Carta do Gestor - Outubro/novembro de 2024
Cenários e perspectivas
Cenário Econômico Internacional
EUA
O Federal Open Market Committee – FOMC seguiu com o ciclo de corte de juros nos EUA, assumindo um otimismo cauteloso em razão da atividade econômica robusta, a qual produz dúvidas adicionais quanto a eficácia do controle inflacionário. No momento, a taxa básica de juros encontra-se no patamar de 4,75% ao ano ante 5,0% ao ano. Segundo declarações do presidente do FED, Jerome Powell, aumentou-se a confiança de que a inflação continuará convergindo para a meta (2% a.a.) e já os empregos, arrefeceram. O monitor de taxas de juros do FED indica que 66,7% dos agentes de mercado acreditam que a taxa terminal para 2024 será de 4,5% ao ano e 3,75% ao ano em 2025.
O mês de outubro apresentou volatilidade adicional nos mercados globais, em especial nos emergentes, devido as eleições presidenciais nos EUA. A leitura de mercado indica que a eleição de Donald Trump poderá ocasionar maiores pressões inflacionárias e, consequentemente, a interrupção do corte de juros. Para tanto, temos que considerar alguns argumentos. A respeito da Política Fiscal, durante seu mandato anterior, Trump implementou cortes significativos de impostos, o que aumentou o déficit orçamentário. Cortes fiscais podem estimular o consumo e o investimento privado, mas também podem aumentar a dívida pública. Um aumento no déficit pode ter efeitos inflacionários se resultar em um aumento da demanda agregada, especialmente se a economia já estiver operando próxima de sua capacidade total. Do lado dos Investimentos, Trump tem defendido investimentos em infraestrutura, que podem criar empregos e estimular o crescimento econômico no curto prazo, mas também podem pressionar os preços se aumentarem a demanda por materiais e mão de obra. Outra preocupação recai sobre a Política Comercial, considerando que no passado, adotou tarifas sobre diversos produtos, especialmente em relação à China. Tais políticas podem levar a preços mais altos para consumidores e empresas, contribuindo para o aumento da inflação.
Em nossa visão, os argumentos são passíveis de monitoramento constante, entretanto verificamos que o governo Trump, em seu primeiro mandato, não foi pautado pela irresponsabilidade fiscal e, as pressões inflacionárias advindas dos cortes de impostos eram saudáveis naquele momento, considerando que os EUA apresentavam, juros negativos, inflação estagnada e baixo crescimento, em decorrência do “corner monetário”. Ou seja, era uma outra conjuntura, mas ainda é muito cedo para concluir que o novo governo será pautado pelo desequilíbrio fiscal.
Complementarmente, a escala da guerra no Oriente Médio tende a arrefecer no decorrer no governo Trump, segundo os últimos registros do Índice VIX (o “índice do medo”), que se desvalorizou 32,4% nos últimos 5 pregões (CBO: 4/11 a 11/11/24).
Zona do Euro
Em uma tentativa de revitalizar o crescimento econômico na zona do euro, o Banco Central Europeu (BCE) anunciou uma redução na taxa de juros, agora fixada em 3,25% ao ano. Esta decisão, tomada em 17 de outubro de 2024, representa um corte de 0,25 pontos percentuais e reflete a estratégia do BCE de fomentar a atividade econômica enquanto mantém a inflação sob controle.
Recentemente, a inflação na região tem mostrado sinais de desaceleração, alinhando-se com as previsões do BCE. No último mês, os preços registraram um aumento de apenas 1,7%, marcando a primeira vez em três anos que a inflação ficou abaixo da meta de 2% estabelecida pelo banco.
Apesar deste progresso no controle inflacionário, as elevadas taxas de juros têm sido um obstáculo significativo para o investimento e o crescimento econômico, que permanece anêmico há quase dois anos. A decisão do BCE de ajustar a política monetária visa aliviar essas pressões, incentivando o investimento e, consequentemente, impulsionando a economia da região. Com este movimento, o BCE espera criar um ambiente mais favorável para o crescimento econômico sustentável, ao mesmo tempo em que continua monitorando de perto a evolução dos preços para garantir que a inflação permaneça dentro dos limites desejados.
Recentemente, Christoph Swonke, economista e pesquisador associado ao Deutsche Zentral-Genossenschafts Bank, destacou uma preocupante transformação na economia alemã, referindo-se ao país como "a nova criança-problema entre os países europeus". Esta afirmação sugere que a Alemanha, tradicionalmente vista como o motor da economia europeia, agora enfrenta desafios internos que podem estar prejudicando o crescimento econômico da região. O ministro da Economia e vice-chanceler da Alemanha, pertencente ao Partido Verde, confirmou que a economia alemã está em retração pelo segundo ano consecutivo. Em 2023, o Produto Interno Bruto (PIB) do país diminuiu 0,3%, e as projeções para 2024 indicam uma nova contração de 0,2%. Esses dados sublinham uma mudança significativa no papel da Alemanha dentro da União Europeia. A economia que antes liderava o crescimento e a inovação no continente agora enfrenta dificuldades que podem ter repercussões mais amplas para a estabilidade econômica da região.
China
No terceiro trimestre de 2024, o Produto Interno Bruto (PIB) da China registrou um crescimento de 4,6% em comparação com o mesmo período do ano anterior. Embora positivo, este crescimento ficou aquém das expectativas do mercado, refletindo alguns dos desafios estruturais que o país enfrenta atualmente. O Fundo Monetário Internacional (FMI) revisou sua previsão de crescimento para a China em 2024, agora estimando uma expansão de 4,8%. Esta revisão está alinhada com uma pesquisa conduzida pela Reuters, que também projeta um crescimento de 4,8% para o ano, ligeiramente abaixo da meta estabelecida por Pequim.
Entre os desafios que a China enfrenta, destacam-se a crise persistente no setor imobiliário, que tem sido um pilar tradicional do crescimento econômico, além de questões demográficas como o envelhecimento populacional e a baixa taxa de natalidade. Estes fatores estruturais podem impactar a trajetória de crescimento a longo prazo e exigem atenção cuidadosa por parte dos formuladores de políticas e investidores.
Acreditamos que, apesar dos desafios, a economia chinesa ainda oferece oportunidades significativas, especialmente em setores e inovadores, contudo pesam o deslocamento da produção por parte de empresas norte-americanas, como política de diversificação de risco e redução de custos. Consideramos a interdependência entre a economia chinesa e a norte-americana muito relevante, o que sugere movimentos de ajuste na balança comercial entre os países, mas longe de representar o fim da relação comercial.
Cenário Econômico Doméstico
O atual cenário econômico brasileiro está marcado por uma tensão crescente em torno do cumprimento das regras estabelecidas pelo novo arcabouço fiscal. Essa situação tem alimentado um sentimento de pessimismo em relação à economia nacional, obscurecendo alguns dados positivos recentes, como o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) acima das expectativas no primeiro semestre e a elevação da nota de crédito do Brasil pela agência de classificação de risco Moody's.
Com isso, conforme a decisão do Copom (6/11) a taxa básica Selic atingiu a casa dos 11,25% ao ano, sendo o segundo aumento consecutivo da taxa, que já havia sido elevada de 10,50% para 10,75% em setembro. Por exemplo, o Ibovespa encontra-se no patamar dos 127.778 pontos acumulando perdas na ordem de -3,71% em 2024 (base 11/11) e o contrato de DI Futuro DI1F26 (2/1/2023) está sendo negociado a 13,15% ao ano ante 9,41% ao ano em janeiro de 2024, impactado pela condução da política fiscal.
As preocupações centrais giram em torno da capacidade do governo de aderir ao arcabouço fiscal, especialmente diante do aumento das despesas que não é acompanhado por um crescimento proporcional das receitas. Essa disparidade gera incertezas significativas, levando o mercado financeiro a defender a necessidade urgente de zerar o déficit fiscal. No entanto, há um ceticismo crescente sobre a habilidade do governo federal em implementar cortes de gastos necessários para atingir esse objetivo.
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Apesar das preocupações fiscais, é importante destacar os sinais positivos que emergem no cenário econômico. O crescimento do PIB no primeiro semestre superou as expectativas, indicando uma resiliência econômica que não deve ser subestimada. Além disso, a melhoria na classificação de crédito do Brasil pela Moody's reflete uma confiança renovada na capacidade do país de honrar suas obrigações financeiras, o que pode atrair investimentos e estimular o crescimento econômico a longo prazo.
Do lado da inflação, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apresentou uma alta de 0,56% em outubro, superando a meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Em resposta a esse cenário, ajustamos nossa projeção para a inflação de 2024, elevando-a de 4,6% para 4,9%. Este aumento reflete pressões inflacionárias que podem impactar o poder de compra e as decisões de política monetária.
Quanto ao Produto Interno Bruto (PIB), no segundo trimestre de 2024, o PIB brasileiro cresceu 1,4%, marcando o desempenho mais robusto desde o final de 2020. Este crescimento levou o mercado financeiro a revisar suas expectativas para o ano, com a projeção de crescimento econômico ajustada de 2,96% para 3%. Este otimismo é sustentado por um aumento no emprego, que deve continuar a impulsionar a economia.
A respeito da Balança Comercial, em outubro, observamos uma queda de 0,7% nas exportações, enquanto as importações registraram um aumento expressivo de 22,5%. Apesar desse desequilíbrio, o superávit da balança comercial atingiu US$ 4,34 bilhões, um resultado que ainda demonstra a resiliência do setor externo brasileiro, embora com desafios evidentes no comércio internacional.
O Brasil enfrenta um momento crítico em sua trajetória econômica, onde a gestão fiscal eficaz é essencial para sustentar o crescimento e restaurar a confiança do mercado. Enquanto os desafios são significativos, as oportunidades para fortalecer a economia e melhorar a percepção internacional do país são igualmente relevantes. É crucial que as políticas econômicas sejam cuidadosamente calibradas para equilibrar a necessidade de disciplina fiscal com o estímulo ao crescimento econômico sustentável.
Estratégia das Carteiras
Carteira de Renda Fixa
Nesse contexto de stress na curva de juros futuros, mantivemos a estratégia de aquisição de títulos pós fixados, indexando a carteira ao ciclo de alta da Selic. No mesmo sentido, seguimos com a política de aquisições de títulos de crédito privado isentos de impostos e indexados ao IPC-A, devido às pressões inflacionárias registradas nos últimos meses. As intensas alocações em títulos pós fixados desde maio/24 têm surtido efeito positivo, mantendo as carteiras de renda fixa acima do CDI.
Carteira de Renda Variável
O Ibovespa segue descontado com PLs (preço / lucro projetado) abaixo de 10 anos, mas com sinais de enfraquecimento, justificado pela elevação da taxa de juros e tensões quanto à política fiscal. Dado o cenário base, reduzimos a exposição em bolsa, gerando um caixa na ordem 6% da carteira, reduzindo parcialmente a aderência ao Ibovespa.
Carteira internacional
O S&P500 segue em tendência de alta alicerçado no ciclo de queda dos juros nos EUA e no crescimento econômico robusto. Mantivemos as ações de empresas resilientes em uma economia desenvolvida, frente ao início do ciclo de queda da taxa de juros nos EUA. Na renda fixa, alongamos os vencimentos dos títulos de forma comedida, em razão do possível corte de juros ao longo do próximo semestre.
Conclusão
No momento, o mercado está em compasso de espera do “pacote fiscal” anunciado pelo Ministro da Fazendo para depois das eleições municipais, com o objetivo de promover cortes de gastos governamentais, o que pode reduzir a aversão ao risco dos investidores. Cabe reforçar que o déficit primário representa 2,15% do PIB e o nominal 9,34% PIB, muito aquém das expectativas. A divulgação do “pacote” pode representar um ponto de inflexão, sinalizando para a descompressão da inflação, da taxa de juros e da taxa de câmbio.
Posto isto, a estratégia mantém o rigor com relação aos riscos associados às alocações, em especial, os riscos de mercado e de crédito, prestigiando ativos menos voláteis e mais resilientes nos períodos de crises.
Renan Silva
Gestor, CGA