Desconfinamento e Teletrabalho
Hoje a comunicação social dá conta de que o Governo admite olhar para a legislação do Teletrabalho até ao fim deste mês. A partir de 1 de Junho, esta modalidade, definida segundo Artigo 165.º da Lei n.º 7/2009 como “prestação laboral, realizada com subordinação jurídica, habitualmente fora da empresa e através do recurso a tecnologias de informação e de comunicação”, reger-se-á pelas regras habituais — o que obriga à existência de acordo entre o trabalhador e a empresa para se aplicar essa modalidade. Parecem, contudo, regressados alguns estigmas desta forma de trabalho, levados nalguns casos à “discriminação” e à “diabolização” de quem se encontra a trabalhar neste regime.
A adaptação dos modos de funcionamento é e será um imperativo nos próximos largos tempos, justificando-se, obviamente, de forma generalizada, a atualização das regras e da legislação. Todavia, será de esperar que, da mesma forma que se deverão garantir condições de saúde pública, cumprimento das recomendações da DGS ou disponibilidade de “álcool gel, luvas e mascaras”, também será desejável que não se desvalorizem questões legais, de operacionalidade ou critérios sustentados de funcionamento das organizações, especialmente das entidades estatais.
Como é habitual nestes momentos de crise e excepcionalidade, o momento que naturalmente se segue é o da "accountability", termo tão em voga porque é bonito pronunciá-lo, mas, na sua essência, tantas vezes enclausurado, seguindo a lógica do Professor Almerindo Janela Afonso, nas lógicas do pensamento único, neoconservador e neoliberal.
A prestação de contas, a justificação e a responsabilização não podem transformar-se, por um lado numa panaceia (ou mesmo num fetiche solucionador ou justificador de todos os défices e problemas de produtividade ou qualidade), e por outro, numa fonte de constrangimentos entre pessoas. Será, sem dúvida, importante tratar estes assuntos com critérios e regras claras. Por exemplo, para a distinção clara entre "elegibilidade" e "participação".
Mais do que contrariar a lógica do hábito do ‘presencialismo’, importa não cair na tentação da compelação, como já vimos em certos deputados da nossa Assembleia da República, quando generalizam ao afirmar a existência de casos de “inação ou desaparecimento em combate”.
A questão que já se colocava, e que tanto se discute há praticamente dois meses por todo o lado e por esse mundo fora, é saber quem define se as funções são compatíveis com o teletrabalho. Talvez estejamos agora perante uma oportunidade para o futuro, assim como perante a necessidade de fazer com que o estar em “Teletrabalho” deixe de ser um estigma para quem se encontra nessa condição para passar a ser uma responsabilidade. Como dizem os americanos… “Be Accountable For Accountability”.
Lembrar ainda o que diz a Ordem dos Psicólogos relaticamente a esta modalidade de trabalho.
"Para grande parte das pessoas o regime de teletrabalho é uma experiência nova que necessita de um período de adaptação. Há ainda que considerar que, na situação actual, o teletrabalho implica não só misturar espaço de trabalho com espaço pessoal e de lazer e estar longe das habituais dinâmicas sociais e laborais, mas também ter de gerir, simultaneamente, dinâmicas familiares não usuais, sobretudo se tiver filhos menores de idade ou seniores a seu cuidado".
Deixo aqui, publicamente, a minha admiração e elogio às iniciativas promovidas pelo INA e pelo Ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública.
Imagem: Jornal Público Online 21 de Maio de 2020)