Contra a corrente
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O Dr. N. Sri Ram, filósofo indiano, que morreu em 1973, propôs, num de seus textos, a parábola da madeira flutuante, cuja moral da história era a de que o que diferencia um tronco flutuante de uma barca feita da mesma madeira é que esta última tem remos e se pode navegar contra a corrente. É isso, somos todos como os troncos que foram lançados inteiros e secos nos rios da vida e, no curso da correnteza, vamos sendo umedecidos e golpeados, percorrendo um caminho que segue ao sabor da corrente e só mudamos de direção quando os desvios e acidentes do caminho nos obrigam a isso. Se nada fizermos, seguiremos pelo rio, feito troncos sujos e enlameados, sem rumo e nem porto fixo, até que despedaçados e completamente umedecidos, desapareceremos da superfície deste rio que não cessa de correr, às vezes, sem saber de onde viemos e nem onde chegaremos. Nos rios próximos a grandes florestas, vemos constantemente esta paisagem de troncos sendo arrastados corrente abaixo, como se fossem um rebanho sem destino.
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Mesmo assim, não seguimos só. Deus, por intermédio da natureza sábia, faz a sua parte, deixando que o sol banhe nosso dorso e de noite, as sombras sejam iluminadas pela lua e pelas estrelas. Só que a gente não percebe isso, não temos olhos para ver e seguimos nosso destino de troncos, nos chocando com as coisas e com as pessoas, ferindo e sendo feridos. Não trabalhamos a nossa madeira, não a transformamos com a desculpa de que “nasci assim e vou morrer assim!”. Burilar essa madeira da qual todos somos feitos não é fácil e nem prazeroso. O trabalho, além de dolorido, é longo. Os grandes vultos da Humanidade nos provam isso, de Ghandi a Mandela, de Luther King a Chico Xavier, todos nos provam isso. Nenhum deles teve existência fácil, lutaram heroicamente contra tudo e contra todos, inclusive travaram lutas íntimas, no fundo de suas almas, lá onde os egoísmos e as covardias sempre entrelaçam suas fibras retorcidas. Só que eles quebraram a ilusão de crer que eram apenas um tronco fadado a se despedaçar e desaparecer numa curva do rio. Impulsionados por suas crenças, colocaram sua vontade em ação e, sobrepondo-se aos gemidos da matéria quase apodrecida, se dispuseram a se transmudar numa canoa e fabricar seus remos, a fim de realizar as suas tarefas.
Se assim também o fizermos, aos poucos nos transformaremos de rude tronco de madeira em uma canoa e, como disse o filósofo indiano, a outrora ferida cavidade será, então, um polido receptáculo para nossa Alma Peregrina. Com os aparas, faremos os flexíveis remos que, de acordo como os manejarmos, serão nossos impulsionadores e também o timão para trocarmos de rumo quando necessário. Agora, haveremos de navegar contra a corrente, ou seja, deixar de fazer parte da multidão de iguais, de fazer só o que os outros fazem, de querer andar na moda e não mudar, para viver a intensa e maravilhosa aventura espiritual de navegar contra a corrente.