Deu certo, mas do jeito errado
Por qual motivo a gente deve mexer em algo que está dando certo do jeito errado?
O que faz com que a gente se movimente para fazer diferente uma coisa que a gente não sabe fazer e nem sabe se quer fazer, mas já que disseram que pode ser bom e melhor, a gente faz. E a gente paga por isso, muitas vezes, pagamos bem caro, inclusive.
Tem muitas empresas que existem por mais de 30 anos trabalhando de forma tosca – veja bem, usei tosca e não simples – e sustentam mais de 50 funcionários, estão sempre abastecidas, o giro continua grande e os clientes continuam amando.
A gente aprende milhares de conceitos e ferramentas de gestão empresarial que são fundamentais para maximizar lucros, reduzir desperdício, melhorar eficiência, tornar os processos mais ágeis, a equipe engajada e os clientes mais satisfeitos e aí nos deparamos com essas empresas aparentemente desorganizadas, sem controles, processos precários, equipe pequena e sobrecarregada, mas que vive sorrindo, reclama aqui e agradece ali, num ciclo psicótico de conformismo.
Quando olhamos essas empresas temos a capacidade de elencar em ordem de prioridade as ações de melhoria que poderiam fazer para triplicar seu resultado. Às vezes até pensamos que “se fosse minha, não estaria assim”, mas no final das contas, percebemos que existe um ecossistema tão próprio, uma cultura tão consolidada que não tem a menor necessidade de entrar com inovações. Os funcionários se sentem incomodados por verem seus motivos de reclamação sendo resolvidos. Os clientes se sentem desamparados por chegar no lugar e não presenciar mais aquele “caos controlado” de um mal atendimento, mas que alimentava suas poucas horas de reclamação entre um café e outro. Os gestores ficam mais perdidos ainda por não ter mais aquele monte de papel cheio de anotações aleatórias espalhadas pela sua mesa e que lhe dá a sensação de controle que ele tanto diz que quer, mas não sabem lidar quando tem.
Os donos da empresa fingem não enxergar os desvios e perdas financeiras que escorrem por contratações mal feitas, compras realizadas sem critérios e produção sem a certeza da venda e, quando são afrontados por planilhas e gráficos apresentando os valores que deixam de entrar em seu bolso, simplesmente desacreditam e questionam a veracidade desses números.
Admitir que o que se fez até agora e funcionou, mas poderia ser ainda melhor, mais rentável ou simplesmente mais bem distribuído (para aqueles poucos que não tem como objetivo final a geração de lucros exorbitantes) não é tarefa fácil. E, também, só tomar consciência, não quer dizer que uma mudança vai acontecer. E isso tudo não tem nada a ver com a empresa, mas tem relação direta com os seres humanos que estão por trás delas.
A gente evolui, mas nosso cérebro continua primitivo e mudar hábitos, comportamentos e atitudes gasta muita, mas muita energia. Cansa demais. Exige uma presença e uma elaboração mental que, ouso dizer, seria digno de maratona de atletas de alta performance.
E quando somos nós os profissionais “especializados” em apresentar a melhor solução para essas empresas, nos cabe uma dose tripla de persistência e resiliência para lidar com as frustrações de quem não se enxerga grande, mesmo sendo.
Assim como não podemos obrigar uma pessoa que sofre a fazer terapia, não podemos obrigar uma empresa medíocre a se tornar eficiente. E a pergunta que fica é: eficiente para quem?