Como líderes podem colaborar com a saúde mental de seus liderados
Setembro (também chamado de Setembro Amarelo) é o mês mundial de prevenção ao suicídio, e é uma oportunidade incrível de pensarmos como os líderes podem influenciar – positiva e negativamente – a condição de saúde mental de seus liderados.
Pelos dados oficiais, 32 brasileiros se suicidam por dia – taxa maior do que das vítimas da AIDS e da maioria dos tipos de câncer – e a Organização Mundial da Saúde afirma de 9 a cada 10 casospoderiam ser prevenidos. É um número alarmante e que nos mostra que devemos nos preocupar com como podemos combatê-lo, visando a proteção da vida e prevenção do sofrimento que leva ao suicídio.
Alguns dos motivos mais relatados para a tomada de decisão de matar a si próprio são crises (financeiras, existenciais, de relacionamento…), falta de sentido na vida, depressão, transtornos mentais, bullying, preconceito, discriminação e pressões sociais, e ao visualizar isso percebemos o quão vulneráveis estamos a chegar numa escolha de suicídio. Na verdade, quase todo mundo um dia já pode ter tido vontade de “jogar a tolha”e deixar tudo para trás por alguma situação intensa e complicada que tenha vivido, e é aí onde faço a pergunta: onde estão nossos líderes nesse contexto?
A ligação básica que fazemos entre mente dos liderados e liderança é da motivação, e esse é um aspecto importante, mas temos que enxergar que há um campo de impacto muito maior. Saúde mental também está relacionada a estresse, ansiedade, depressão, traumas, esgotamento, frustração e outras tantas coisas que, inclusive, podem somar para um quadro que leve a um fim tão difícil quanto o suicídio.
Você, líder, tem um grande potencial de influenciar a saúde mental de seus liderados. O que tem feito a respeito disso?
Os líderes são – entre outras coisas – grandes influenciadores de nossos pensamentos e decisões, e muitas vezes acabam nos colaborando para que tenhamos cargas duras demais para suportar. É que acontece quando existe uma liderança autoritária e centralizadora, que corta as possibilidades de criação pelos seus liderados e os pressiona fortemente, desmotivando-os para realizar suas atividades e gerando grandes níveis estresse. Esse modelo de liderança autoritária já não cabe no contexto das gerações que estão predominantemente na idade produtiva hoje e e prioritariamente engajadas em grupos e causas, pois desmotiva pessoas que tendem a desejar uma maior flexibilidade e uma relação mais horizontal. Pesquisas da Universidade Princeton (EUA) já identificaram que a felicidade se baseia em ter um propósito de vida e ter prazer no que faz, e grandes níveis de esgotamento a que podemos ser submetidos comprometem seriamente isso.
Encontramos também pessoas que mergulham nas suas atividades (sejam quais
forem) sem compreender até onde a quantidade delas pode comprometer seu bem estar e sua saúde mental. Há líderes – principalmente os líderes autocráticos e alguns que ainda não desenvolveram as skills de delegação e priorização de atividades – que também cobram grande quantidade de funções e entregas por parte de seus líderes, afetando as outras funções e vivências da pessoa. Alguns entram num estado de estafa mental, Síndrome deBurnout (esgotamento) e outras complicações de saúde física e mental difíceis de serem controladas sem que haja o posicionamento de um líder para “organizar” isso. Evitar fazer seus liderados levar trabalho para casa e só entregar funções e atividades a quem realmente tem disposição de tempo e energia para isso são passos importantes.
Outro caso comum e que talvez seja o mais duro é o de vestir uma máscara que mostra uma vida boa e feliz enquanto na verdade tudo está um caos por trás dela. É que o que estudantes e pesquisadores da Universidade da Pennsylvania têm chamado “Penn Face”. Isso muitas vezes é gerado nos liderados por líderes que trouxeram essa mesma vivência, aparentando uma vida sem falhas, dores e quedas. Isso é extremamente nocivo pois faz com que um liderado imagine que só sua vida tem dificuldades e comece a se questionar sobre a razão de ainda estar vivendo nessa situação. Além disso, ocultar os problemas é uma forma de acumular e dificultar ainda mais o processo de ressiginificação (mudança de sentido, transformação de conceito sobre algo ou alguma situação).Esta situação também colabora para que haja a procura por profissionais que possam ajudar em situações de sofrimento psíquico – como psicólogos e psiquiatras – seja ainda mais dificultadas pela ideia de não poder mostrar que possui dores e fraquezas. Como diria Guimarães Rosa, “viver é um risco”, mas nem todo mundo está pronto para entender que isso não é só com sua própria vida, e isso é necessário, para o próprio bem. Os líderes têm que ser realistas e mostrarem que também têm dificuldades, e que isso faz parte de viver.
Líderes também têm que ser fortes agentes de combate e prevenção aos diversos tipos de preconceitos, bullying e discriminação, seja em qual tipo de grupo ou instituição seja. Ser bem acolhido é fundamental para que a pessoa encontre paz em participar daquele meio, e essas situações mencionadas são justamente opostas a essa ideia de aceitação.
A confiança construída na relação líder-liderado também é importante para que subordinados se sintam à vontade para compartilhar seus sofrimentos e mostrar quando não estão bem (de maneira adequada dentro do contexto, claro), pois há um conceito da Universidade de Stanford que colabora com o “Penn Face” que eu já tinha dito, que é o “Síndrome de Duck”, ou “Síndrome do Pato”, que rotula os casos onde – assim como o pato – as pessoas pato parecem deslizar calmamente sobre a água, mas abaixo da superfície ele estão remando freneticamente com suas patas. A escuta ativa é importante para identificar quando um liderado precisa de ajuda.
Não podemos dizer que o líder tem que fazer também o papel de psicólogo ou psiquiatra – e nem poderíamos dizer isso por questões legais e de ética profissional – mas que a posição de gestão e guia do líder é importante pra que ele ajude a desconstruir conceitos e estilos de vida e trabalho que possam causar sofrimento psicológico nos seus liderados, perceba melhor anormalidades nos padrões de comportamento deles e possa ser um ponto de força e equilíbrio para encaminhar a pessoa para um profissional habilitado a tratar a questão.
Nós como líderes temos que estar preparados para dar uma pausa para um café com um liderado de se mostra com comportamentos depressivos, ser transparente quanto a dificuldades (sem máscaras), promover momentos de conversa informal entre seus subordinados, perguntar mais sobre como vai a vida (sem invadir um espaço que possa não ser adequado ao seu papel) e incentivá-los a serem mais felizes no que fazem. Os líderes são referência na vida dos seus liderados, modelos com quem eles aprendem como lidar com a vida, e você como líder não pode ser aquele que vai repetir o modelo de ensinamentos de “sorria e acene”, ignorando o fato de que a vida não é fácil e que se incomodar com coisas nela não é uma fraqueza. Use sua vida como demonstração real dessas verdades e atitudes que fortalecem o mind set de seus liderados. Essas são as colaborações que um líder pode ter na saúde mental de seus liderados.