideais das pessoas designadas para ali estarem. Por isso, durante todo o livro, a autora reforça o conteúdo com depoimentos e casos de membros que já viveram aquelas situações e cuja experiência enrique bastante o tema.
Após um breve resumo histórico da evolução da governança corporativa, Guerra se debruça sobre o primeiro grande questionamento: quais as vantagens de se implementar um CA? Algumas empresas o fazem para cumprir regulamentos e se adequar a legislação pertinente, o que autora denomina como a governança do “parece ser“. Por outro lado, corporações que querem “ser” investem recursos para desenvolver metodologias e processos que permitem ao CA ser um órgão estratégico, com visão no futuro, buscando a sustentabilidade e prosperidade do negócio para todos os envolvidos: funcionários, investidores e a sociedade.
Para o bom funcionamento do CA, a correta escolha do presidente do CA (PCA) é fundamental. Ele é o responsável pela gestão cotidiana das reuniões, controle das pautas e pelo relacionamento dos conselheiros com a diretoria executiva sendo a ponte que liga a estratégia e a visão do CA ao modo como ela será executada pela diretoria. Para isso, é interessante que o PCA seja uma pessoa respeitada na organização, com conhecimento de ramo e que apresenta as habilidades de gestão para lidar com pessoas e conflitos. Um ponto destacado pela autora é distinção do presidente entre os papéis no CA e na execução, sendo importante que o conselho exerça a função avaliadora das proposições sem se envolver diretamente no operacional da empresa.
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Durante os trabalhos do CA é normal a existência de divergências entre os membros e esse fenômeno deve ser encarado de forma positiva. O contraditório deve ser estimulado visando o esclarecimento e amadurecimento do debate dos temas da forma mais completa possível. Deve-se apenas tomar cuidado quando as diferenças deixam de ser focadas no conteúdo debatido e passa para esferas pessoais. Cabe ao PCA mediar as discussões e direcioná-las para o foco dos trabalhos.
Outra preocupação constante nos CA é quanto ao efeito de vieses cognitivos na tomada de decisões. Estes podem ser entendidos como padrões de desvios de julgamento, que normalmente são inconscientes e prejudicam o claro entendimento de uma informação. Guerra traz um quadro explicativo muito completo de dezenas de vieses que podem acometer os membros do conselho durante a análise de informações.
Guerra apresenta majoritariamente a governança como uma parte integrante das grandes corporações justamente por ser aonde sua presença é mais comum, quando não obrigatória. Pelo mesmo olhar, vale pontuar que as técnicas de relacionamento, gestão de recursos, crises e pessoas apresentadas pela autora são ricas e permitem sua implantação em qualquer tipo de negócio, com pequenos ajustes. Trazer uma realidade corporativa de uma grande empresa para um pequeno empreendimento pode beneficiá-lo no processo de crescimento, preparando os envolvidos para as novas etapas que virão gerando um melhor aproveitamento dos sempre escassos recursos. O livro se devolve em uma leitura fluída e acessível mesmo no denso conteúdo que o cerca, permitindo a popularização do assunto onde a literatura não é tão farta.